09 de fevereiro de 2021 | 05h00
O retrato é uma das mais fascinantes e difíceis linguagens fotográficas. Sempre foi, desde a invenção da fotografia. Mas, ao longo desta história de 189 anos, muitos foram os fotógrafos que se destacaram nesta seara. O retrato não é apenas a confirmação do seu ser e estar no mundo, mas também pode ser crítico, amostra da sociedade, narrativa de um tempo. E assim tem sido. No Brasil, onde encontramos vários retratistas, uma se destaca pelas suas imagens potentes: Madalena Schwartz (1921-1993).
Uma imigrante que sentiu na pele o que é ser segregada, mudar de país e encontrar sua representatividade. Madalena Schwartz é um exemplo de que a fotografia pode narrar sem ser declaratória. No ano de seu centenário, o Instituto Moreira Salles inaugura, nesta terça, 9, apenas uma parte, mas fundamental de seu olhar fotográfico: a exposição As Metamorfoses. A mostra exibe o ensaio no qual a fotógrafa registrou a cena alternativa de São Paulo, na primeira metade dos anos 1970, em plena ditadura militar. Há retratos de nomes como Ney Matogrosso e os integrantes do grupo Dzi Croquettes, até figuras hoje menos conhecidas.
Seu trabalho com intelectuais e artistas pode ser relacionado com o que o fotógrafo francês Félix Nadar (1820-1910) fez no século 19, retratando artistas parisienses – quase que um dicionário imagético.
No Brasil, Madalena tomou conta de uma lavanderia, em São Paulo, na Rua Nestor Pestana, local de teatros, bares, boates e encontro de artistas. Em 1966, ingressou como aluna no Foto Cine Clube Bandeirante, escola que trouxe o modernismo para a fotografia no Brasil, com trabalhos experimentais como a fotografia surrealista de Thomaz Farkas (1924-2011). É sua epifania.
Além disso, morava no icônico prédio Copan, no centro de São Paulo. Transformou sua casa em estúdio onde recebia e fotografava os personagens da vida noturna paulistana. Poucas fotos da exposição foram feitas em camarins. “Suas imagens não são uma fotografia crítica ou militante, mas trazem uma energia incrível da contracultura, da diversidade, da energia humana que estava circulando naquele momento”, relata Samuel Titan Jr., coordenador executivo do IMS que, ao lado de Gonzalo Aguilar, assina a curadoria da mostra.
A importância do trabalho de Madalena Schwartz, cujo arquivo está no IMS (são 16 mil negativos, 450 fotos coloridas que retratam personalidades, povos do Norte e Nordeste e travestis e transformistas), está em ajudar a compreender um importante período da sociedade brasileira. E, além das fotos de Madalena, a exposição traz imagens de autores latino-americanos que, também na década de 1970, retrataram cenas ou personagens que aparentemente estavam na invisibilidade. Em diálogo, a exposição traça um breve panorama da fotografia latina dedicada aos mesmos temas. São obras de coletivos e autores distintos, de países como Argentina, Chile e Bolívia. No total, a mostra reúne 112 fotografias de Madalena Schwartz, além de mais 70 itens, entre periódicos, documentos, filmes e imagens produzidas por outros fotógrafos. “Quisemos falar de Madalena trazendo também outros contemporâneos de sua época. Apresentar sua biografia também pela história da América Latina”, afirma Titan Jr.