I
O vir e ir da onda que transforma o poderoso mar em poesia
“Por que chora, a tarde seu pranto entristece o caminho
Por que chora, se tem a beleza do sol e da flor
Por que chora, a tarde sabendo que existe outro dia
E a alegria depois da tormenta, é dia de Sol.”
Tarde de reflexão. Tarde desleixada do bom trabalho produtivo, e doada com carinho e paz para fazer um balanço da vida. Da minha vida, que, sei, está chegando ao fim. Como tudo que um dia começou. Não por que pensar diferente.
Andar descalço na areia molhada da praia, com a bainha da calça dobrada e molhada pelas ondas que vem, molham, e vão embora. Repetem a provocação, quase poética. Vem, molham, e vão. Uma vez. Duas vezes, incontáveis vezes.
Eu sei, sou o mesmo. E a água das ondas seria a mesma?
Me veio à mente a minha primeira colheita, da minha primeira semeadura. Três sementes de quiabo. Três pés de quiabos, e vários quiabos. A semeadura positiva, com várias outras sementes. Na roça, aonde nasci e me vi me transformar em gente. Eu me vi e vendo eu me lembro. Me lembro de mim.
Minha calça de suspensórios, dois bolsos laterais, para carregar nada e um bolso atrás para carregar a baladeira – num espaço que só entrava o cabo. Me vi tirando a baladeira, me vi atirando no passarinho que, felizmente voou. Voou para a vida e provavelmente para a reprodução.
Parei de andar na praia, e olhei para o mar até alcançar o horizonte, que fica num lugar que a gente apenas pensa que vê – pois, sendo longe, longe é um lugar que não existe, informa o escritor. E sendo longe e se não existe, como a gente pode ver?
Olhei para o mar, e como se mágica fosse, vi a água incolor parecer verde, e se transformar em espumas brancas. Repito: incolor que parece verde, que vira branco. E na sequência, tudo volta para o azul do mar.
Volto a caminhar. Não sei para onde vou. Não quero ir para lugar nenhum. Quero apenas caminhar pelos caminhos poéticos da imaginação que me leva do azul ao verde do mar, transformado em branco que desaparece no minuto seguinte.
Ondas que não são minhas, sementes que plantei, vida que estou devolvendo em breve para quem me semeou.
* * *
II
O violino e o violinista
Um violino e uma partitura
A fala é a reprodução da voz humana. A fala é o som da humanidade. Quem fala, canta. E quem canta embevece, transformando notas em música. Mas, quem toca, emoldura a fala e dá o tom poético à música.
Particularmente, nos meus melhores momentos, gosto de ouvir música. E a música que eu gosto de ouvir (mais) é a música instrumental.
Piano, saxofone, violino e acordeom são instrumentos musicais da minha preferência – um para cada momento de espiritualidade.
E quando a gente quer ouvir música, a conversa apenas atrapalha. Então, vamos parar de atrapalhar e escutar.