O ministro onipotente, onisciente e onipresente premiou o Brasil com o surgimento do único Juiz dos Juízes do planeta
Em 2002, quando o advogado e professor de Direito Constitucional se tornou ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes não havia julgado coisa alguma num tribunal. Talvez tivesse arbitrado pendências familiares ou discussões de botequim, o que não autoriza ninguém a caprichar na pose de magistrado de nascença, escalado já no berçário para decidir qual dos bebês em litígio tinha razão. Mas é assim que Gilmar se comporta há 15 anos, e com crescente arrogância.
Entre 2008 e 2010, período em que exerceu a presidência do STF, nasceu o Gilmar onisciente. Em seguida surgiu o onipotente. Neste outono, nasceu o Gilmar onipresente. A soma das três sumidades presenteou o Brasil com o único Juiz dos Juízes do planeta. Ele está em todos os lugares, opina sobre tudo e não admite ponderações em contrário. Até recentemente, os brasileiros comuns aprendiam que um juiz só deve falar nos autos. Gilmar só fala fora dos autos, até porque não é de perder tempo com a pilha imensa de processos que aguardam em sua sala alguns minutos da preciosa atenção do ministro.
Há poucos dias, num pronunciamento em Pernambuco, ele foi mais Gilmar Mendes do que nunca. Decidido a bombardear a Lava Jato, mas sem coragem suficiente para dizer isso com todas as letras, meteu-se num palavrório mais confuso que discurseira de Dilma Rousseff. “Investigação, sim! Abuso, não!”, berrou num começo de parágrafo. Seguiu-se a pausa dramática para os aplausos que não vieram. “Não se pode aceitar investigações na calada da noite!”, exclamou mais adiante. A Polícia Federal, portanto, deve suspender imediatamente as batidas na porta às seis da madrugada e limitar-se a esclarecer crimes entre 9 da manhã e 5 e meia da tarde.
“É preciso que se respeite o Congresso Nacional!”, ordenou o orador. “É preciso que se respeite a política!” Para que o Congresso mereça respeito, para que a atividade política não pareça uma forma de bandidagem, nada melhor que desmascarar e punir os delinquentes que desmoralizam a instituição e colocam sob suspeição todos os integrantes de partidos. É o caminho que a Lava Jato vem percorrendo há pouco mais de três anos, e que Gilmar Mendes adoraria interditar ─ se pudesse. Para alívio do Brasil decente, não pode. Nem ele nem ninguém.