Raimundo Floriano
Encantadores olhos verdes
Tenho o prazer de arpresentar-lhes verdadeira preciosidade, configurada nesta cantora, ícone da MPB há muito tempo no ostracismo, no baú do esquecimento da Memória Nacional.
Linda Rodrigues, batizada Sofia Gervazone, nasceu no Rio de Janeiro (RJ), a 11 de agosto de 1919, onde faleceu em novembro de 1997. Foi considerada uma das cantoras que melhor representaram a dor de cotovelo.
Carioca, nascida na Tijuca, sua formação moral foi das mais rígidas, pois fez o Curso Primário e o Ginasial na Escola Maria Raythe, um colégio de freiras do bairro, sendo seu padrinho de crisma o Cardeal Dom Sebastião Leme, que gostava muito dela. Atendendo um pedido de sua mãe, formou-se em Enfermeira pela Escola Ana Nery, embora nunca tenha exercido a profissão. Começou a estudar Medicina em Belém do Pará, onde morou 2 anos com a irmã e o cunhado, que era comandante da Marinha de Guerra. Pouco depois, sua mãe falecia.
Sua primeira experiência artística aconteceu em 1936, no Rio de Janeiro, quando cantou na Radio Transmissora, sob a orientação de Renato Murce, atuando ao lado de Odete Amaral, Ciro Monteiro, Orlando Silva e Emilinha Borba, que era igualmente amadora como Linda.
Poucos são os dados biográficos sobre essa grande cantora da Velha Guarda, por isso, vou ater-me, daqui pra frente, ao que consta do Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira.
Começou a carreira artística em 1945, na Continental, onde gravou os sambas Enxugue as Lágrimas, de Elpídio Viana e Carneiro da Silva e Abaixo do Nível, de Alvaiade e Odaurico Mota. Daí em diante, consolidou seu nome no mercado fonográfico.
Em 1946, gravou a marchinha Atchim, de J. Piedade e Príncipe Pretinho, e o samba Claudionor, de Cândido Moura e Miguel Bauso. Em 1948, gravou a rumba Jack, Jack, Jack, de Haroldo Barbosa e Armando Castro, e o samba-canção Mais Um Amor, Mais Uma Desilusão, de José Maria de Abreu. Em 1951, gravou, pela Star, o samba-canção Os Dias Que Lhe Dei, de Newton Teixeira e Airton Moreira, e o samba Raça Negra, de Ailce Chaves e Paulo Gesta. Em 1952, gravou o samba Lama, de Paulo Marques e Ailce Chaves, que veio a ser, não apenas seu maior sucesso como um dos sambas-canções mais celebrados no repertório da fossa, e o bolero Nossos Caminhos, de Airton Amorim e Nogueira Xavier.
Lama embalou os momentos seresteiros de minha juventude e mereceu inúmeras regravações, inclusive de outras consagradas intérpretes, como Ângela Maria, Núbia Lafayette, Maria Bethânia e, há bem pouco tempo, relançada pelo forrozeiro/brega João Bandeira.
Em 1953, gravou, pela Sinter, o samba Sombra e Água Fresca, de Geraldo Mendonça e Russo do Pandeiro, e a marchinha Bambeio Mas Não Caio, de Elvira Pagã, Ailce Chaves e Paulo Marques. Em 1954, gravou o samba Sereno Cai, de Raul Sampaio e Ricardo Galeno, e a marchinha Tá Tão Bom, de Três Amigos. Em 1955, gravou, pela Continental, o samba Ninguém me Compreende, de Peterpan, e o samba-canção Vício, de sua autoria e José Braga, com acompanhamento de Guaraná e sua Orquestra. No mesmo ano gravou, pela Todamérica, a marchinha Rico É Gente Bem, de A. Rebelo, Jorge Rupp e Ari Monteiro, e o samba Folha de Papel, de Paulo Marques, Sávio Barcelos e Ari Monteiro.
