Raimundo Floriano
Nora Ney
‘ Iracema de Sousa Ferreira, a Nora Ney, cantora, nasceu no Rio de Janeiro (RJ), a 20.3.1922, cidade onde veio a falecer, no dia 28.10.2003, aos 81 anos de idade. Era filha de Dárcio Custódio Ferreira, funcionário da Câmara dos Deputados.
Aos oito anos, foi matriculada num Grupo Escolar em Olaria e, mais tarde, formou-se em Contabilidade, pelo Instituto Rui Barbosa.
Aprendeu sozinha sua primeira música ao violão, Valsa de Cristal, observando as aulas que suas irmãs tomavam com uma professora. O pai, surpreso e entusiasmado, resolveu presenteá-la com um violão. Apesar disso, só passou a estudar música mais tarde, com Aída Gnattali, solfejo e leitura musical. Em casa, chamavam-na de Ceminha.
Antes de decidir-se pela carreira de cantora, frequentava assiduamente os programas radiofônicos de auditório, onde não perdia a oportunidade, se o animador solicitasse aos ouvintes da platéia que subissem ao palco e cantar um sucesso estrangeiro – achava que não poderia cantar em Português por causa dos seus “erres” muito carregados.
No final dos Anos 1940, antes de se lançar profissionalmente, fez parte do Fã-Clube Sinatra-Farney, que promovia festas na residência do cantor Dick Farney, tendo à bateria seu irmão Cyl Farney. Nesses encontros informais, já mostrava seu talento, cantando com os outros participantes, como Johnny Alf e Carlos Guinle, os sucessos de Frank Sinatra e Dick Farney. Esses saraus acabaram sendo o passaporte para sua profissionalização. Com o grupo, participou de alguns shows estrelados por Dick Farney, desistindo, então, de sua profissão de Contadora.
Levada por Dick Farney, Lúcio Alves e Osvaldo Elias, estreou, em fins de 1951, no Programa de José Mauro, Fantasia Musical, da Rádio Tupi, cantando músicas estrangeiras, sob o pseudônimo de Nora May. Quando Aracy de Almeida entrou de férias, passou a substituí-la no Quadro Viva o Samba, do Programa Rádio Sequencia G-3, de Haroldo Barbosa, que insistiu para que ela abandonasse o repertório em Inglês.
Apesar das dúvidas quanto a sua voz muito grave e de sua pronúncia carregada de “erres”, conseguiu impor-se com seu ritmo e afinação, criando um novo estilo de interpretação para os sambas-canções da época.
Pouco depois, foi convidada pelo Maestro Copinha para cantar na Boate Midnight, do Copacabana Palace Hotel, substituindo Carmélia Alves, a Rainha do Baião, sendo também contratada pela Rádio Nacional, que transmitia da boate, ao vivo, o Programa Ritmos da Panair, no qual atuou durante quatro anos, ao lado de Dóris Monteiro e Jorge Goulart, que, mais tarde, se tornou sem companheiro e eventual parceiro na vida profissional.
Antes de Jorge Goulart, ela vivera um casamento que não deu certo, resultando dessa união dois filhos, Vera Lúcia e Hélio.
Jorge Goulart e Nora Ney - O Primeiro LP de Nora
Em 1952, gravou, com grande êxito, na Continental, seu primeiro disco, com as músicas Menino Grande, de Antônio Maria, que se lançava como compositor, e Quanto Tempo Faz, de Paulo Soledade e Fernando Lobo. Com Ninguém Me Ama, de Antônio Maria e Fernando Lobo, conheceu sua fase de notável sucesso, que lhe valeu o Disco de Ouro como melhor cantora, por cinco anos consecutivos, sendo eleita, em 1953, Rainha do Rádio.
Ainda em 1953, lançou os sambas-canções De Cigarro em Cigarro, de Luís Bonfá, e Preconceito, de Antônio Maria e Fernando Lobo, além do samba-choro É Tão Gostoso, Seu Moço, de Mário Lago e Chocolate.
Em 1954, gravou o samba-canção Aves Daninhas, de Lupicínio Rodrigues. Em 1955, outros grandes lançamentos: o samba-canção Se Eu Morresse Amanhã de Manhã, de Antônio Maria, e o samba Meu Lamento, de Ataulfo Alves e Jacob do Bandolim. Em 1956, arrebentou a boca do balão com o samba-canção Só Louco, de Dorival Caymmi. Em 1958, repetiu a dose com o maxixe Vai Mesmo, de Ataulfo Alves.
