Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

O Globo domingo, 16 de junho de 2019

MACHADO DE ASSIS CHEGA AOS 180 ANOS

 

Machado de Assis chega aos 180 anos, e jovens o descobrem negro e do morro

Nascido em bairro pobre do Rio, escritor inspira superação de barreiras sociais e raciais
 
 
Grafite em homenagem ao escritor brasileiro Machado de Asis, perto da casa em que teria nascido, na Ladeira do Livramento Foto: GABRIEL MONTEIRO / Agência O Globo
Grafite em homenagem ao escritor brasileiro Machado de Asis, perto da casa em que teria nascido, na Ladeira do Livramento
Foto: GABRIEL MONTEIRO / Agência O Globo
 
 
 

RIO — A aula acontece nas ladeiras do Morro do Livramento, ao pé da Providência, no Centro do Rio. É ali, diante de uma casa parcialmente demolida, que Pedro Guilherme Freire explica: antes de virar o Bruxo do Cosme Velho, celebrado na Academia e nos salões, Joaquim Maria Machado de Assis foi um garoto pobre do Livramento. Exatamente como muitos de seus alunos. A iniciativa de Freire, professor do Colégio Estadual Caic Tiradentes, na Zona Portuária , reflete um esforço para reconfigurar a imagem do maior escritor do Brasil.

 

No mês passado, a campanha “Machado de Assis Real” lançou a “primeira errata feita para corrigir o racismo na literatura brasileira”. E recriou a foto clássica do autor, ressaltando suas feições negras . Também criou um movimento para que as editoras deixem de comercializar livros em que o escritor apareça embranquecido. E saiu a campo para encorajar novos escritores negros. Nascido há 180 anos (a data do aniversário é na próxima sexta, 21), o Machado “real” ainda pega muita gente de surpresa.

Como os alunos do professor Freire, que não faziam ideia de que o fundador da Academia Brasileira de Letras era filho de um pintor de paredes negro com uma lavadeira branca, e não pôde concluir os estudos porque precisou se sustentar desde cedo. A visita ao local em que o autor de “Dom Casmurro” teria nascido faz parte do projeto “Nossa escola, meu lugar, nossas histórias: etnografia e memória social da área portuária”.

— É importante dar destaque a esse Machado menos conhecido, que morou no Livramento — diz Freire, que também fundou um curso de pré-vestibular gratuito na região, com o nome do escritor. — Em vários aspectos, ele se parece com os jovens atuais da região, em sua maioria pobres e negros, que acabam largando a escola porque são obrigados a trabalhar cedo.

 

Também professora da rede pública e conselheira consultiva do Museu de História e Cultura Afro-Brasileira, Elen Ferreira conta que seus alunos negros “ficam desconcertados quando descobrem que Machado de Assis tinha a mesma cor que eles.

— Ver um rosto negro como protagonista da História em sala de aula é algo novo — argumenta ela.

Nascida ali mesmo, na zona portuária, e idealizadora do projeto Pretinhas Leitoras, que promove rodas de leitura para meninas da região, Elen tenta trazer Machado para a realidade de seus alunos, criando paralelos:

— Ele está aí há quase 200 anos, e só agora conseguimos fazer essa relação com os alunos. Além do mais, essa postura ainda é restrita a poucos espaços sociais. Outro problema é ver Machado como um exemplo de meritocracia, achar que todos os jovens daqui podem ser iguais a ele se quiserem, quando na verdade sua trajetória é uma exceção.

Imóvel onde Machado de Assis teria nascido (laranja e branco), na Ladeira do Livramento, Centro do Rio Foto: Marcelo Piu / 10-03-2013
Imóvel onde Machado de Assis teria nascido (laranja e branco), na Ladeira do Livramento, Centro do Rio
Foto: Marcelo Piu / 10-03-2013

Morador da Providência, Luan Domingos da Silva, 25 anos, só foi descobrir que tinha a mesma origem do Bruxo aos 18, quando ingressou no pré-vestibular Machado de Assis. Como o “conterrâneo”, ele teve dificuldade para se manter na escola, equilibrando trabalho e estudos.

 

— Tive aulas na Providência, mas os professores não traziam esse contexto, de um Machado daqui — diz Luan, que está concluindo o curso de Geografia na Uerj. — Saber que ele morava aqui e era negro, como a maioria dos alunos, nos aproximou dele, além de nos dar uma referência. A gente sabe que ele foi uma exceção. Mas, como muita gente aqui, estava tentando mudar seu destino. Foi assim que percebi que a universidade, tão perto fisicamente, poderia estar perto também do imaginário.

O Livramento de Machado, porém, era um bocado diferente do de Luan. A violência, por exemplo, não chegava a preocupar. A região era uma grande chácara e, acima, no morro da Providência, a favela nem existia ainda. Mas a área já era segregada. Não por acaso, uma das metáforas mais fortes da obra do autor é a “ilha”, como lembra o escritor Silviano Santiago, autor do romance “Machado”, sobre a velhice do Bruxo.

Machado de Assis em foto clássica do século XIX (esq.) e na versão da campanha Machado Real Foto: Divulgação / Agência O GLOBO
Machado de Assis em foto clássica do século XIX (esq.) e na versão da campanha Machado Real
Foto: Divulgação / Agência O GLOBO

Negro numa sociedade escravocrata, Machado teve que inventar, segundo Santiago, um “projeto existencial” só seu para ascender socialmente. Também contou com algumas oportunidades pouco comuns para alguém de seu meio, como pais que sabiam ler e escrever, e a proximidade com pessoas que puderam lhe ensinar outros idiomas, como latim e francês. Um misto de sorte e genialidade, que o fizeram ser um ponto fora da curva.

 

— Ele teve que se resolver por conta própria: já que não tinha apoio da escola nem do Estado, empurrou a si mesmo —diz Santiago. — Mas é importante lembrar que estamos falando de um gênio.

Quase 200 anos depois, a trajetória do Bruxo inspira o estudante Charles Gomes, 21 anos, que cursa o pré-vestibular Machado de Assis. Morador da Providência e sonha em fazer faculdade de Geografia, coisa que nem imaginava anos atrás.

— A mentalidade racista está na nossa própria casa, a gente é criado para achar que só serve para o trabalho braçal — conta Charles. — A gente acha que o museu perto da Providência não é para nós, que a biblioteca não é para nós. Mesmo quando é gratuito, achamos que é pago. Está tão perto e ao mesmo tempo tão distante. É como se a cultura não fosse para nós. Ninguém fala, mas a gente sente.


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