30 de janeiro de 2020 | 03h00
Uma queda de 6,30% nas exportações brasileiras, de US$ 239,54 bilhões em 2018 para US$ 224,44 bilhões em 2019, deveria ser um desses motivos. A trajetória declinante das vendas externas apenas foi mantida no ano passado.
A perda continuada é em parte explicável pelo enfraquecimento do comércio global e pela recessão na Argentina, importante compradora, em anos normais, de manufaturados brasileiros. Mas é atribuível também ao escasso poder de competição e à limitada presença internacional da indústria brasileira. Esses problemas decorrem de vários fatores internos combinados. Os mais visíveis são a proteção excessiva, a diplomacia comercial equivocada, o investimento insuficiente em tecnologia, inovação e capital humano, as deficiências do financiamento e o famigerado custo Brasil.
Uma das poucas notícias animadoras, nas últimas semanas, foi a conclusão da fase 1 de um acordo entre Estados Unidos e China. Mas o acordado até agora, como observou o diretor-geral da OMC, foi a parte fácil. Isso foi suficiente, acrescentou, para deter a sequência de retaliações, mostrar a possibilidade de um acordo e permitir uma distensão do mercado. Falta a parte mais difícil e sobre essa nada foi claramente informado até agora pelos governos envolvidos.
Além disso, o sistema internacional é menos seguro e menos eficiente quando falha, ou pode falhar, o mecanismo formal de solução de conflitos. Paralisado o Órgão de Apelação, por causa do impasse em torno da nomeação de novos juízes, o sistema fica seriamente prejudicado. Felizmente, nem todas as disputas, lembrou o diretor-geral da OMC, vão parar no nível mais alto de apreciação.
Além disso, ele reafirmou a disposição de continuar negociando com o governo americano e avaliando suas queixas quanto ao funcionamento da organização. As queixas envolvem os critérios de aplicação das normas e os padrões de disciplina impostos pela entidade aos emergentes.
Qualquer fator de instabilidade internacional, mesmo um risco ainda mal definido, como o de uma nova pandemia, é relevante para o Brasil. O déficit em transações correntes aumentou 22,20% em 2019 e atingiu US$ 50,76 bilhões, soma equivalente a 2,76% do Produto Interno Bruto (PIB).
Não são ainda números alarmantes, porque o buraco foi coberto folgadamente com investimento estrangeiro direto. Ingressaram US$ 78,56 bilhões, valor quase igual ao de 2018. Mas qualquer susto maior pode afetar os fluxos de capital. A valorização do dólar em todos os mercados, nos últimos dias, foi um lembrete desse risco. Mas o detalhe mais preocupante, num quadro de muita incerteza global, é o enfraquecimento evidente das exportações brasileiras. Alguém se preocupa, em Brasília, com o custo possível de um novo choque externo?
O coronavírus é mais um risco para a exportação e, portanto, para a economia brasileira – um risco aparentemente menor, neste momento, mas nada desprezível. Outros sinais de alerta são bem visíveis no mercado internacional e nas contas externas do Brasil. Seria irresponsabilidade negligenciar qualquer nova ameaça. É cedo para medir o impacto da nova epidemia no crescimento global, disse o diretor da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo, em entrevista à rádio CBN. Ele concentrou seus comentários em desafios mais concretos e muito próximos, como as tensões comerciais – apenas atenuadas neste momento – e o impasse com os Estados Unidos a respeito do Órgão de Apelação da OMC. Em Brasília, o Ministério da Economia tem motivos especiais, ou deveria ter, para estar muito atento a essas questões e a qualquer nova possível ameaça.