Geraldo nasceu e criou-se no povoado da praia do Francês, um paraíso encrustado na cidade histórica de Marechal Deodoro. Ainda menino aprendeu a surfar nas ondas do mar azul. Embora houvesse uma escola, Geraldinho gostava mesmo das ondas. Seus pais insistiam nos estudos, mas, ele achava que a vida era aquele pedaço de paraíso (pensando bem ele estava certo).
Para ajudar a manter a família, ainda adolescente foi trabalhar no bar de seu pai que era o sustento da família, mulher e mais seis filhos homens. Quando amanhecia o dia, Geraldinho pegava sua velha prancha e se deixava levar pelas ondas perfeitas para o surf. À noite o bar de seu pai fechava, Geraldinho ficava conversando com amigos ou turistas, contando as tomadas nas ondas ou percorria o povoado catando alguma garota disponível a deitar com ele na praia. Não queria compromisso, só ficar.
Certa noite um artista famoso fez um show em Marechal Deodoro e depois, altas horas entrou num bar para tomar uma cervejinha e fumar liamba. O artista estava empolgado com a pequena plateia do bar, tocou violão, cantou, e contou sua vida. De como saiu de Monteiro, uma pequena cidade da Paraíba e tornou-se astro do Brasil. Precisou muito sacrifício, muita dedicação, aprendeu a compor e todos os dias ensaiava no mínimo quatro horas de violão. Quando completou 20 anos arribou de Monteiro e foi para São Paulo. Passou mais de quatro anos tocando no metrô de São Paulo até que um cara ouviu o artista tocando e convidou-o para um Grupo Musical. O Grupo mudou sua vida, vivia de pequenos shows. Sempre compondo músicas novas. Certa noite um olheiro, empresário, depois de um show, o chamou para uma conversa, havia gostado de sua maneira de tocar, ele propôs parceria em suas músicas e assinaram um contrato fazendo show solo, deu-lhe um nome artístico. Ficou famoso, tem um bom apartamento em São Paulo, um bom carro e ótimas mulheres. Mas lutou bastante para conseguir a fama.
Depois da conversa com o cantor, Geraldinho pediu arranjou um violão usado, velho. Ele iniciou a aprendizagem, danou-se a dedilhar. Colocou na cabeça ser músico, compositor, cantor da Rede Globo. Os cinco irmãos, o pai, e a mãe reclamavam do som alto que Géo tirava de seu pinho dentro de casa. Até que teve a ideia de aprender os acordes no sítio de sua velha avó nos arredores do povoado. Quando fechava o bar ao entardecer, Geraldo pedalava sua velha bicicleta até o sítio, ficava sentado embaixo das mangueiras dedilhando as cordas, jantava coma avó. Ele sentia que tinha talento, sonhava tocar para o povo, um belo show. Por muito tempo Geraldinho estabeleceu um roteiro, ao acordar pegava umas ondas, o surf fazia parte de sua vida, depois trabalhava no bar do pai e ao anoitecer aprendia a tocar seu violão e cantar.
Naquela idade os amigos ofereceram um cigarrinho de maconha, ele fumou e adorou. A liamba tornou-se companhia nas aulas musicais autodidatas, embaixo das mangueiras.
Toda noite ao chegar, sua avó pedia para ele fazer seu cachimbo, ou seja, cortar o fumo de rolo e socar, bem socado no cachimbo. A macróbia colocava em sua boca, já torta, e dava baforada até tarde da noite quando chegava o sono.
Certa vez, a avó estava triste, confessou para o neto estar chateada com Malvina, sua filha, depois que o marido largou-a, ela caiu na gandaia, não podia ver homem, e o pior, ela soube que Malvina estava se prostituindo para os turistas, uma vergonha. Precisava fechar as pernas daquela jovem. O neto nada comentou, ele também comia sua gostosa tia.
Certa noite, Geraldinho enquanto socava o cachimbo da avó, com pena de sua tristeza, teve a ideia de colocar um pouco de maconha misturado com o fumo do cachimbo. Com todo cuidado socou bem socado, metade fumo de corda e a outra metade maconha da boa, conseguida com amigos. Levou o cachimbo cheio e bem socado para a avó, e foi dedilhar sua viola embaixo da mangueira. Em pouco tempo, ele ouviu os sorrisos da velhinha, eufórica. De repente ela apareceu às gargalhadas, chegou perto do neto e pediu para tocar músicas de Nelson Gonçalves e danou-se a cantar, “Boemia aqui me tens de regresso… e suplicante te peço… a minha nova inscrição…” Passou a noite sorrindo, cantando e fumando.
Daquela noite em diante, a velhinha só queria que Geraldinho preparasse seu cachimbo. Quando ele não aparecia, a velhinha reclamava. Só ele sabia socar com maestria seu cachimbo.
Em poucos anos Geraldinho aprendeu a tocar violão, e sua avó, sem nunca imaginar, tornou-se uma velhinha maconheira até morrer, nas vésperas do neto se arribar para São Paulo.