19 de junho de 2021 | 05h00
Foi em 2014, quatro anos após retornar ao Brasil e ter composto o elenco de dois musicais, que a atriz e cantora paulistana Myra Ruiz chamou a atenção para seu trabalho ao interpretar Nina, uma das protagonistas de In The Heights – Nas Alturas. Ruiz angariou uma série de elogios, repetidos quando a artista subiu ao palco do Teatro Porto Seguro na pele da prostituta Saraghina em Nine – Um Musical Felliniano, sob a direção de Charles Möeller e Claudio Botelho.
Estrelando um dos solos mais elogiados da montagem, a artista começou a traçar caminho estelar no teatro musical brasileiro, culminando no sucesso massivo de sua performance como a bruxa má do oeste Elphaba, na temporada paulistana do blockbuster da Broadway Wicked.
“A pandemia me trouxe isso, e meus alunos são pequenos alienígenas que são megatalentosos. Eles cantam, dançam e interpretam muito bem. Brinco dizendo que, graças a Deus, nunca vou precisar competir com eles, porque com treze anos e esse talento todo, imagina aos trinta. Enxergo este mercado com muita esperança, e espero que, com a nova leva de artistas, nós também sejamos mais criativos, com muitas mulheres diretoras e compositoras compondo o mercado com veteranos tão incríveis.”
Além das aulas, o isolamento também trouxe uma série de questionamentos que a artista compila em Myra Vol II: Melancolia Eufórica, seu terceiro show solo (o segundo transmitido online), que acontece apenas neste sábado, 19, às 20 h (ingressos em www.sympla. com.br).
Idealizado quando a cantora abandonou o colo familiar, onde havia se instalado no início da pandemia, e retornou a seu apartamento em São Paulo, o show busca pôr em cena o universo particular de Ruiz que, pela primeira vez desde março de 2020, se viu completamente sozinha por um longo período, apenas com suas lembranças e pensamentos.
“Sou muito nostálgica, acho a nostalgia gostosa, não me faz mal. Ela faz a gente olhar para nosso presente às vezes até com mais amor, mas também nos leva a muitas lembranças. E eu queria dividir com o público esse universo que é tão meu, tão particular que criei no meu quarto, na minha casa”, diz.
“Eu pensava em como as pessoas estão. As que estão isoladas ainda, como é para elas? Sei que cada um está num barco diferente nessa pandemia, mas não era nesse lugar, era uma questão mais interna. Então, comecei a entender o quanto de alegria tem na tristeza e vice- versa, e me veio o desejo de levar música para as pessoas novamente. É o momento de a gente olhar para várias questões do nosso País, da falta de rumo do governo, e aí comprei a ideia.”
A música que busca levar ao público foi também essencial para sua própria sobrevivência. Isolada, a artista encontrou conforto ao ouvir repetidamente todas as manhãs A Noite Vai Chegar, o hit de 1977 lançado por Lady Zu como um dos grandes sucessos das pistas na década de 1970, e responsável pela esperança que brotou na artista.
A canção reflete parte do repertório do novo espetáculo transmitido do palco do Teatro Faap. No roteiro, títulos como Starman, de David Bowie, Levitating, de Dua Lipa, e Sorte e Azar, do grupo Barão Vermelho. “O objetivo é sempre dividir temas da minha vida com o público. Fazer minha arte e perceber o quanto esses temas são universais, o quanto essa conexão é gerada a partir do show. Isso é o que me interessa. E a gente tenta fazer com que, por ser online, isso nunca se perca numa coisa só visual. Apesar de não ter o olho no olho pessoalmente, eu quero que as pessoas sintam esta conexão.”
Focando no momento pós-pandemia, Ruiz já planeja desenvolver projetos ao lado dos amigos Diego Montez e Thuany Parente: unir o repertório dos dois shows em um grande espetáculo e conciliar uma turnê com a agenda dos musicais que não vê a hora de voltar a fazer.
“Nós, artistas, não pudemos exercer uma coisa que é mais do que a nossa profissão, é o que a gente é. E foram meses muito estranhos, porque você se sente meio inútil, como se não pertencesse à sociedade. E meus shows me reavivaram. Ainda não é o ideal, não tem o calor do público, mas isso está nas trocas durante a pandemia. Eu devo isso a eles. É meu maior motivo de gratidão para levantar todo dia da cama. É a troca com o que eu posso chamar de meu público, certo? E eu sou muito grata porque eles fazem com que tudo seja possível”, comenta.