Prédio da Secretária de Saúde onde Fred conheceu a viúva
Fred era um funcionário público exemplar, exceção à regra. Cumpria seu ofício de servidor pau para toda obra. Era um exímio consertador de computadores “pinduras”, “no tranco.” Nunca saiu do setor de trabalho deixando um PC quebrado, sem funcionar. Era uma espécie de MacGyver. Quando não havia peças para consertar, ele improvisava.
Ao nascer, a família lhe pôs a alcunha de Popeye, uma homenagem ao famoso personagem clássico dos quadrinhos em miniatura criado em 1929 pelo desenhista americano Elzie Crisler Segar, por ter a cara meio deformada, sempre com um olho fechado e um protuberante queixo partido ao meio, no formato do rosto do famoso marinheiro, protetor de Oliva Palito.
Mal completou vinte e dois anos, Fred se amancebou com uma colega de trabalho de bunda protuberante e logo depois foram morar juntos, sem ele procurar se inteirar do temperamento dela, que já havia batido na cara de vários namorados e rompido o namoro, quando estes mijavam fora da bacia.
Depois de três anos juntos, Fred já era pai de dois filhos e a mulher fazendo de tudo para lhe pôr rédea. Estabeleceu hora para ele sair e chegar em casa. E quando a condução atrasava e ele chagava atrasado, o inferno estava com as velas vermelhas acesas. Era confusão até altas horas da madrugada. A mulher era uma capota choca, praguejava e acusava-o de tudo, menos de santo. E assim o tempo foi passando e o saco dele se enchendo de impaciência.
Fred passou vinte e quatro anos nesse inferno dantesco, tendo de conviver com uma mulher temperamental, dominadora. Para ela não havia argumento que lhe provasse o contrário de que ele estava com conversa mole com os amigos, raparigando e bebendo cachaça, mesmo ele chegando em casa sem bafo de ingerência de bebida alcoólica.
Passados vinte e quatro anos de brigas, bate bocas, atritos, caras feias, intrigas, indiferenças, malquerenças, Fred resolveu deixar a casa que havia construído com a companheira. Como os filhos já estavam maiores, com cursos superiores concluídos, e ela trabalhava, não havia por que se preocupar com pensão alimentícia.
Ao sair de casa Fred foi morar no kitinete perto do trabalho, alugado de um colega da repartição. Era simples, mas para ele estava bom, pois tranqüilidade não tinha preço.
Três meses depois de deixar a companheira, Fred conheceu uma viúva toda nos trinques, com idade de setenta e dois anos. Ele tinha quarenta e seis. E imaginou: dessa vez eu me arrumo e vou ter a paz de espírito que sempre desejei.
Era amorzinho praqui, amorzinho pralá, e tudo caminhando na mais perfeita sintonia, quando certo dia Fred teve uma decepção que o deixou propenso ao suicídio. Depois de a viúva ter dormido com ele no kitinete, ela foi para casa, mas lhe pediu que à noite fosse ficar com ela, dormirem juntos novamente, mas desta vez na casa dela.
Fred entusiasmado, mas feliz do que pinto no ovo, tomou um banho demorado, se perfumou todo, escovou a prótese dentária, vestiu-se com seu melhor sobretudo branco, jantou e se mandou para a casa da viúva.
Lá chegando, já à distância, percebeu que havia um monte de gente na casa dela. Eram os filhos vindo trazer presentes e comemorar seus setenta e três anos. Como Fred já sabia que os filhos, tradicionais e contrários a mudanças, não aceitavam que outro homem entrasse na vida da mãe, deu meia volta e, decepcionado, macambúzio, voltou para o kitinete e no outro dia foi encontrado enforcado no pé de maxixe, com uma garrafa de Pitu vazia ao lado do corpo.
Suicídio ou catalepsia devido à ingestão da bebida?