Tem fumaça branca na chaminé. Os fiéis da religião chamada futebol podem dizer: Habemus Papam. Ele é polonês. Nasceu em Varsóvia, em 21 de agosto de 1988. Personagem mais badalado do país do Leste Europeu desde o papa compatriota dele, João Paulo II (1920-2005), Robert Lewandowski, de 32 anos, do Bayern de Munique, superou o vice português Cristiano Ronaldo (Juventus) e o terceiro colocado, o argentino Lionel Messi (Barcelona), ontem, na cerimônia remota realizada em Zurique, na Suíça, e conquistou o prêmio de melhor jogador do mundo em 2020.
A eleição de Robert Lewandowki melhor do mundo em 2020 é simbólica. Considerados fora de moda nos debates sobre a preferência pelo falso 9 na era dourada do Barcelona, de Pep Guardiola; e da Espanha, de Luis Aragonés e Vicente del Bosque; os centroavantes ressuscitaram oficialmente na cerimônia virtual de ontem do Fifa The Best, em Zurique, na Suíça. O polonês recoloca camisas 9 raiz, como ele, no trono que a classe não ocupava havia 18 anos.
Talvez você não lembre. O último centroavante eleito número 1 do mundo foi o brasileiro Ronaldo. O Fenômeno arrematou os prêmios da Fifa e da revista France Football em 2002. Naquele ano, havia levado o Brasil ao pentacampeonato na Copa realizada no Japão e na Coreia do Sul. Marcou oito gols. Dois deles na final contra a Alemanha. Chegou ao Mundial como jogador da Internazionale. Conquistou a estatueta vestindo a camisa do Real Madrid.
Daquele ano em diante, o prêmio de melhor do mundo deu as costas aos centroavantes, os matadores numa linguagem popular. Zagueiro, meias e atacantes de lado do campo na linguagem pós-moderna da bola, ou seja, mais pontas do que homens de área, revezaram-se no poder.
Deu Zidane em 2003. Ronaldinho Gaúcho em 2004 e 2005. Cannavaro surpreendeu em 2006. Kaká assumiu o trono em 2007. Cristiano Ronaldo e Messi reinaram por 10 anos consecutivos de 2008 a 2017 e colocaram em xeque a necessidade de um time ter centroavante. Ambos são jogadores de lado, mas sabem perfeitamente atuar dentro da área no papel de falso 9. O meia Modric quebrou a dinastia em 2018, Messi recuperou o cetro em 2019 e, finalmente, um centroavante ostenta o posto de número 1 do planeta bola. Robert Lewandowski é a nova referência do esporte mais popular do mundo.
Lewandowski é moderno. Longe de ser aquele centroavante “paradão” dentro da área. Não é um cone, como a torcida brasileira batizou Fred na Copa de 2014 ao manifestar a revolta com as atuações do centroavante da Seleção no Mundial disputado aqui. O polonês sabe sair da área. É jogador de movimentação. Busca tabelas. Arranca com a bola dominada quando isso é possível. Quando necessário, põe a bola embaixo do braço e decide partidas.
Não é por acaso que as inspirações dele são dois reis da área. “Quando eu era um jovem jogador, lembro de ver Ronaldo e Romário jogando e eles foram grandes influências, grandes ídolos para mim. O Brasil sempre teve jogadores incríveis, e eles mostravam um futebol mágico. E eu, algumas vezes, jogava com a camisa 11 por causa do Romário, que eu vi inúmeras vezes em campo”, disse em entrevista ao evento organizado pela Fifa.
O craque do ano fez 55 gols em 47 jogos. Deu 10 assistências. Teve participação direta em 65 gols do Bayern de Munique na temporada. Registrou média de 1,38 por partida. Ajudou o clube a arrematar Champions League, Bundesliga, Copa da Alemanha, Supercopa da Alemanha, e Supercopa da Europa. Resumindo: teve ano de Messi e/ou Cristiano Ronaldo numa temporada em que o argentino e o português foram jogadores comuns.
Curiosamente, Messi e Cristiano Ronaldo voltam a ser superados por um craque do Leste Europeu. O croata Modric quebrou a dinastia dos dois em 2018. Para mim, o português deveria ter sido eleito naquele ano. Nesta temporada, Lewandowski coloca a Polônia do inesquecível Boniek — maior craque da história do país — em evidência. A nação arrasada na Segunda Guerra Mundial é também a terra do papa João Paulo II. Lewandowski é o personagem mais badalado do país desde que Karol Józef Wojtla morreu, em 2005, e tornou-se santo em 2014.
A religião chamada futebol tem um novo “papa” desde ontem, quando a fumaça branca saiu da chaminé da sede da Fifa, em Zurique. A nova referência dos fiéis ao esporte mais popular do mundo segue, agora, a liturgia de Lewandowski. A doutrina dele é marcar gols. A ordem dos centroavantes do futebol mundial agradece pela ressurreição da camisa 9.
52
Número de pontos de Lewandowski no colégio eleitoral formado por jornalistas, técnicos, capitães das seleções filiadas à Fifa e internautas, contra 38 de Cristiano Ronaldo e 35 de Messi. Neymar ficou em nono lugar.
“Quando eu era um jovem, lembro de ver Ronaldo e Romário jogando. Eles foram influências, ídolos pra mim. E eu, algumas vezes, jogava com a camisa 11 por causa do Romário”
Lewandowski, melhor do mundo
Os premiados
» Melhor jogador
Lewandowski (Polônia/Bayern de Munique)
» Melhor jogadora
Lucy Bronze (Inglaterra/Manchester City)
» Melhor goleiro
Manuel Neuer (Alemanha/Bayern de Munique)
» Onze ideal masculino
Alisson (Liverpool)
Arnold (Liverpool)
Alphonso Davies (Bayern Munique)
Sergio Ramos (Real Madrid)
van Dijk (Liverpool)
Thiago Alcántara (Bayern Munique)
De Bruyne (Manchester City)
Kimmich (Bayern Munique)
Cristiano Ronaldo (Juventus)
Lewandowski (Bayern Munique)
Messi (Barcelona)
» Melhor treinador
Jürgen Klopp (Alemanha/Liverpool)
» Melhor jogadora
Lucy Bronze (Inglaterra/Lyon)
» Melhor treinadora
Sarah Bouhaddi (França/Lyon)
Onze ideal feminino
Endler (PSG)
Millie Bright (Chelsea)
Lucy Bronze (Lyon)
Wendie Renard (Lyon)
Barbara Bonansea (Juventus)
Verónica Boquete (Utah)
Delphine Cascarino (Lyon)
Pernille Harder (Woflsburg)
Tobin Heath (Portland)
Vivianne Miedema (Arsenal)
Megan Rapinoe (Reign)
Melhor treinadora
Sarina Wiegman (Holanda)
Prêmio Puskás
Son Heung-Min (Coreia do Sul/Tottenham)
» Fair Play
Mattia Agnese (ITA/Ospedaletti). Aos 17 anos, ajudou a salvar a vida de uma adversária em uma partida.
» Melhor torcedor
Marivaldo Francisco da Silva. O pernambucano caminha 12 horas
para assistir ao jogos do Sport no estádio do clube, a Ilha do Retiro.