“O Bolsonaro não faz a menor questão de não ser um lambe-botas do Trump”, recitou Lula nesta quarta-feira, indignado com a postura do atual governo na crise entre o Irã e os Estados Unidos. Nenhuma surpresa. Entre 2003 e 2010, o inventor da política externa da canalhice caprichou no papel de aliado incondicional do regime parido pelos aiatolás atômicos. E não perdeu nenhuma chance de reiterar que era um aplicado lambe-botas do companheiro iraniano Mahmoud Ahmadinejad.
Em julho de 2010, por exemplo, o Brasil foi alcançado pela comoção planetária provocada pela saga de Sakineh Mohammadi Ashtiani, viúva de 43 anos presa por adultério, punida com 99 chibatadas e condenada à morte por apedrejamento. Manifestações amplificadas pela internet refletiram o assombro do mundo civilizado com detalhes do ritual introduzido em 1983 no código penal islâmico. Entre outros espantos, descobriu-se que até a lei que regulamenta a execução a pedradas trata mulheres com mais brutalidade.
Os homens são enterrados na areia até a cintura e ficam com os braços livres para tentativas de proteger o rosto. Sakineh não desfrutaria desse privilégio. As mulheres são enterradas até a altura do busto, com as mãos amarradas por cordas e o corpo enrolado num tecido branco. O grupo de executores, liderado pelo juiz que assinou a sentença, inclui os jurados que ordenaram a condenação, parentes da vítima, figurões da comunidade e voluntários. Todos são homens: no Irã, mulheres não apedrejam; só podem ser apedrejadas.
Para que a plateia não se sinta frustrada pela morte rápida, as pedras que circundam a condenada são menores. O juiz atira a primeira. A agonia que se encerra com o traumatismo craniano não dura menos que uma hora. Tanto pelo espetáculo da perversidade primitiva quanto pela inexistência de crime, milhares de brasileiros decidiram lutar pelo cancelamento do espetáculo da barbárie. E alguém teve a ideia de lançar a campanha “Liga, Lula”, amparada na crença de que Mahmoud Ahmadinejad não se negaria a atender a um pedido de clemência formulado pelo amigo brasileiro.
Lula também achava que ouviria um sim. Mas decidiu que não socorreria Sakineh, gaguejando frases que ergueram um monumento ao besteirol. “Eu, sinceramente, não acho que nenhuma mulher deveria ser apedrejada por conta de… ter, sabe, traição”, enrolou-se numa entrevista. “Mas um presidente da República não pode ficar na internet atendendo tudo que alguém pede de outro país. É preciso cuidado, porque as pessoas têm leis, as pessoas têm regras, as pessoas, sabe… Se começam a desobedecer as leis deles para atender o pedido de presidentes, vira uma avacalhação”.
Lula sempre se orientou por conveniências eleitoreiras, afinidades políticas, laços de parentesco ideológico e cumplicidades mafiosas. Fidel Castro, por exemplo, emplacou três pedidos em três anos. Foi para atender ao capataz de Cuba que o presidente mais tarde engaiolado por roubalheira autorizou a deportação dos pugilistas Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, fez que não leu a carta da blogueira Yoani Sanchez e acusou o preso político Orlando Zapata de se deixar morrer no 85° dia da greve de fome.
Foi para afagar Hugo Chávez que Lula transformou a embaixada em Honduras na pensão do Zelaya e virou parceiro das FARC. No momento em que se negou a socorrer Sakineh, “em respeito às leis do Irã”, o vigarista de nascença estava ajudando Hugo Chávez a estuprar as leis da Colômbia para financiar as torpezas dos narcoterroristas enfurnados na selva. Naquele julho de 2010, Lula recitava de meia em meia hora que Dilma Rousseff merecia a Presidência sobretudo por ser mulher. Mas não merecia misericórdia a iraniana que, por ser mulher, teria o rosto desfigurado por pedradas mortais. Também a candidata não deu um pio sobre o drama vivido pela adúltera marcada para morrer.
A mobilização internacional conseguiu que Sakineh escapasse da execução decretada pela ferocidade de alguns governantes e pela indiferença cafajeste de outros. Ela estava em liberdade quando o sabujo de Ahmadinejad foi para a cadeia em Curitiba.