Quando se fala da História Antiga, é difícil separar a realidade da fantasia. É o que acontece quando se discorre sobre a vida do terceiro imperador de Roma, Caio Júlio César Augusto Germânico, conhecido como Calígula, que reinou de 37-41 d.C. Calígula era da dinastia júlio-claudiana e passou para a história como um dos mais cruéis, polêmicos e extravagantes imperadores romanos.
O incondicional amor que esse Imperador nutria por seu cavalo, Incitatus (em latim, Impetuoso), levou-o à loucura de nomeá-lo Cônsul de Roma e Cônsul da Bitínia, uma antiga região do noroeste da Ásia Menor, na costa do Mar Negro. Contam os historiadores que isso era uma afronta ao Senado e às Instituições que ele desprezava, como déspota absoluto.
Incitatus tratava-se de um cavalo de corrida, trazido da Hispânia, de onde, na época, Roma importava cerca de 10.000 cavalos por ano. Hispânia foi o nome dado pelos romanos à Península Ibérica (atuais Portugal, Espanha, Andorra, Gibraltar e uma pequena parte ao sul da França).
De acordo com a biografia de Calígula, de autoria do escritor Suetônio, Incitatus tinha cerca de dezoito criados pessoais, era enfeitado com um colar de pedras preciosas e dormia no meio de mantas de cor púrpura (a cor púrpura era destinada somente aos trajes imperiais, ou seja, era um monopólio real). Foi-lhe também dedicada uma estátua em tamanho real, de mármore, com um pedestal em marfim. Por se tratar de um cavalo de corrida, Calígula exigia, na noite anterior à sua competição, um silêncio absoluto da cidade de Roma, para que não fosse incomodado o sono do animal, com quem o imperador dormia. O castigo, a quem ousasse interromper o silêncio, era a pena de morte.
O cavalo era, na realidade, o verdadeiro imperador, com poderes absolutos.
Verdade ou não, é interessante se conhecer a História Antiga, que foi construindo a História Moderna através dos séculos, para que se reconheça o que a Humanidade conquistou em matéria de liberdade. As possíveis loucuras dos atuais governantes não são nada, se comparadas às loucuras dos antigos imperadores e reis despóticos, tiranos e absolutistas do passado.
Estamos muito distantes do que foram os impérios antigos e suas arbitrariedades. Somente os pessimistas fanáticos não enxergam a realidade.
É importante que nas escolas se ensine a História Antiga, para se entender melhor e apreciar os saltos que a Humanidade deu, à procura de uma dignidade maior das pessoas, de uma visão mais clara dos direitos humanos, e do direito da sociedade de compartilhar o poder com os políticos.
Somente para lembrar os saltos para melhor da história humana, basta recordar que, por exemplo, nos tempos de Calígula e até séculos depois, os pais tinham o direito de vida e morte de seus filhos ao nascer. Podiam concedê-los o direito à vida ou, se não gostassem, podiam sacrificá-los.
O estatuto dos direitos da infância à vida e à necessidade de ser respeitados só tem 25 anos. Por sua vez, a mulher, há menos de um século, era mais um objeto nas mãos do homem do que uma pessoa com direitos. Na Espanha, há pouco tempo as mulheres não podiam viajar sem a permissão de seus maridos, estudar na Universidade, ter uma conta corrente.
Sem contar com os avanços da ciência e da medicina, que nos permitem viver mais do que nunca, demos saltos gigantescos na política e nas ciências sociais. Hoje a palavra escravidão é condenada, e ninguém pode ser punido por suas crenças e seus gêneros, nos países que chegaram a um certo grau de democracia e respeito pela individualidade.
Devemos ser resistentes às tentações dos governantes, de querer voltar aos tempos dos absolutismos. A resistência da sociedade e as lutas pelas liberdades, hoje nos permitem dizer que os tempos atuais são bem melhores, do que aqueles que a História Antiga nos mostra.
Os loucos, ao modo de Calígula, chegam a parecer ficção.