Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Correio Braziliense segunda, 04 de maio de 2020

O CANTO DE BRASÍLIA

 

O canto de Brasília
 
Spalla da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, Lilian Raiol sempre sonhou em integrar o conjunto e é uma das poucas mulheres negras em cargo de liderança sinfônica brasileira

 

Nahima Maciel

Publicação: 04/05/2020 04:00

 (Daniel Marques/Divulgação)  
 
 
O sonho de Lilian Raiol sempre foi atravessado por Brasília. E o violino, aprendido desde a primeira infância, sempre fez parte desse cenário. Spalla da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro (OSTNCS), cargo mais importante do conjunto depois do maestro, a musicista de 39 anos nunca enxergou a própria trajetória sem o Plano Piloto e, mais ainda, sem a orquestra fundada por Claudio Santoro nos anos 1980.
 
Filha de um militar que sempre gostou de música e de cantar, Lilian nasceu em Macapá, mas saiu de lá aos 6 meses para morar em Manaus, onde ficou até os 5 anos. Os pais, paraenses, desembarcaram com a família em Brasília em meados dos anos 1980 e, aos 10 anos, Lilian já estava matriculada na Escola de Música. “Eu tinha educação musical em casa, meu pai nos ensinou a cantar e eu cantava desde os 5 em igreja. Meu pai tocava violão e ele viu que eu tinha afinação, quis investir para que eu estudasse música”, conta.
 
O violino entrou para a vida de Lilian quando ela completou 11 anos. A origem do fascínio pelo instrumento, ela não sabe contar ao certo, mas lembra da primeira vez que se deparou com esse conjunto harmônico de madeiras e cordas. “Nossa igreja tem uma orquestra grande e ali foi a primeira vez que vi um violino. Aquilo me chamou a atenção porque achava lindo. Foi amor à primeira vista”, lembra. Na época, foi estudar com a professora Denise Gomes, também violinista da OSTNCS, o que ajudou a alimentar um olhar de admiração para a sinfônica. Aos 17, Lilian entrou para o curso de música da Universidade de Brasília (UnB) e fez licenciatura em música, sob a tutela da professora Ludmila Vinecka, outra integrante da orquestra.
 
A convivência com músicos da OSTNCS e a presença constante nas apresentações fez Lilian ter certeza de que queria integrar o grupo. No entanto, ela ainda precisaria percorrer um bom caminho, já que a orquestra é um órgão público para o qual só se entra por meio de concursos que, ao longo do tempo, são raros. Então, quando terminou a UnB, Lilian aproveitou que o pai, funcionário de hospital militar, havia sido removido para Pequim e foi morar na China. Passou dois anos no país, fez master classes no Conservatório de Pequim, estudou com um professor particular e decidiu se dedicar a aprender mandarim e um pouco mais sobre a música chinesa.
 
Experiências
 
Como o chinês é uma língua tonal, Lilian percebeu que músicos têm facilidade para aprender porque conseguem distinguir as diferenças sutis entre os tons. “Deu para aprender um pouco, a música ajuda muito, alguns sons são como se fossem uma nota aguda sustentada, o ouvido ajuda bastante”, conta a musicista que, além de ter aulas com um violinista da orquestra de Pequim, a maior do país, teve oportunidades enriquecedoras como a de assistir ao violinista Itzhak Perlman tocar no Grande Salão do Povo. “Meu professor perguntou se eu não queria conhecer a música chinesa, então fui explorar, estudei um pouco do repertório tradicional chinês, pra conhecer”, lembra.
 
Ao voltar ao Brasil, em 2003, Lilian precisou traçar planos profissionais. O concurso mais recente para a OSTNCS já havia sido realizado e ela acabou por voltar os olhos para São Paulo. “Então fui, em 2004, para fazer as provas para orquestras semiprofissionais”, lembra. Acabou entrando para Orquestra de Câmara da USP e se tornou academista (o equivalente a estagiário) da Sinfônica da USP. Para não deixar as aulas de lado, ela começou a ter aulas com Andreas Uhlemann, violinista da Osesp.
 