Em 1956, gravou os sambas-canções Farrapo Humano, de sua autoria e Ailce Chaves, e Queimei Teu Retrato, de Noel Rosa e Henrique Brito. Em 1957, gravou os sambas Violeta, de Mirabeau e Dom Madri, e Recompensa, de Tito Mendes, Nilo Silva e Osvaldo França. No mesmo ano, gravou os sambas-canções Pianista, de Irani de Oliveira e Ari Monteiro, e Comentário Barato, de Jaime Florence e J. Santos. Em 1958, gravou os sambas Chorar Pra Quê?, de Aldacir Louro e Silva Jr., e Quando o Sol Raiar, de Mirabeau, Sebastião Mota e Urgel de Castro. No mesmo ano, registrou ainda o samba Sereno no Samba, de Aldair Louro e Dora Lopes, e o bolero Nada Me Falta, de sua autoria e Aldacir Louro, e teve a marchinha Copa do Mundo e o samba Samba da Vitória, ambos com Aldacir Louro, gravados na RCA Victor pelo Coro e Orquestra RCA Victor. Em 1959, gravou, pela RCA Victor, o samba Tem Areia, de sua autoria e José Batista, e a marchinha Marcha da Folia, de sua autoria, Aldacir Louro e Silva Jr.
Em 1960, gravou os sambas-canções Negue, de Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos, e Tenho Moral, de sua autoria e Castelo. No mesmo ano, gravou Companheiras da Noite, samba-canção de sua autoria, Ailce Chaves e William Duba. Em 1961, lançou, pela Chantecler, o LP Companheiras da Noite:
FAIXAS DESSE ÚNICO LP DE LINDA RODRIGUES:
LADO A
1 - Lama (Ailce Chaves e Paulo Marques)
2 - Negue (Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos)
3 - Tião (Jair Amorim e Dunga)
4 - Pedro no Caminho (Aldacyr Louro e Linda Rodrigues)
5 - Documento (Aldacyr Louro e Linda Rodrigues)
6 - Final de Nosso Drama (Aldacyr Louro e Linda Rodrigues)
LADO B
1 - Aquelas Mãos (Aldacyr Louro e Linda Rodrigues)
2 - Pó do Asfalto (Aldacyr Louro e J. Portela)
3 - Cigarra Noturna (Aldacir Louro e Genival Melo)
4 - Companheiras da Noite (Ailce Chaves e William Duba)
5 - Tenho Moral (Linda Rodrigues e Castelo)
6 - Escondida (Luiz Alcarez; versão de Martha de Almeida)
Como visto acima, Além de cantar, Linda Rodrigues era compositora e fez parcerias com grandes criadores como J. Piedade, Ailce Chaves, Aldacir Louro, José Batista, Castelo, José Braga e outros.
No ano de 1955, o samba-canção Vício, fruto de uma parceria com José Braga, levou-a às paradas de sucesso. Sua discografia, que vai de 1945 a 1961, gira em torno de 50 títulos.
O início da Década de 1960, com o aparecimento da Bossa Nova e o incremento do Rock, foi cruel para o pessoal da Velha Guarda e marcou a retirara voluntária de Linda Rodrigues do meio artístico. Poderia, com suja esfuziante beleza, ser uma das estrelas da TV. Mas os tempos modernos requeiram novas caras, o que resultou em impiedosa iconoclastia.
Esta foi uma das poucas estrelas do sul-maravilha que conheci em Teresina (PI), onde estudava, em 1953, quando, após o retumbante sucesso de Lama, fez uma turnê pelo Nordeste, sendo por lá praticamente desconhecida.
Linda Rodrigues nadou de braçada pelos ritmos dominantes em sua época. Como amostra disso, aí vai esta pequena seleção:
Chorinho - Banco da Praça, Paquito, Ciro de Souza e João Bastos Filho;
Marchinha - Barca da Cantareira, de Arnaldo Ferreira e J. Rupp;
Samba - Cantora de Samba, de Armando Régis;
Rumba - Jack, Jack, Jack, de Haroldo Barbosa e Armando Castro;
Bolero - Nossos Caminhos, de Airton Amorim e Nogueira Xavier, tremendo sucesso em 1952; e
Samba-canção - Lama, de Paulo Marques e Ailce Chaves, sucesso absoluto ontem, hoje e sempre.