Simone Kafruni
Publicação: 15/04/2019 04:00
Criadora do projeto Gueto é Luxo, Tânia Sarah é especializada em cabelos afros, mas objetivo é empoderar as mulheres negras de Ceilândia
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OTM Culture ajuda na inserção de jovens no mercado de trabalho e divulga a música local
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Adeus ao liso
Ela conta que a mãe tinha um salão de pintura e alisamento. “Sempre alisei meu cabelo, nem sabia como era de verdade. Decidi deixar natural e comecei a estudar para saber como tratá-lo. E decidi levar a cultura e o empoderamento à mulher negra da periferia”, ressalta. Com o trabalho de cabeleireira, desfiles e ensaios fotográficos, consegue uma renda mensal de R$ 2 mil. “Recentemente, eu e 15 meninas, de Ceilândia e Samambaia, desfilamos na Embaixada do Gabão”, revela.
Para os jovens da periferia, é mais difícil desenvolver sua arte, porque têm de trabalhar para ajudar em casa e muitas vezes não podem estudar, conta Rayane Soares, 26, coordenadora do Jovem de Expressão, projeto que organiza oficinas socioculturais e de empreendedorismo na comunidade de Ceilândia há 10 anos. “A região é tida como perigosa, mas é muito rica em cultura. A arte é transformadora. Nosso objetivo é que quem nos procurar consiga gerar renda para sobreviver”, diz.
Berço e referência
Brasília sempre foi berço de importantes coletivos culturais, garante Jaqueline Fernandes, gestora cultural e especialista em políticas públicas em gênero e raça. “Cada vez mais presentes e diversos, são referências e modelos de organização. Articulam novas tecnologias, sistemas, modelos éticos, de gestão e de inovação, gerando novos ciclos de criação, produção, distribuição e consumo”, explica.
No entanto, alerta Jaqueline, existe um tipo de invisibilidade e dificuldades específicas que recaem sobre a periferia. “Os coletivos contribuem para a fonte de renda de artistas e agentes culturais que, cada vez menos, dependem de terceiros ou de grandes produtores para empreender. Assim, artistas que nunca tiveram sua música na rádio acabaram por lotar shows e virar fenômeno nas redes sociais”, observa.
Para amplificar a música da periferia em tempos de redes sociais, Ivo Moraes, 29, e Danilo Vieira, 25, ambos moradores de Sobradinho, criaram o coletivo Haze Studio. Tecnólogo em gestão de eventos, Ivo destaca que a paralisação do país com a crise econômica motivou a dupla a buscar alternativas em 2015. “Montamos o coletivo para dar visibilidade à música da periferia”, conta ele, que ganhou experiência como vendedor de discos na Livraria Cultura, de 2011 a 2014.
Com empreendedorismo na veia, Danilo constatou que havia um mercado consumidor de videoclipes gigantesco. Identificados com a cultura hip hop, os dois gravam batalhas de rima e focam a produção audiovisual no rap da periferia, tudo divulgado em canais como o YouTube. “A monetização no ambiente digital ainda é um processo complicado, mas o mercado é crescente e já temos recursos entrando com alguns artistas”, conta Danilo.
Porta de entrada
Os jovens da periferia têm mais dificuldade de entrar no mercado de trabalho e os coletivos funcionam como uma porta de entrada. Segundo a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD 2018), no grupo de regiões administrativas da periferia do DF, está o maior contingente de pessoas entre 18 e 29 anos sem emprego: quase 35%. Para driblar a crise, 15 alunos formandos e recém-formados em publicidade e jornalismo, moradores de Ceilândia e Planaltina, criaram o projeto OTM Culture, um coletivo de divulgação em mídias digitais.
A integrante Jéssica Martins explica que ainda é difícil viver da profissão. “Me formei no ponto alto da recessão, em 2015, e o coletivo foi o jeito que encontrei de trabalhar, mesmo sem receber”, justifica. O OTM Culture começa a se custear. “Por enquanto, está tudo na base da permuta, mas, com nosso trabalho, a cultura da periferia caminha para o centro”, acrescenta.
“Por ser uma cidade muito baseada em serviços públicos, em Brasília, a desigualdade é muito grande, de renda, de gênero, e, inclusive, territorial. A reunião dos atores é uma tentativa de vencer as barreiras”
Gustavo Vidigal, pesquisador
“Os coletivos contribuem para a fonte de renda de artistas e agentes culturais que, cada vez menos, dependem de terceiros ou de grandes produtores para empreender”
Jaqueline Fernandes, gestora cultural