IMPRENSA LIVRE E DEMOCRÁTICA
A. C. Dib
Enseja preocupação os reiterados e virulentos ataques que o Presidente Jair Bolsonaro promove contra veículos de comunicação e contra jornalistas. A divulgação de qualquer notícia que não lhe caia no gosto desperta a hipersensibilidade e a ira presidencial.
Despiciendo dizer que o grande fetiche e fantasia dos tiranos é o de poder controlar a imprensa. Noticiazinhas açucaradas, cor de rosa, favoráveis, abonadoras, aduladoras, estas sim, são válidas, aceitáveis, dignas de nota. Notícias desfavoráveis ─ ainda que verdadeiras e corretíssimas ─ constituem perseguição, complô e trama rocambolesca, urdida por satânicos e implacáveis inimigos, com o fim de desestabilizar o governo.
Vale recordar que, há bem pouco tempo, os próceres e altos dignitários do Partido dos Trabalhadores, frente a escabrosos crimes atribuídos a membros do partido, ao invés de explicarem os fatos delituosos, refutando fundamentadamente as imputações que lhes pesavam, buscavam “defesa” no ataque, ou melhor, atacavam jornais, emissoras de televisão e jornalistas, que acusavam de parciais. Caso emblemático foi o da jornalista Miriam Leitão ─ episódio de triste memória ─ covardemente agredida, quase linchada, em um avião, no transcurso do voo, por numeroso grupo de petistas, meramente inconformados com a propalação de notícias alusivas à Operação Lavajato. Hoje aferimos ataques à jornalista, nas redes sociais, mui semelhantes aos anteriores, só que produzidos por bolsonaristas.
Em entrevistas e pronunciamentos concedidos antes da posse, nosso Capitão/Presidente firmou “compromisso sagrado” com a observância da Carta Constitucional e com a preservação da democracia. Esperamos não aflorar a velha vocação autoritária, tantas vezes manifestada em contundentes pronunciamentos remanescentes de sua longeva ─ e marcante ─ passagem pelo Congresso Nacional. Que os deuses atenienses venham a iluminá-lo, afastando-o das tentações totalitárias.
Chover no molhado é afirmar que a imprensa livre é um dos pilares do regime democrático. Não impera a democracia sem uma imprensa livre, independente, atuante, séria, comprometida com a verdade dos fatos e que proporcione a todo o povo acesso pleno à informação desimpedida de qualquer amarra ou censura.
Além do mais, motiva preocupação e temor o mal exemplo presidencial. Não faz muito tempo, hordas de internautas, nas redes sociais, descrentes dos rumos percorridos pela Nação, batiam na tecla da “intervenção militar” como forma de sanar miraculosamente os problemas da Pátria. Esses mesmos internautas, partidários do golpismo e da ditadura militar, serenaram os ânimos frente à eleição de Bolsonaro. Agora, na linha do líder e mestre, postam às escâncaras mensagens contra órgãos da imprensa e contra jornalistas, a quem acusam de perseguir O Mito. Já dizia o saudoso Umberto Eco que as redes sociais deram voz aos imbecis, vaticínio que se confirma nos dias presentes. E como se não bastasse a irracionalidade vigorante na internet, vem o Presidente da República, a quem toca o bom exemplo dos líderes políticos comprometidos com a causa democrática, atiçar os ânimos, encorajar o desatino e abrir as portas ao autoritarismo, com ataques e respostas duras a toda e qualquer crítica recebida.
O Imperador Pedro II e o Presidente Juscelino Kubitschek, esses autênticos estadistas, seguramente os maiores líderes brasileiros que a História registra, ignoravam olimpicamente críticas contidas na imprensa, mesmo ataques truculentos, vinculados por determinados jornais, produzidos por opositores. Aos ataques respondiam, serenamente, com obras, realizações, feitos patrióticos, abraçados, sempre, ao ideal da democracia e da liberdade de imprensa e de expressão. Getúlio Vargas, dizem, em sua “fase democrática” ─ posterior ao Estado Novo, urge esclarecer ─, na altura de sua inconteste experiência e sapiência política, pagava humoristas para produzirem anedotas tendo-o por personagem. Churchill ─ por sinal, uma das referências de Bolsonaro ─ sabia, como ninguém, rir de si mesmo, tirando vantagens políticas de suas fraquezas e convertendo derrotas em vitórias. Já Fernando Collor de Mello, o Caçador de Marajás, por sua vez, respondia agressiva e ameaçadoramente a toda e qualquer crítica, empregando aí seu porta-voz, o jornalista Cláudio Humberto, a quem cabia insultar os adversários, criando para tanto, inclusive, o bordão “bateu, levou”. Defenestrado do poder, não deixou grande saudade.
Que a maturidade política, finalmente, aflore no coração e na mente de nosso Presidente e que a imprensa brasileira faça o seu salutar trabalho, cumprindo o papel que lhe cabe na ordem democrática, com destemor, altivez e independência, livre da tutela e da intimidação dos autoritários de plantão.
Texto repleto de viés comunista