A gente só anda para frente. A gente cumpre o destino que tem de cumprir. A Natureza me pôs no mundo para isso. E eu tenho de seguir em frente. – Maria Bago Mole
Nos anos quarenta aportou no vilarejo Casas de Taipa, Centro da cidade de Florestas dos Leões, uma mulherinha de olhos negros, cabelos pretos, compridos e salientes, peitos pequenos e duros, parecendo duas maçãs. À boca miúda, espalhou-se no povoado ser a estranha filha da Tribo dos Índios Chuparam a Mãe.
Ninguém no local sabia de onde teria vindo aquela mulherzinha misteriosa, pragmática, altruísta. Tampouco procurou saber seu passado. Ninguém na vila queria saber disso. O certo é que aos poucos ela começou a conquistar a admiração e a confiança do povoado da localidade, e lá se instalou como sua residência oficial.
Muito inteligente, prestativa, fala sensual, dois anos depois de se instalar oficialmente no lugar, aquela mulherinha começou a desenvolver a plântula daquele que no futuro receberia o seu nome como homenagem: O Cabaré de Maria Bago Mole.
Na casa de taipa com quatro cômodos onde ela se instalou, doada por um dos vizinhos que ela socorreu em momentos difíceis e depois ficou dando assistência material, aos poucos começou a vender refeições aos caminhoneiros e cortadores de cana que por ali passavam rumo aos engenhos de cana-de-açúcar. O negócio começou a crescer, prosperar, e ela antevendo que poderia oferecer outras comidas àqueles homens sedentos por sexos que sempre a procuravam e a cantavam para uma trepadinha, prometendo torná-la a Cleópatra de todas as Cleópatra.
Pressentindo o sucesso com o negócio crescendo e a pressão dos fregueses por diversões sexuais, ela resolveu viajar à sua cidade natal e de lá trouxe algumas “meninas defloradas”, que os pais expulsavam de casa por terem perdido o cabaço com os namorados antes do casório.
Poucos anos depois a casa de taipa de quatro cômodos recebeu uma reforma caprichada para a época e se transformou numa pousada de dois pavimentos. Em baixo ficava o bar com o aposento da mulherinha e, em cima, foram construídos os quartos onde os homens levavam as meninas para se lambuzarem de cachimbadas movidas a óleo de peroba.
No dia da inauguração apareceram homens de toda região sedentos por sexo, principalmente senhores de engenhos, que tinham vontade de conhecer e comer a tão falada e idolatrada administradora do cabaré, que dizia às suas meninas não querer compromisso com nenhum homem para não destoar do seu comércio, deixando essa função para as suas cortesãs. Mas essa afirmativa da cafetina era um mistério, pois havia um zunzunzum na vila de ela ter sido estuprada pelo pai e expulsa de casa para não dedurá-lo já que era de família casca grossa da Zona da Mata, por isso havia lhe desenvolvido inconscientemente “a síndrome da repulsa ao sexo”.
Nesse dia apareceu por lá o senhor de engenho mais conhecido e poderoso da redondeza, Bitõe Quêi, um galegão de um metro e noventa, olhos claros, que tinha uma tara da gota serena por Maria Bago Mole, só em ouvir falar no nome dela e por causa dos seus dotes administrativos inteligentes e de xibiu preservado, e por ser uma quarentona enxuta, conservada, com tudo nos trinques.
Depois da festa de inauguração, que transcorreu no maior buruçu: brigas, freges, arranca-rabos por disputas internas entre caminhoneiros, cortadores de cana e outros fregueses: quem ia dormir e comer quem das meninas do cabaré, a cafetina pôs para funcionar seu instinto de administradora para aquelas ocasiões. Pegou uma chibata que havia comprado na feira livre para aqueles fins e nas relhadas saiu expulsando todos os penetras e lisos do recinto, organizando a desordem e ordenando que as meninas se recolhessem aos quartos com seus clientes escolhidos, que já “pagaram pelos serviços”.
– Der o melhor de vocês aos seus homens. Satisfaçam-lhes todos os desejos e fantasias sexuais. Não deixem nada pela metade. Lembrem que lá fora ninguém percebe o que está acontecendo aqui dentro. Portanto, der o melhor de vocês! Vocês estão recebendo para isso. Não se esqueçam de que o sucesso de vocês depende de vocês. – Dizia a cafetina com voz mansa e imperativa às suas meninas.
Feito isso e percebendo que tudo estava aparentemente normal, foi para o seu aposento com o homem que lhe tirou o cabaço pela segunda vez. A farra foi tão picante, excitante, regrada a todos os prazeres do sexo, que Maria Bago Mole e seu Bitõe Quêi perderam a hora e quando acordaram já passavam das dez horas da manhã, o que para ambos era uma desmoralização, acostumados a estarem de pé antes das cinco da manhã.
Percebendo o horário e totalmente contrariado, o poderoso senhor de engenho quis se apressar para sair. Nesse momento foi contido pela cafetina que o pegou pelas mãos e o conduziu até o banheiro para tomar um banho, tomar café e depois se ir-se.
– Não tenha pressa, bem! A gente só anda para frente. A gente cumpre o destino que tem de cumprir. Você está procedendo do mesmo jeito que os outros homens! Acalme-se! Depois de uma noite daquela você não deve se preocupar com o que aconteceu ou deixou de acontecer lá fora! Ou você já se esqueceu do que aconteceu entre nós dois? Por falar em nós dois, quando você vier por aqui novamente visitar a “casa” eu desejo ter uma conversa séria com você! Nada de mais! – Disse ela lhe dando um beijo na boca com gosto de café. E ele apressado, passou a mão no cavalo, pôs a sela, subiu e se mandou contrariado com a hora: meio dia! E ela, sorrindo com a contrariedade dele, ficou-o olhando troteando no cavalo e com a certeza de que aquele homem rude havia lhe conquistado o coração…