O grande poeta paraibano Manoel Lourenço da Silva, o Manoel Xudu (1932-1985)
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Os astros louros do céu encantador
Quando um nasce brilhando, outro se some
E cada astro brilhante tem um nome
Um tamanho, uma forma, brilho e cor
Lacrimosos vertendo resplendor
Como corpos de pérolas enfeitados
Entre tronos de plumas bem sentados
Vigiando as fortunas majestosas
Que Deus guarda nas torres luminosas
Que flutuam nos paramos azulados.
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Voei célere aos campos da certeza
E com os fluidos da paz banhei a mente
Pra falar do Senhor Onipotente
Criador da Suprema Natureza
Fez do céu reino vasto, onde a beleza
Edifica seu magno pedestal
Infinita mansão celestial
Onde Deus empunhou saber profundo
Pra sabermos nas curvas deste mundo
Que ele impera no trono divinal.
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O homem que bem pensar
Não tira a vida de um grilo
A mata fica calada
O bosque fica intranquilo
A lua fica chorosa
Por não poder mais ouvi-lo.
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Uma novilha amojada
Ao se apartar do rebanho,
Quando volta, é com uma cria
Que é quase do seu tamanho;
Ela é quem lambe o bezerro,
Por não saber lhe dar banho.
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Carneiro do meu sertão,
Na hora em que a orelha esquenta,
Dá marrada em baraúna
Que a casca fica cinzenta
E sente um gosto de sangue
Chegar à ponta da venta.
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Vê-se o sertanejo moço
Com três meses de casado;
Antes de ir pro roçado,
Da mulher, beija o pescoço.
Ela lhe traz, no almoço,
Uma bandeja de angu,
A titela de um nhambu,
Depois lhe abraça e suspira.
O sertanejo admira
As manhãs do Pajeú.
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É, bonito, é saudoso, é natural
O cenário do campo sertanejo.
No sertão, todo dia, bem cedinho
Vê-se um galo descendo do poleiro,
Um cabrito berrando no chiqueiro,
No terreiro, fuçando, um bacorinho.
Um preá sai torcendo o seu focinho,
Como um cego tocando realejo;
Na cozinha, uma velha espreme o queijo,
Um bezerro pulando no curral.
O retrato do corpo natural
É a veste do homem sertanejo.
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O meu verso é como a foice
De um brejeiro cortar cana.
Sendo de cima pra baixo,
Tanto corta, como abana,
Sendo de baixo pra cima,
Voa do cabo e se dana.
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E o boi tristonho a puxar
O carro pela rodagem,
De tanta fome e de sede,
Chega a lhe faltar coragem,
Se vendo a listra de lágrimas
Correr na cara selvagem.
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Botei espora nos pés,
Pulei em cima do bicho,
Entrei na mata fechada
Coberta de carrapicho,
Dando manobra na sela,
Chega rangia o rabicho.
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São quatro peitos roliços
Que, unidos, fazem cama.
Todos quatro são furados
E o leite não se derrama,
Mas sai com facilidade
Depois que o bezerro mama.
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O ligeiro mangangá
Passa, nos ares, zumbindo;
As abelhas do cortiço
Estão entrando e saindo,
Que, de perto, a gente pensa
Que o pau está se bulindo.
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A raposa arrepiada
Se aproxima do poleiro,
Espera que as galinhas
Pulem no meio do terreiro;
A que primeiro descer,
É a que morre primeiro.
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Feliz está o vaqueiro
Ordenhando a vacaria;
Já bebeu o leite quente,
Comeu da coalhada fria
E quando sai para o campo,
Canta, aboia e assovia.