Estrada de ferro Curitiba-Paranaguá. Foto de Arthur e J. J. Wischral
Reanima-me a inspiração o contato com os leitores, seus comentários, desde as críticas às sugestões. São ensinamentos.
Segundo meu mestre de Jornalismo, Nilo Pereira, essas atenções que eles têm são a paga maior pelos fatos que procuramos reascender em nossas crônicas. Como se uma bola que bate na parede e volta. No caso do cronista, retorna quase sempre com um aprendizado, porque o leitor sempre está atento ao que se escreve.
Outro dia me perguntaram por que o título desta coluna: “Crônicas cheias de Graça”, se às vezes enfoco temas sérios e sem a mínima conotação pitoresca.
O termo “graça”, aqui empregado, se refere a vários sinônimos e pode se apresentar por inúmeras formas. Graça, aqui empregado, é tudo que encanta. Desde uma gentileza que se recebe ou se propicia a alguém; uma coisa interessante, pois “cheia de graça”.
Na Teologia, se refere ao dom que Deus concede ao ser humano e que o torna capaz de alcançar a salvação. Como exemplo, a resposta a uma prece que retorna como a graça alcançada.
Só no vulgar é algo que tem outra conotação: “sujeito engraçado”, “moça sem graça”, ou uma “coisa que não tem graça”… Nesta coluna desejei que o termo funcionasse tudo quanto pode atrair o leitor. Até mesmo o sério, no caso, “sem graça”; porém, atraente.
Mas, em cada comentário que recebo tão gentilmente dos meus caros leitores é uma espécie de graça que alcanço; um impulso para a continuidade da função do aprendiz de cronista, que é mostrar acontecimentos vividos ou imaginados.
Outro dia, um domingo, ao despertar de boa noite de sono, veio-me, por um momento, uma palavra que jamais li: andares.
Fui ao dicionário: “Andares, vem do verbo andar. O mesmo que andejares, caminhares, vagueares, desenvolveres ou progredires.” Momento em que me lembrei do grande cronista pernambucano Mário Sette e seu livro: “Arruares” que é sinônimo de andares.
Para o verdadeiro cronista tudo é motivo e a palavra andares motivou-me a descrever por onde já andei e aqui cito alguns lugares que me empolgaram e que recomendo aos leitores.
Aos cinco anos inaugurei meus andares viajando de trem para a cidade natal de minha mãe, Belo Jardim. A máquina fumacenta, com as rodas de ferro cantando nos trilhos em cada curva, o apito, o mergulho da composição no túnel escuro e a luz da claridade natural lá no final. O primeiro alumbramento de tantos que eu provaria durante estes 85 anos!
Mal poderia prever que muito tempo depois, com esposa e filhos, eu fosse percorrer a estrada de ferro Curitiba-Paranaguá – uma das maiores obras da engenharia ferroviária brasileira – passando pelas encostas do Pico do Diabo, na Luturina, um carro para turismo.
Túnel cavado na rocha e os trilhos de mão única, ao lado da Serra do Mar
Segundo notas da historiadora Cecília Gomes, o trecho Curitiba-Morretes, que desce a Serra do Mar, foi eleito um dos passeios mais lindos do mundo e isso comprovei através de meus muitos andares por terras distantes do meu Recife.
Aliás, não é um passeio e sim uma aventura que há 140 anos encanta os turistas do mundo inteiro. O que mais me animou foi o fato de estar ali um Guia bem preparado, que sabia contar histórias e responder perguntas sobre aquela notável obra ferroviária, a maior do Brasil no século XIX.
Cecília Gomes nos informou que a Litorina é o primeiro trem de luxo do Brasil e o único do mundo com sistema automotriz. São três opções de carros, todos com ar-condicionado.
Viajar de trem pelo Paraná foi um dos meus melhores andares.