Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

O Globo quinta, 13 de maio de 2021

NOVAS FONTES SOBRE A ABOLIÇÃO, COMO O RECÉM-LANÇADO LIVRO DE ASTOLFO MARQUES, RECUPERAM O PROTAGONISMO DO NEGRO

 

Novas fontes sobre a Abolição, como o recém-lançado livro de Astolfo Marques, recuperam o protagonismo negro

'O Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição', do autor oitocentista, traz olhar negro sobre a Lei Áurea
 
Obra da exposição
Obra da exposição "Descompasso Atlântico", de Arjan Martins Foto: Arjan Martins / Cortesia Arjan Martins e A Gentil Carioca
 
 

RIO —  Mais do que uma efeméride, o 13 de Maio é uma data em constante construção. É sabido que, 133 anos após a assinatura da Lei Áurea, os desafios da sociedade brasileira para superar as sequelas da escravidão continuam. Nos últimos anos, porém, novas fontes sobre o período vêm sendo redescobertas, trazendo outras leituras da Abolição. Entre elas o livro “O Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição”, do ainda desconhecido escritor negro Astolfo Marques (1876-1918), com 17 narrativas breves que fazem um registro importante da vida dos ex-escravos no Maranhão, onde ele nasceu e viveu, nos primeiros anos após a abolição da escravidão. Como diz o historiador Matheus Gato, organizador da coletânea, lançada pela editora Fósforo, os protagonistas dos contos abrem “caminhos possíveis para uma nova História”.

Publicados na imprensa da época, os contos de “O Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição” descrevem a luta dos negros para alcançar aquilo que a libertação vinda da pena da Princesa Isabel não lhes deu: cidadania plena. Há casos representativos de desilusão, como o do homem que é convidado por engano para uma pomposa festa num clube que comemorava a assinatura da Lei Áurea e é barrado na porta. Ou o do ativista republicano que acaba preso pelo próprio novo regime que ajudou a instaurar. Mas surgem também operários se movimentando politicamente, mulheres buscando o seu espaço, trabalhadores tentando sobreviver em uma sociedade que os rejeita. Ao fundo, um medo de que a escravidão retorne.

Apesar das falhas da Abolição, fica claro que, entre os negros, sempre houve orgulho de “ser 13”, afirma Paulo Lins, autor de “Cidade de Deus” e de um dos prefácios do livro de Astolfo. Para o escritor, os contos do maranhense evidenciam o papel das associações, dos clubes e dos pagodes no fortalecimento de uma união negra que foi — e ainda é — essencial para a conquista da liberdade.

 

— A escravidão é a guerra mais longa da nossa História, e sofremos suas consequências até hoje — diz Lins. — A liberdade foi conquistada através de revoltas e insurreições e de negros que compraram sua própria alforria. Hoje a luta não é mais armada. O movimento negro se organiza politicamente, de forma pacífica.

Movimento social

Grande parte da historiografia atual já não vê a Abolição como um “evento”, e sim como um longo processo histórico pautado em grande parte por ativistas negros. Figuras como a do advogado Luís Gama começaram a ser melhor estudadas nos últimos anos. Recentemente, o historiador Bruno Rodrigues de Lima mostrou como uma ação de Gama libertou 217 escravizados no século XIX.

— Para muitos, a Abolição é o primeiro grande movimento social do país, que pode até ser considerado um precursor do movimento negro na modernidade — diz Renato Noguera, professor de Filosofia da UFRJ e pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro). — Não é um evento estanque, é uma pauta que foi sendo capilarizada e que chegou à elite intelectual brasileira branca a partir da mobilização de homens e mulheres negros.

O escritor maranhense Astolfo Marques (1876-1918) Foto: Divulgação
O escritor maranhense Astolfo Marques (1876-1918) Foto: Divulgação

 

Coautor de “Enciclopédia Negra” (Companhia das Letras), o historiador Flávio dos Santos Gomes lembra que descobertas recentes, como a existência de escolas para alunos negros, além de associações carnavalescas com estandartes abolicionistas, estão ajudando a amplificar a História do movimento.

 

— Até os anos 1980 e 1990, os livros didáticos apresentavam o abolicionismo como um debate branco e parlamentar, apagando todo o diálogo com a vida social do período — diz Gomes. — O que revelava uma falta de preocupação com fontes que sempre estiveram disponíveis e ainda assim foram ignoradas. Para se ter uma abordagem multifocal, é preciso ir além do que ocorria em Rio e São Paulo e mostrar a porosidade do abolicionismo em outras cidades do país, e também no interior.

O próprio Maranhão de Astolfo Marques é um lugar que não recebeu a atenção devida de historiadores, acredita Matheus Gato. Só recentemente, por exemplo, se deu à maranhense Maria Firmina dos Reis, a primeira romancista do país, o devido reconhecimento. Outro nome da região a ser recuperado, segundo Gato, é o de Nascimento Moraes, autor de “Vencidos e degenerados”, ficção que retrata o contexto da abolição a partir dos negros.

— Esses três autores ficaram restritos à intelectualidade da região — lembra Gato. — Hoje estamos em um cenário muito diferente, graças à democratização do acesso à cultura e às políticas de ação afirmativa. Já há uma juventude negra nas universidades que demandam a revisão dos cânones e a recuperação de outras vozes.

'Aqueles aduladores'

Neste conto, incluído na coletânea "“O Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição”, um homem negro usa suas economias para se aprontar para um baile que comemorava a assinatura da Lei Áurea. No entanto, é barrado na porta ao descobrir que o convite que recebeu não era para ele. Um lembrete de que, no pós-abolição, os negros foram excluídos de sua própria festa. Leia trecho:

 

Ficou estupefato, o Agnelo. Tanta labuta, tamanha despesa para, no fim de contas, ficar a ver o baile por um óculo. Era demais!

Mas por que não lhe mandaram um convite!, clamava. O próprio Angelo, que ele sabia fora escravo dos Lopes, e os outros a quem foram distribuídos os convites, em que eram melhores do que ele? E, cada vez mais revoltado, apostrofava:

— E eu não poder esmagar aqueles aduladores do presidente!

E os elogios, até então feitos aos sócios do Surpresa, passaram a ser invectivas, que cresceriam desmesuradamente, se não fosse a intervenção do Ramiro:

— Ora, não te vá arrebentar a aneurisma! Despe-te dessa trapalhada e vamos daí à pândega, que foi para isso que aqui vim!

E o conviva enganado acedeu.

Num abrir e fechar de olhos, quando o Adriano Manteiga, cocheiro, fez parar o carro à sua porta, já ele com o Ramiro se achavam na casa de nhá Sebastiana, ao Caminho Grande, onde, ainda em regozijo ao Treze de Maio, os piquis comiam, os pandeiros rufavam sonoros e as harmônicas e reque-reques fremiam estridentes.

O folguedo ia animado, e os bailarinos a sapatear entre os entusiásticos que davam vivas à princesa Isabel, ao Clube Abolicionista e à igualdade.

No auge do prazer, o Agnelo não se furtava em exclamar, bamboleando-se entre a rapaziada:

 

— Ah, uma onça, para comer aqueles aduladores do presidente!

 


Escreva seu comentário

Busca


Leitores on-line

Carregando

Arquivos


Colunistas e assuntos


Parceiros