Aluisio Lopes glosando o mote:
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
Um pequeno vivente exilado
Canta o solo agrural da orfandade
No pequeno calabouço da saudade
Uma lágrima, no canto afinado
Lembra o laço que o tornou destronado
Do seu reino, velho angico altaneiro
Dos filhotes, não sabe o paradeiro
Um covarde caçador desfez seu ninho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
Vá na mata , sinta o cheiro da ramagem
O olor das flores, seu verdume
As abelhas doidivanas, no costume
Um regato cristalino, bela imagem
Borboletas multicores em passagem
Pergunte lá; se está tudo prazenteiro
Se, sem musica, sem cantor, isto é certeiro
Fauna e flora lhe responde: é só espinho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
Sob o visgo da covarde armadilha
De um covarde que não teve coração
Mente má que semeia escuridão
Mão cruel que apaga a luz que brilha
Que descarta a liberdade da cartilha
Que despreza o que disse o conselheiro
Ainda há tempo se arrependa companheiro
Deixe o menestrel voltar pro seu cantinho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
Quem não fez nenhum crime, o que merece?
Sem juízo, viver posto na prisão?
Pegar pena perpétua, sem razão?
Então, o que quer que ele confesse?
Se o homem é o rei, por que se esquece?
Que liberdade, só presta por inteiro
Que esse bicho pequenino é o curandeiro
Dos que sofrem na mata sem carinho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
O pentagrama natural da mãe natura
Sente a falta das notas do cantor
Quando em solo delirante, o torpor
Invadia tudo em sua tablatura
O compasso da pequena criatura
Fez-se pausa no tempo, em tempo inteiro
Em exílio eternal do seu terreiro
Melancólico, canta então pobre bichinho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
Um corista está faltando no coral
A sinfônica sente a falta do cantor
Sente a flora, o gorjeio que faltou
A cantata de então não é igual
Sua falta faz falta no festival
Se perturbe, se comova carcereiro
Quebre as talas, abra a porta do viveiro
Deixe a mata ter de volta o cantorzinho
Toda vez que se prende um passarinho
Diminui na floresta um seresteiro.
* * *
Gregório Filó glosando o mote:
Meu engenho de saudade
Quebra cana todo dia.
O meu engenho de aço
Não moeu mais uma cana
Já faz mais de uma semana
Que um alfenim eu não faço
Não vendi mais um cabaço
De garapa a freguesia
A máquina da nostalgia
É que trabalha à vontade
Meu engenho de saudade
Quebra cana todo dia.
Nunca mais fiz uma farra
Por causa da falta dela
Vou como um boi de barbela
Atrelado à almanjarra
A moenda só esbarra
De encontro à melancolia
E a fornalha não esfria
Queimando a felicidade
Meu engenho de saudade
Quebra cana todo dia.
* * *
Manoel Xudu glosando o mote:
A viola é a única companheira
Do poeta nas horas de amargura.
Se eu morrer num sábado de aleluia
E for levado ao campo mortuário,
Se alguém visitar o meu calvário,
Jogue água em cima com uma cuia.
Leve junto a viola de imbuia,
Deixe em cima da minha sepultura.
Muito embora que fique uma mistura
De arame, de pus, terra e madeira,
A viola é a única companheira
Do poeta nas horas de amargura.