Viajando em turnê de seis meses pelo Exterior, apresentou-se nas Américas, Europa, África e Oriente Médio, tornando-se grande divulgadora da MPB em países nos quais era praticamente desconhecida, como Chipre, U.R.S.S e República Popular da China.
Em 1971, fez uma temporada com Jorge Goulart na Boate Feitiço da Vila, em Belo Horizonte, e, no ano seguinte, gravou, pela Som Livre, o LP Tire Seu Sorriso do Caminho Que Eu Quero Passar Com Minha Dor, contendo, entre outros hits, Conselho, de Denis Brean e Osvaldo Guilherme, e Quando Eu Me Chamar Saudade, de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito.
Em 1974, participou, com Jorge Goulart, do show Brazilian Follies, no Hotel Nacional do Rio de Janeiro, reeditado cinco anos depois. Em 1977, lançou, com Jorge Goulart, o LP Jubileu de Prata, pela Som Livre, no qual interpretou, entre outras canções, Ronda, de Paulo Vanzolini, Se Eu Morresse Amanhã de Manhã, de Antônio Maria, e Canção de Quem Espera, de Sivuca e Glória Gadelha.
LPs Jubileu de Prata e Meu Cantar É Tempestade de Saudade
Em 1979, participou, com Jorge Goulart, do Projeto Seis e Meia, na Sala Funarte/ Sidney Miller, em show de apreciável sucesso, intitulado Casal Vinte, contando com roteiro e direção de Ricardo Cravo Albin. No ano seguinte, na mesma Sala, apresentaram o espetáculo Roteiro de Um Boêmio, sobre a vida e a obra de Lupicínio Rodrigues. Nessa época, passou por sérios problemas de saúde, por conta de um câncer na bexiga, do qual se recuperou.
Em 1982, comemorou, com Jorge Goulart, 30 anos de vida em comum, com o espetáculo De Coração a Coração, no Teatro Gonzaga, em Marechal Hermes. Em 1985, de volta ao Projeto Pixinguinha, fez dupla com Jamelão, apresentando-se em Florianópolis, Curitiba, Goiânia e Brasília DF. Em 1987, lançou o LP Meu Cantar É Tempestade de Saudade.
Em 1989, ao lado das cantoras Carmélia Alves, Violeta Cavalcanti, Zezé Gonzaga, Rosita Gonzales e Ellen de Lima, atuou no show As Eternas Cantoras do Rádio. Um ano depois, realizou o espetáculo comemorativo do Aniversário da Rádio Cultura, de São Paulo.
Em 1992, depois de 39 anos de vida em comum, casou-se com o cantor Jorge Goulart. Meses depois, quando se apresentava em um show no Fluminense, sofreu um AVC, que lhe deixou sequelas, impedindo-a de voltar aos palcos, continuando o casal a residir no Rio.
Em 2000, foi homenageada no show do cantor Elymar Santos, no Canecão, quando emocionou o público ao cantar Ninguém Me Ama, em cadeira de rodas, cercada por Jorge Goulart, Carmélia Alves e Ricardo Cravo Albin.
A partir de 2001, com o agravamento do seu estado de saúde, passou a maior parte do tempo em hospitais da zona norte da cidade do Rio de Janeiro, Bairros da Tijuca e Andaraí.
A 28.10.2003, Nora faleceu num hospital do Bairro da Tijuca, vítima de falência múltipla dos órgãos, devido a um câncer generalizado provocado por enfizema pulmonar. Seu viúvo, Jorge Goulart, havia programado um espetáculo em sua homenagem, para o fim de 2003, no Teatro João Caetano.
Sua discografia é extensa, e seus LPs e canções remasterizadas são facilmente encontráveis nos sites e busca.
Algumas delas estão contidas neste excelente CD, da Série Grandes Vozes, lançado pela Som Livre, em 2007:
Como pequena amostra de seu trabalho, escolhi as quatro faixas a seguir:
É Tão Gostoso, Seu Moço, samba-canção de Mário Lago e Chocolate, gravado em 1953:
Vai Mesmo, maxixe de Ataulfo Alves, grande êxito em 1958:
Provei, samba de Vadico e Noel Rosa, constante do LP Jubileu de Prata e do CD Grandes Vozes, gravação de 1977, com a participação especial de Jorge Goulart:
Ninguém Me Ama, samba-canção de Antônio Maria e Fernando Lobo, de 1942, regravado, anos depois, em Português, pelo cantor americano Nat King Cole:
De Cigarro em Cigarro, samba-canção de Luís Bonfá, gravado em 1953, maior sucesso de sua carreira: