João Domingos, O Estado de S.Paulo
27 Outubro 2018 | 05h00
Cientistas políticos, sociólogos e outros estudiosos da situação brasileira indagam quais foram as razões que levaram o País a essa polarização extrema entre os apoiadores de dois candidatos antípodas. Situação que, mesmo com a eleição de amanhã, que escolherá um deles presidente da República, dificilmente acabará.
É possível que esses estudiosos venham a se concentrar sobre o tema por muito tempo. Pode ser que a resposta nunca seja encontrada. Ou que não exista apenas uma resposta, mas várias.
O Brasil se cansou dessa vida de abusos quase que diários no que se refere ao ir e vir do cidadão. Ele sai de sua casa de madrugada, a duas horas do trabalho, quando tem trabalho, e corre o risco de encontrar a rua bloqueada por algumas pessoas que, também descontentes com alguma coisa, resolvem botar fogo em pneus e fazer o bloqueio da passagem por horas.
É quase que uma vida de castas. Mesmo que não hajam regras regulamentando isso, a prática mostra que existem os cidadãos de categorias A, B, C, D, e assim vai. Um detalhe: esses cidadãos votam.
Os partidos políticos não perceberam o descontentamento que tomou conta da população desde 2013. Em junho, protestos tiveram início nas ruas de todo o País. A princípio, contra o aumento das passagens de ônibus. Depois, contra o escândalo da construção dos estádios superfaturados da Copa da Fifa, ou contra coisa nenhuma.
Dilma Rousseff, a presidente mais sem noção do período recente, viu naquilo um desafio à sua própria pessoa, não ao sistema de privilégio de uns e maltrato de outros. Os manifestantes gritavam: “Não vai ter Copa”. Dilma respondia: “Vai ter Copa. Será a Copa das Copas”. (Nem é preciso lembrar que o Brasil tomou uma surra da Alemanha por 7 a 1 e a Copa das Copas foi esquecida). Quando a situação saiu do controle e a sede do Itamaraty quase foi incendiada, Dilma convocou uma reunião de emergência de governadores e prefeitos de grandes cidades. Anunciou um plano com cinco eixos, um deles uma reforma política a ser feita por uma Constituinte exclusiva, que seria aprovada por meio de um plebiscito. Um delírio. Os outros pactos tratavam da saúde, educação, transportes e responsabilidade fiscal.
Nada se cumpriu. Da responsabilidade não se falou mais. Em 2016 o País entrou na maior recessão de sua História. Dilma acabou afastada, pois sem base parlamentar.
O PT e seus estrategistas disseram que as manifestações faziam parte de um movimento de direita, destinado a sabotar o governo. As prisões de dirigentes do partido por envolvimento em corrupção pesada foram todas jogadas nessa suposta orquestração, da qual participariam os meios de comunicação e o Judiciário. Os petistas acharam que as coisas se acomodariam. Nem perceberam que um deputado do baixo clero, considerado quase que folclórico por seus pares, viu na rejeição ao PT sua oportunidade. Começou a trabalhar. De repente, outdoors com fotografias gigantes de Jair Bolsonaro começaram a aparecer por diversos cantos do País. O PT avaliou a situação e concluiu que Bolsonaro era sua oportunidade de voltar ao poder. Era muito melhor enfrentá-lo do que a Geraldo Alckmin. Assim, orientou seus militantes a centrar fogo no tucano e a poupar Bolsonaro durante a pré-campanha. Direta ou indiretamente, o PT foi responsável pela candidatura de Jair Bolsonaro.