Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Do Jumento ao Parlamento sexta, 20 de janeiro de 2017

FILOSOFANDO

FILOSOFANDO

Raimundo Floriano 

 

         Vira e mexe, e eu fico a evocar a Seção de Habitação da Câmara dos Deputados.

 

         Com justificado orgulho e real motivo. Participei do seu nascedouro, sob a direção do eruditíssimo doutor Goiano Braga Horta, o cobrão, em outubro de 1972. Quando assumi sua chefia, éramos 5 funcionários. Ao deixá-la, em junho de 1980, por irresistível compulsão e sagaz manobra que a transformou em Coordenação, perfazíamos o total de 52.

 

         Pois bem, estávamos em outubro de 1979, e a ocasião se afigurava propícia aos trabalhos de impermeabilização dos tetos de todos os edifícios funcionais, duramente castigados no decorrer da última estação chuvosa, origem de constantes e pertinentes reclamações dos deputados quanto a ocorrência de infiltrações e vazamentos. Realizada a competente licitação, recebi a incumbência de elaborar um documento a ser assinado pelo 4º Secretário, comunicando aos ocupantes dos imóveis o início dos serviços. Ao redigi-lo, solicitei-lhes a benevolência da compreensão diante dos incômodos indesejáveis que a execução da obra fatalmente lhes acarretaria.

 

         Encaminhada a minuta à apreciação superior, esbarrei com o severo crivo do doutor Goiano, então Chefe do Gabinete da Diretoria Administrativa, que me devolveu o esboço, anotando em sua margem: “Incômodos indesejáveis? Não é uma redundância?”

 

         O Goiano é meu amigo. Prova disso é que, nos tempos das vacas magras, quando me vi em sérios apuros financeiros, ele foi meu avalista. Sempre tive a humildade de submeter à sua peneira as coisas que escrevo, e disso me vem uma grande recompensa, pois ele é sincero na apreciação e magnânimo no elogio. Se me manda cortar, eu corto. Se me ordena acrescentar, eu acrescento. Se desaprova tudo, papelada no lixo. É pessoa por quem nutro o máximo de respeito e admiração.

 

         Saí da Seção de Habitação em 1976, como consta da correspondência ao final deste relato, e retornei em 1980, mercê de indicação sua, para chefiá-la.

 

         Guardo dele um ensinamento:

 

         – Raimundo, faço questão de publicar tudo o que produzo. Ver seus textos impressos em jornais ou revistas é, para quem escreve, o melhor prêmio.

 

         E dele, também, relembro uma passagem engraçada.

 

         Um dia, ele me disse:

 

         – Sabe, Raimundo, eu agora estou tomando um medicamento que é tiro-e-queda para reavivar a memória!

 

         – Então, Goiano, quem está precisando dele sou eu. Ando muito esquecido. Parece até que, como acredita a sabedoria popular, mijei dentro d’água. Tudo o que aprendo num dia, esqueço no outro. Como é o nome desse remédio?

 

         – Espere um pouco!

Aí, ele pegou o telefone e ligou para alguém:

 

         – Amor, como é o nome daquele remédio que estou tomando para a memória?

 

         Depois de um breve diálogo, desligou e virou-se para mim:

 

         –Raimundo, o nome é Phytina, com ipsilone!

 

         – Goiano, no Maranhão, dizem que bom mesmo para a memória é pequi.

 

         – Como assim?

 

         – Falam por lá que quem come pequi, passa o dia todo se lembrando!

 

         Mas voltemos às impermeabilizações.

 

         Aquela observação buliu com as minhas incertezas. Fiquei a meditar sobre a sutileza do sofisma e, colocando em ordem minhas lucubrações, retornei o processo com a seguinte justificação, em folha de papel à parte:

 

         “Doutor Goiano,

A Língua Portuguesa é cheia de armadilhas e atropelos. Na análise sintática, por exemplo, é imprescindível o estudo acurado da conjunção, cuja extensa classificação deve ser memorizada, bem como de cor deve-se aprender todo o emaranhado e enfadonho elenco das normas que regem o assunto. Nas rodas eruditas, quando a mulher se encontra no período, é certo ouvir-se dizer:

 

– Está de regras!

 

Receber socialmente, é uma arte. Frequentar, uma ciência. O momento apropriado de se chegar a uma residência e a hora exata de se bater em retirada dão o toque de distinção num bom relacionamento. Caso contrário, o cacete, a maçada e a amolação geram tédio e desprazer naqueles que abrigam ou acolhem. Nos ambientes sofisticados, se uma colunável vivencia o embaraço, dela afirma-se com segurança:

 

– Está de visita!

 

As providências de que trata este processo têm por finalidade sanar os transtornos causados pela umidade e pelas goteiras, cujos malefícios nossos arquitetos e engenheiros abominam, sendo tal o desconforto que, nas empreiteiras, se declara apropriadamente a respeito da mulher à qual acontece a ocorrência:

 

– Está de pingadeira!

 

A maresia e o balanço do mar são fontes frequentes de enjoos e indisposições, que acometem os novatos na faina de navegar. No litoral, a marujada é vezeira em asseverar quanto à mulher a quem sucede o veículo:

 

– Está de paquete!

 

A fluidez do catamênio, além de salutar, denota que a mulher se encontra em gozo de perfeita higidez e pronta para o maravilhoso milagre da multiplicação. A ausência de menarquia, nos dias esperados, irrita, aborrece e contraria, chegando a lhe exigir até mesmo o uso de remédios para provocar o ciclo. E sobre ela asseguram os médicos, ao lhe advir a menorreia:

 

– Está de incômodo!

 

Porque, segundo o Aurélio, conjunção, período, regras, embaraço, visita, escorrência, pingadeira, veículo, paquete, catamênio, menarquia, ciclo, menorreia e incômodo são sinônimos de menstruação. E não é, pois, a menstruação um incômodo desejável?”

 

                        Diante desses argumentos, foi a minuta, sem restrições, aprovada pela Alta Administração da Casa e assinada em sua forma original.

 

                        Tendo sido os serviços prestados a contento.

 

 

Paquete Norueguês Leeward: Raimundo Floriano

em cruzeiro pelo Caribe

 

 

 

Goiano Braga Horta, inestimável amigo e mentor:

severo na apreciação e pródigo no elogio

 


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