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As escolhas dos irmãos Joyce e João Paulo refletem o comportamento eleitoral do brasileiro médio |
Ainda há resquícios da corrida eleitoral por todos os lugares. Passada uma semana do segundo turno das eleições, apoiadores do presidente eleito e opositores dele ainda sofrem com rusgas e discussões causadas pelos embates ideológicos. Nesse cenário, a parcela jovem da população é uma das mais atingidas. De acordo com levantamento do Datafolha, na véspera da votação, se dependesse das mulheres que têm entre 16 e 24 anos, Fernando Haddad, do PT, seria presidente do país com quase 60% dos votos. Já se a decisão estivesse na mão dos homens dessa faixa etária, o resultado seria parecido com o do último domingo: 60% para Bolsonaro e 40%, para Haddad.
Na casa da família Freitas, a situação não é diferente. Separados pela ideologia, os irmãos Joyce, 19 anos, e João Paulo, 24, votaram seguindo a disposição: ela, em Haddad; ele, em Bolsonaro. Joyce é estudante de arquivologia na Universidade de Brasília (UnB). João estuda direito no Centro Universitário Iesb e é militar. Desde as eleições, deixaram de se falar. Para ela, o irmão, “assim como os eleitores de Bolsonaro”, “não defende o feminismo”. “Eu me considero feminista”, diz. Para ele, a irmã foi “suscetível a uma ideia em que ele não acredita”. “Eu saí de casa com 17 anos e fui para o Exército Brasileiro. Ela, com 17 anos, foi para uma faculdade federal, onde a esquerda está presente”, opinou.
Casos como o de Joyce e João Paulo estão espalhados pelas rodas de conversas, pelas salas de aula e pelos ambientes familiares. Reflexo da votação geral, o comportamento eleitoral deles foi, segundo especialistas ouvidos pelo Correio, influenciado pelo gênero e pelas motivações pessoais.
O cientista político Cristiano Noronha, vice-presidente da Arko Advice, acredita que os ideais de igualdade discutidos com mais firmeza nos últimos anos pelas mulheres motivou as jovens a votarem em Haddad, e não em Bolsonaro. “Essa juventude é formada por meninas que nasceram em uma nova vertente. É um momento em que a sociedade prega mais liberdade. Como foi feita uma campanha muito forte ressaltando a questão do conservadorismo do Bolsonaro — e, eventualmente, se passou que ele defendia direitos diferentes para homem e mulher —, isso acabou levando, principalmente elas, a não necessariamente apoiarem o PT, mas a refutarem teses conservadoras”, analisa.
PerfisJoyce está enquadrada no perfil delineado pelo cientista político. De acordo com ela, “algumas ideologias do PT não são ideais, mas (nas eleições) era a melhor opção”. “Eu, por ser mulher, sofro com o machismo. Quando vi que as opções eram Haddad e Bolsonaro, já havia decidido que no Bolsonaro não votaria de jeito nenhum. Então, fiz propaganda para o Haddad”, explica. Já João Paulo preferiu priorizar a ideologia liberal econômica e o discurso anticorrupção. “O Brasil precisava de um rumo devido ao desemprego. Nesse contexto, a corrupção da esquerda e do PT foi só aumentando. Já excluí a esquerda de cara”, conta João.
60%Porcentagem de mulheres entre 16 e 24 anos que votaram em Haddad e de homens da mesma faixa etária que escolheram Bolsonaro, segundo o Datafolha.