Para um músico, especialmente os jovens, ter um professor como referência, mesmo depois de formado e já iniciado na vida profissional, é fundamental. “É como se fosse um técnico”, conta Lilian. “Você é o jogador numa equipe profissional, mas precisa daquele olhar de fora, de alguém que entende e vai te ajudar a pensar de maneira diferente ou até com uma visão técnica mesmo. Sempre tem o que aprender, acrescentar.”
 
Nesse período, ela tratou de ampliar os horizontes o máximo possível. Se inscreveu para tocar com a Orquestra das Américas e com a Orquestra Mundial, que reúnem músicos das mais diversas nacionalidades, e fez três turnês por países como Canadá, Espanha e China. “São músicos de todos os lugares, muitos europeus, jovens. Foi incrível ter tocado em teatros grandes e modernos e com pessoas que compartilham aquela adoração pela música que todo jovem instrumentista tem”, garante.
 
Mas Brasília não saía da mira da musicista, na época com 24 anos. “Brasília é meu lar, minha casa, aqui me sinto tranquila, bem. E São Paulo é uma loucura, tudo bem que nem se compara a programação musical, mas eu acordava antes das 6h para estar na orquestra”, reflete. “E tinha o apego à orquestra, cresci vendo a orquestra. É um apego sentimental e emocional.”
 
Em São Paulo, ela ainda integraria a Orquestra Experimental de Repertório, formação de prestígio e muito seletiva quanto aos membros, uma espécie de pontapé importante para uma carreira nacional e internacional. Mas Lilian começou, então, a ouvir dos amigos que haveria concurso novamente para OSTNCS. O edital saiu em 2005, ela fez a prova, passou e não hesitou: largou tudo em São Paulo para voltar para Brasília.

A musicista ocupa o cargo mais importante da orquestra depois do maestro (Jhey Pi/Divulgação)  

A musicista ocupa o cargo mais importante da orquestra depois do maestro

 



Estudos
 
Em Brasília, o ritmo mudou. Lilian estava acostumada a ter cerca de 10 dias para aprender um repertório, mas as apresentações da OSTNCS são semanais e ela precisou mergulhar em partituras que nunca havia estudado e com pouquíssimo tempo para aprender. “Entrei no naipe dos primeiros violinos e passei ali os primeiros seis anos aprendendo repertório. A vivência de uma orquestra profissional que tem um concerto toda semana é muita coisa. No início, você não conhece tanto o repertório, tem que aprender tudo novo a cada semana, tem cinco dias para estar no seu melhor. Em pouco tempo aprendi todas as sinfonias de Brahms, Beethoven, Tchaikovsky. E continuei estudando”, explica.
 
Em 2011, ela se candidatou para fazer a prova de concertino, o violinista que senta ao lado do spalla que, na época, era a violinista Kátia Pinheiro. Lilian passou na prova interna e, quando a colega se aposentou, em 2016, aceitou o convite do maestro para que seguisse como spalla.
 
É um cargo especial em qualquer condição, mas que ganha dimensão mais simbólica por dois fatores. “O mundo musical erudito sempre foi muito fechado, até o início do século 20 eram, basicamente, só homens. As orquestras não aceitavam mulheres, principalmente pela questão da gravidez, para não desfalcar o grupo. E até hoje é um pouco assim. Mulher tem que mostrar serviço duas vezes mais que o homem para conseguir valer uma vaga. E spallas, então, tem muito poucas”, lamenta. “E negras, então, nem se fala. Até hoje, nas orquestras brasileiras, a quantidade de mulheres spallas é muito pouca e de negros, de forma geral, também. Mas esses projetos de inclusão social através da música têm ajudado pessoas carentes a construir carreira através da música.”
 
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