GIGOLÔ
Humberto de Campos
Na pequena mesa redonda, em que havia lugar para três, D. Georgina comentava com a liberdade das suas maneiras, o capítulo de uma revista parisiense sobre um termo de criação recente, que tem, já, uma aplicação universal.
— Eu não sei, nem compreendo, afinal, a prevenção contra esse vocábulo.
— Que vocábulo, minha senhora? — inquiri, intrigado.
— Que vocábulo? O "gigolô", masculino de "gigolete", que toda a gente emprega, hoje, nos salões, nas festas, nos passeios, nos cinemas, sem o menor constrangimento. Uma das minhas amigas, Madame Perez, tem uma cadelazinha a que deu o nome de "Gigolete", e chama-a por essa forma, em qualquer parte, sem o menor escândalo dos que a ouvem. As moças, hoje, andam à "gigolete", vestem-se à "gigolete", fantasiam-se de "gigolete" no Carnaval, e dizem-no sem rebuços, sem temores, sem que se engasguem com a aspereza da expressão. Não se pode, entretanto, falar em "gigolô", nem, mesmo, entre íntimos, sem que haja uma estranheza, um arrepio em todas as almas, principalmente nas que se dizem limpas de pecado. Por que essa diferença, essa disparidade, essa prevenção?
Eu olhei o Dr. Moraes, esposo da ilustre senhora, e, como o visse impassível, dirigi-me à mulher:
— E que é "gigolô", D. Georgina?
— O senhor, então, não sabe, conselheiro? Não sabe, mesmo?
E como lesse a ignorância estampada na minha fisionomia, explicou, virando-se para mim:
— "Gigolô" é o indivíduo adorado por uma mulher que tem outro homem que a ama, e que ela sustenta, à custa do último. Geralmente moço, o "gigolô" é tratado pela mulher que o adora com todos os requintes da paixão. Para ele são os seus melhores beijos, os seus melhores mimos, os seus maiores cuidados. O marido, ou o amante, ordinariamente idoso, fornece-lhe tudo, cercando-a de conforto, de luxo, de abundância, à custa, às vezes, dos maiores sacrifícios. Ela passa, entretanto, tudo isso ao "gigolô", que é, enfim, o único a lucrar com os amores e com o trabalho do outro.