Num cenário promissor, O primeiro homem, filme em torno da corrida espacial dos anos de 1960, aglomera talentos de peso — dirigido pelo mais jovem vencedor do Oscar de melhor diretor Damien Chazelle. O longa ainda inclui o astro de La la land (criado por Chazelle, em 2016, com direito a seis estatuetas douradas) Ryan Gosling, ao reafirmar um ícone inconteste de todo e qualquer livro de viagem espacial: Neil Armstrong, o pioneiro astronauta a pisar o solo lunar. Cineasta da obsessão moderna na sétima arte — à frente de filmes como Whiplash — Em busca da perfeição (2014) e do musical de coreografias milimetradas La la land, Damien Chazelle recorreu, por exemplo, ao instrutor Frank Hughes, a serviço da Nasa no treinamento de Armstrong, para dar dicas para a preparação do protagonista Ryan Gosling, desde já a caminho de possível terceira indicação ao Oscar de melhor ator.
Tendo por produtores executivos um punhado de profissionais de cacife, entre os quais Steven Spielberg e Adam Merins (Em ritmo de fuga), O primeiro homem recria momentos repletos de tensão, ao abordar a inaugural investida do homem rumo à Lua. “Se alguma pessoa falhasse, o projeto fracassaria”, sublinhou em material de divulgação do filme Marty Bowen (o mesmo da saga Crepúsculo), produtor alinhado, em função, a Wyck Godfrey (do sucesso A culpa é das estrelas). Até a consumação da missão Apollo 11, os espectadores do filme não deparam apenas com obstáculos tecnológicos. O primeiro homem abraça muitos dramas pessoais experimentados por Neil Armstrong ao lado da mulher dele, Janet (interpretada por Claire Foy, presente na série The crown).
Historiador dos ramos da ciência e da tecnologia, James R. Hansen foi outro nome a estruturar a transposição para as telas de oito anos essenciais na trajetória de Neil Armstrong, que culminaram no feito máximo de chegar à Lua, em 1969. Antes da morte do astronauta, em 25 de agosto de 2012, o autor Hansen quebrou a reticência do recluso personagem da história mundial, que permitiu e colaborou para a escrita de uma biografia. O primeiro homem chega aos cinemas sob a cuidadosa tutoria indireta de Mark e Rick, filhos de Armstrong, capazes de talharem uma imagem menos endeusada do pai, mas, nem por isso, desatenta da capacidade de ele enfrentar obstáculos.
“As cápsulas espaciais eram frágeis e muito apertadas: imperava uma tecnologia primitiva”, simplificou o ator Ryan Gosling à imprensa estrangeira, ao falar dos desafios reais de Armstrong. Sob viés, por momentos, documental, o longa chega aos cinemas, com a declarada pretensão de Damien Chazelle de “enfatizar o quanto era assustador viajar para o espaço”. No campo técnico, O primeiro homem reúne nomes como Linus Sandgren (de A trapaça), diretor de fotografia, e Tom Cross (Joy: o nome do sucesso), responsável pela edição.
Tranquilidade, em face ao risco, e um foco ilimitado no trabalho estão entre as qualidades ressaltadas pelo produtor Wyck Godfrey, quando ele divaga sobre a figura central de O primeiro homem. “Ele ocupava a cabine de comando e tomava decisões instantâneas”, já demarcou Godfrey, ao contar da capacidade de Armstrong suplantar adversidades, especialmente aquelas de escala privada. O roteiro do filme foi criado por Josh Singer, mestre de intrigas e tensões presentes em filmes como Spotlight — Segredos revelados e The Post — A guerra secreta.
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A vida doméstica de Neil Armstrong também ocupa muito da tela, com a presença da esposa dele, Janet (papel de Claire Foy) |
Pés na Lua e na cozinha
Com acesso a mais de 700 páginas de pesquisas para a elaboração do livro assinado por James R. Hansen, Ryan Gosling abriu na equipe a frente de caminho entre “a cozinha (numa referência da vida doméstica de Armstrong) e Lua”, alvos para a certeira caracterização do protagonista. Se a missão que encerrava “loucura e perigo” (nas palavras de Ryan) foi cumprida, Damien Chazelle dissecou em filme os programas da Nasa atrelados à base do Cabo Canaveral, sem perder de vista o impacto emocional do ineditismo de cada missão (fosse da fase da Gemini ou da Apollo), dando ênfase às “batidas de coração” inerentes aos feitos nunca experimentados.
Para além da unidade de trabalho entre ator e diretor (incrementada na dinâmica de improvisos no roteiro), a recriação da vida de Armstrong, por Gosling, esbarrou em semelhanças notadas pelo escritor no próprio ator: “Ryan é introspectivo, metódico, quieto e modesto”, comentou a publicações internacionais. Representados em cena, os astronautas Buzz Aldrin (segundo homem a pisar na Lua, e interpretado por Corey Stoll) e Mike Collins (Lukas Haas, de A testemunha) não ganham demasiada relevância, mesmo tendo sido colegas de voo de Armstrong.
Dono de destino trágico, Ed White (personagem pioneiro, feito por Jason Clarke) ganha destaque, junto com o piloto espacial Roger Chaffee (Corey Mitchel Smith) e o terceiro homem a pisar na Lua, Pete Conrad (Ethan Embry). Interessante também é notar a inclusão na produção de duas peças musicais: Lunar Rhapsody (uma das favoritas do astronauta em pauta) e Egelloc, um musical que ele mesmo criou, nos tempos da juventude. O premiado compositor Justin Hurwitz (de La la land) assina a trilha sonora da fita.