O BATELÃO
Raimundo Floriano
O batelão: pioneiro na subida do Rio Balsas
A palavra batelão é o aumentativo de batel, pequeno barco. Designa embarcação robusta, feita de madeira, cobertura de palha, fundo chato, impelida por varas e remos, empregando-se apenas a força humana, podendo também ser rebocada. Era utilizada, principalmente, no comércio do regatão, ou seja, o vendedor que percorre os rios, parando de lugar em lugar.
Esta narração tem seu começo no século XIX, quando um grande número de produtores agropecuários possuía fazendas em ambas as margens do Rio Balsas. Para acesso a elas, o Porto das Caraíbas consolidou-se como o ponto mais apropriado, pelo incessante movimento de viajantes, criadores, boiadeiros, negociantes e vaqueiros que por ali transitavam.
O nome Caraíbas deriva de uma grande fazenda homônima existente no lado direito do rio, hoje Tresidela, bem perto daquele local. No lado esquerdo, também havia fazendas de apreciável porte, como a Bacaba e outras.
José Pedro foi o primeiro canoeiro, fazendo a passagem dos transeuntes de um lado para o outro no dito porto, onde estabeleceu uma quitanda, na qual vendia cachaça, rapadura, farinha de mandioca, milho, querosene e sal, estes dois últimos gêneros chegados ali trazidos por tropeiros e também transportados pelos batelões.
Porto das Caraíbas no século XIX: canoa da passagem
Vila Nova foi o nome que tomou o arraial em torno do Porto das Caraíbas, onde se aglomeravam novos povoadores, nordestinos em sua maioria.
E foi naqueles primórdios que o ambulante Antônio Ferreira, baiano de Jacobina, subiu o Rio Balsas com seu batelão, negociando de vilarejo em vilarejo ribeirinho, até alcançar o Porto das Caraíbas, em volta do qual um novo núcleo de população se fixava, onde se estabeleceu definitivamente com seu armazém de secos e molhados.
Rabequista, folgazão e festeiro, começou ele com o sortimento de seu empório, com os forrobodós que promovia e com o Festejo a Santo Antônio, de quem era devoto, a atrair pessoas em derredor da povoação, com o que novas moradias foram se agrupando, não só pela alegria e prosperidade lá encontradas, como também pela salubridade, fartura e limpidez das águas do Rio Balsas.
Por esse motivo, Antônio Jacobina é considerado o legítimo fundador da cidade.
Até 1911, quando se iniciou a navegação a vapor, grande parte das mercadorias manufaturadas alcançou nosso sertão transportada nessas pequenas e audazes embarcações, os batelões.
Conheci esses pequenos barcos e até andei em alguns, em curta viagem, quando estudante em Teresina.
No Rio Parnaíba, eles enfrentavam a subida com relativa facilidade. O rio era largo, com águas mansas, amenizando o trabalho da marujada.
A tripulação era assim composta: na popa, um timoneiro – o homem do leme; atuando nas coxias – passarelas laterais –, seis marinheiros, que empurravam com varas a embarcação, três de cada lado, com carga de até 10 toneladas. Devido ao casco alto, não havia remadores.
Mas de Uruçuí até o Porto das Caraíbas, com o Rio Balsas estreito e veloz, é-me impossível imaginar o quanto se tornava sacrificado o cumprimento do longo itinerário de 360 quilômetros rio acima.
Devido às características do rio, os batelões lá eram pequenos, e a tripulação se compunha de um timoneiro na popa e, na longa proa, dois remadores e dois vareiros, despendendo esforço gigantesco para carregamento que não perfazia duas toneladas.
Quando me perguntam como é que os bateleiros agiam ao enfrentarem as corredeiras, tão comuns em nosso rio, e os trechos profundos, onde as varas não alcançavam o leito, eu só tenho uma resposta:
– Sei não!