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Emicida e Alaíde Costa: 'Uma estrela como Alaíde pode, deve e merece receber prêmio, ovações e reconhecimento nesse plano com ela aqui' — Foto: Divulgação / Ênio Cesar
- Fiquei surpresa de o Emicida gostar de mim e de ter tido a vontade de trabalhar comigo. A praia dele é outra. Ele quis nadar na minha, e eu estou na dele - brinca a rainha das canções de fossa, que remou contra a maré durante boa parte de seus 66 anos de carreira ao escolher navegar por bossas líricas e dramáticas quando o mundo lhe sugeria que gravasse samba ou "algo mais animado, um oba-oba".
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Capa do novo disco de Alaíde Costa — Foto: reprodução
A ideia do projeto surgiu depois que Preto (diretor musical por trás de discos de Gal Costa, Erasmo Carlos e Nando Reis) enviou ao rapper o material de divulgação de uma live que Alaíde faria (e fez, em 2020) interpretando canções de Johnny Alf. Os dois passaram a trocar mensagens e descobriam que aquela mulher de canto doce e cristalino era uma paixão em comum. E o que chega ao alcance do público agora é o reflexo dela.
Na verdade, uma declaração de amor em forma de disco. E não só de Emicida e Preto, mas dos vários nomes que fizeram canções especialmente para Alaíde: Joyce Moreno ("Aurorear", com Emicida); Erasmo Carlos e Tim Bernardes ("Praga"); Céu e Diogo Pouças ("Turmalina negra"); Fátima Guedes ("Nenhuma ilusão"); Ivan Lins ("Pessoa-Ilha", com Emicida); e Guilherme Arantes ("Berceuse"). João Bosco e o filho Francisco assinam a única não inédita do disco, "Aos meus pés". A essas sete, junta-se "Tristonho", melodia de Alaíde Costa letrada por Nando Reis, lançada como single em abril.
A adesão ao chamado dos produtores para que artistas mandassem composições para um álbum de Alaíde foi tão maciça que virá ainda um segundo disco (sem previsão de lançamento). Desta vez, com músicas de João Donato, Francis Hime, Marcos Valle, Guinga, Gilson Peranzzetta, entre outros. Marisa Monte a Carlinhos Brown também já enviaram uma, batizada de "Moço". Rubel e Emicida já têm pronta "Bilhetinho".
- Estou lisonjeada, feliz por essa turma toda ter abraçado o projeto. São várias gerações e autores famosos, né? Nunca tinha gravado João Bosco e ele mandou uma música belíssima, que é a minha cara - diz ela, referindo-se à letra que diz "comi o pão todinho/ que o diabo amassou". - Sinto que, finalmente, veio o reconhecimento, que ele tardou, mas chegou no fim da vida. Se eu morrer hoje, morro muito feliz e grata.
- Acredito que quando Milton a convidou, fez com a mesma intenção que fazemos agora, que é o sentimento genuíno de que o mundo precisa ver essa mulher! Ela é uma força da natureza, nasceu e segue pronta - afirma Emicida. - Acho que deveríamos fazer mais disso. Às vezes, parece que a música contemporânea do Brasil nasceu de chocadeira, não tem pai, não tem mãe, não tem avó, todo mundo nasceu pronto e ninguém é parte do legado das gerações anteriores. Isso é triste e suicida, porque quem lida mal com seu passado não vai saber lidar com seu futuro, se tiver a sorte de conseguir chegar lá.
O rapper vibra com a oportunidade de homenagear uma artista como Alaíde em vida.
- Temos uma relação problemática com a memória na cultura brasileira. Historicamente, temos grandes heróis e heroínas, mas, infelizmente, eles têm pouco ou nenhum reconhecimento perto do que merecem e ainda mais em vida - analisa. - No final, contar histórias é sobre poder e humildemente o que Marcus Preto e eu temos feito nesse projeto é sugerir que uma estrela como Alaíde pode, deve e, aliás, merece receber prêmios, ovações e reconhecimento nesse plano com ela aqui. Assim, acredito que inspiramos mais gente a fazer o mesmo por seus ídolos também.
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Alaíde Costa, Emicida e Marcus Preto — Foto: Ênio Cesar
- Penso no que aconteceu com a Elza Soares. Se ela tivesse partido sem gravar "A mulher do fim do mundo", a história seria outra. Estou falando de reconstrução de narrativa, de transformar o que as pessoas pensam sobre ela - diz Preto. - Esse álbum fala de uma mulher de 86 anos que viveu um monte de coisa importante, que viveu à margem, e agora conta o ponto de vista dela. Para mim, Alaíde é a Billie Holiday brasileira, uma artista sofisticadíssima.
Alaíde agradece e diz que, agora, os calos que traz consigo já não doem tanto:
- Hoje, eles dizem: "Finalmente, a coisa está mais amena". E graças a uns meninos que poderiam ser meus filhos.