Durante as minhas últimas miniférias juninas, devidamente auxiliadas pela Sissa, sempre presente e fiscalizante, resolvi consultar, por e-mail, alguns companheiros de viagem terrestre, total de 26, das Ciências Humanas, residentes em onze estados brasileiros sobre leituras que muito os impactaram. De notoriedades diferenciadas, carreiras profissionais envolvendo ensino, pesquisa, escriturâncias, debates e militâncias, suas indicações me conduziram a momentos de muita certeza no tocante ao futuro da humanidade. Apesar dos inúmeros angustiantes instantes contemporâneos, quando os acinzentamentos provocados pelas ambições de um neoliberalismo que se está agigantando para um ambicionado todo um sempre nada promissor, recebi respostas esclarecedoras.
As leituras abaixo eleitas, dentre as citadas mais de cinco vezes, bem demonstram o atual momento leitoral brasileiro, a refletir anseios de uma sociedade que se vê necessitada de uma compreensão mais consistente do seu todo e das suas partes, incluindo os versos e os reversos das situações econômicas, sociais, religiosas, militares e políticas de um mundo em renascença. Enumero-as, abaixo, em nenhum momento levando na devida consideração a ordemde magnitude das leituras mencionadas.
1. Sobrados e Mucambos, de Gilberto Freyre, editora Global, com uma apresentação de Roberto Da Matta, atualmente Professor Emérito da Universidade de Notre Dame, EEUU. Livro muito beneficiado, segundo o próprio DaMatta, pelas notáveis coordenações de Edson Néry da Fonseca, Guillermo Giucci e Enrique Rodriguez Larreta, quando da elaboração crítica de Casa Grande & Senzala. Diz DaMatta: “O que tenta Gilberto demonstrar, correndo o risco de ser chamado reacionário e um ideólogo de um escravismo doce, é que o sistema funcionava hierarquicamente. As diferenças não corriam em paralelo, mas faziam parte de uma geometria social de inclusão, uma figura na qual os senhores englobavam, mas eram também englobados por seus escravos, com os quais mantinham laços de interdependência”.
2. O Atiçador de Wittgenstein, de David Edmonds e John Eidinow, Difel – narrativa jornalisticamente inteligente, com sinais de muita pesquisa investigatória, contando o entrevero acontecido entre Ludwig Wittgenstein e Karl Popper, em outubro de 1946, quando de uma das reuniões da Associação de Ciências Morais de Cambridge, que contava, na ocasião, com a presença de Bertrand Russell, para quem “suas avalanchas (de Wittgenstein) fazem as minhas parecerem meras bolas de neve”.
3. O terceiro texto – Nas Sendas do Judaísmo, Walter Rehfeld, Perspectiva – me deixou mais próximo de Saulo Gorenstein, Arão Parnes, Estellinha Parnes, Germano Haiut e tanto outros amigos hebreus. O texto do Rehfel, destinado a pequenos cursos, ensaios, palestras e artigos publicados na Resenha Judaica, é fonte erudita – sem pedantismos academicistas – para se ampliar o conhecimento sobre o Judaísmo, suas origens, sua filosofia, suas maneiras de ser e de ter, naturalmente. Um excelente requisito para se ler com mais clarividência o estudo de Jacques Attali recentemente lançado pela Futura sob título Os judeus, o dinheiro e o mundo, com prefácio de Henry Sobel.
4. O quarto texto é oportuno, numa hora de novas ebulições ministeriais. Lançado pela Autêntica, e intitulado A economia política da mudança – os desafios e os equívocos do início do governo Lula -, contém análises que certamente contribuirão para a implementação de debates eleitorais de alto nível, onde o futuro brasileiro seguramente sobrepairará sobre os disse-me-disses das campanhas políticas. O mote dado pelo João Antônio de Paula, organizador: “Queremos fazer uma crítica solidária, de esquerda, mas não há como fugir dos problemas, não dá para abrir mão da crítica”. O exemplo do Titanic não pode ser esquecido pelos “com-certezas” da cúpula governista, que se imaginam caminho único para espraiar vida mais decente para todos os segmentos sociais.
5. Muito apreciaria ver os amigos fubânicos lendo um livro que me deixou bem mais alegre e esperançoso, apesar das imensas perspectivas negativistas que ainda pairam sobre nosso continente: Diderot e a Arte de pensar livremente, Andrew S. Curran, São Paulo, Editora Todavia, 2022, 388 p. Um estudo exemplar sobre um ser humano encantador. Uma personalidade cada vez mais independente, trezentos anos depois da sua desencarnação. Uma leitura binoculizadora para os pensantes de todos os níveis de espiritualidade, jogando na lata do lixo existencial os negativismos incultos e sectários metidos a merdantários (mandatários de merda).
Vale a pena dar uma mergulhada nelas, rabiscativamente.