FLORIANO, PAIXÃO QUE SE NÃO LIMITA
Raimundo Floriano
Floriano em 1949: Praça da Matriz
Não existe balsense mais florianense da gema do que eu. Desde o meu nascimento, a palavra Floriano soou-me como melodia vinda do céu. E não era para menos. Seu Rosa Ribeiro, meu saudoso pai, homenageando sua terra natal, nomeara-me Raimundo Floriano.
Desde cedo, aprendi a orgulhar-me desse nome. Meus irmãos mais velhos, que estudavam em Floriano, vinham de férias falando nos mágicos encantos da cidade. Assim, eu ansiava pela chegada de minha vez de conhecê-la.
No dia 5 de fevereiro de 1949, aos 12 anos de idade, embarquei no motor Pedro Ivo, rumo ao estudo, ao progresso e ao desconhecido. Logo em Uruçuí, onde o Rio Balsas desemboca no Parnaíba, aquele mar de água. E nele, uma amostra do que seria o porvir: o vapor Brasil – para mim, um navio –, sob o comando do florianense Seu Antônio Anísio, rebocando três imensas barcas, fazia manobras para aportar. No dia 8, desembarquei na rampa de Floriano.
Aguardava-me um estivador chapeado previamente contratado por minha Tia Maria Isaura, moradora à Rua Fernando Marques, 698, para onde seguimos, ele com minha mala e o saco da rede, e eu com o meu assombro diante de tanta coisa nova que se descortinava ante meus olhos.
Bem na rampa, uma frota de jumentos, pertencente a Dona Inês Angelim, carregada de ancoretas d’água para fornecimento à população, subia, em zigue-zague, íngreme ladeira, sabedoria asinina que logo seria transmitida a este matuto, grande admirador dos jegues. Mais adiante, a rua calçada, o meio-fio, a arborização, a casa de Seu Tiago Roque, a Praça da Matriz, a Avenida, os sobrados dos carcamanos, bicicleta com um menino em riba dela, as carroças de Seu Salomão Mazuad, o Riacho do Gato e o Riacho da Onça passando por dentro da metrópole.
Daí pra frente, novos impactos: o Ginásio Santa Teresinha, a Escola Normal Regional, o Cine Natal e outros primores que se me apresentavam, tais como luz elétrica, sorvete, picolé, gelo em barra, gibi, e carro, muito carro, os caminhões de Seu Arudá Bucar, ônibus e jipes.
Se eu pudesse determinar qual a Oitava Maravilha do Mundo, não titubearia em decretar que seria o serviço de alto-falantes, mais conhecido como amplificadora. Em Floriano, havia duas. A Amplificadora Florianense, “a voz líder e potente da cidade”, nas palavras do seu locutor, o Defala Attem, e a Amplificadora do Chico Reis, “a voz do comércio, a maior”, como apregoava o locutor Almir Reis, filho do dono.
Cinema era pago, picolé era pago, sorvete era pago, gibi era pago, mas a amplificadora era diversão acessível a qualquer bolso, mesmo ao mais desprovido. Bastava ter ouvidos e atenção. Uma saía do ar e, ato contínuo, a outra emendava, presenteando-nos com os mais belos sucessos musicais da moda. Essas duas amplificadoras foram, em parte, as responsáveis pelo amor que tomei pela Música Popular Brasileira, pela memória musical que hoje me proporciona meio de ocupar meu ocioso tempo de aposentado, fazendo-me, pelo Orkut, um internauta intensamente procurado por aficionados do mundo inteiro, que me consideram o mais completo, atualizado e atento colecionador, no âmbito da Música Militar, do Carnaval Antigo e do Forró.
Indeléveis na minha memória são os prefixos das duas emissoras. A Amplificadora Florianense iniciava e encerrava seus trabalhos com o dobrado Batista de Melo, de Mathias de Almeida. A Amplificadora do Chico Reis, com o dobrado Antônio José de Almeida, de Horácio Casado.
Quando comecei a ganhar dinheiro, muito tempo depois disso, e pude comprar meu primeiro som, cuidei logo de amealhar essas relíquias. Pena que, neste ano de 2007, ao completar 71, já não encontre pessoas daquela época para trocarmos ideias, tirarmos dúvidas, contarmos reminiscências, matarmos saudades, ouvirmos os sons que marcaram nossas adolescências. E fico telefonando a esmo, na vã esperança de lograr conexão com algum interlocutor contemporâneo, unzinho que seja.
Sossega, coração!
Morei lá apenas um ano. Em 1950, fui estudar em Teresina. Mas minha benquerença, renitente que é, recusou-se a partir.
Agora, no seu 110º Aniversário, não titubeio ao afirmar, sem medo de erro:
Em 1949, Floriano, a minha querida xará, era assim!
Boa noite conterrâneo, fiquei bastante contente com o relato acima, muita riqueza de informações, muito gratificante! Adorei!. Obrigado