*Bernardo Falcão
Centenas de fãs, amigos e parentes foram ao Cemitério de Congonhas, São Paulo, para se despedir do querido humorista Antônio Carlos Bernardes Gomes, conhecido no Brasil todo como Mussum, do quarteto Os Trapalhões. Após décadas proporcionando risadas com seu inesquecível personagem, o ator e músico morreu precocemente, aos 52 anos, no dia 29 de julho de 1994. "O Brasil perdeu um pouco de alegria", disse o colega Renato Aragão, o Didi. "Os Trapalhões estão ficando pequenininhos e mais tristes", lamentou Manfried Sant'Anna, o Dedé, referindo-se também à perda de Mauro Faccio Gonçalves, o Zacarias, quatro anos antes.
Quais são as suas melhores memórias com o seu pai?
Sem dúvidas, a forma que ele tratava as pessoas, a forma de ele conversar e ser uma pessoa tão querida por todos. As pessoas adoravam receber meu pai nos lugares e trocar uma ideia com ele, pedir opinião. Ele era um imã. Era impressionante, não conseguia ficar sozinho em lugar nenhum. Era ele chegar em algum lugar que alguém já puxava a cadeira, "Posso sentar aqui um pouquinho?". Era uma pessoa essencialmente do bem, uma pessoa de energia muito boa.
Como era o Mussum no âmbito familiar?
Ele era o Antônio Carlos, em alguns momentos ele era o Caco, o apelido dele dado por amigos mais chegados e familiares. Ele era de carne e osso como qualquer pai e qualquer marido. Então, cobrava muito os filhos em relaçao ao estudo e ao trabalho. Cobrava muita responsabilidade da gente. Ele era muito preocupado em dar para os filhos as oportunidades que ele nao pôde ter na vida. Era uma pessoa genial, um cara extremamente carinhoso, muito brincalhão, do bem. Mas, na hora da briga, também era um "sai de baixo". Cada um corria para um lado.
Como era a sua rotina em família, o que você lembra de fazer nas horas vagas com ele?
Meu pai era uma pessoa que viajava muito, trabalhava igual doido fazendo shows pelo país todo, viajando de carro, avião, ônibus, com o pessoal. Ele curtia muito Angra dos Reis, era a fuga dele para desestressar. Chegava em casa, pegava a gente e "vambora viajar pra Angra". A gente brincava que era o descanso do guerreiro, porque era o lugar em que ele realmente relaxava. Ficava de short e descalço, passeando de barco. Ele amava viajar.
O que você mais admirava no seu pai?
Ele era extremamente justo. Assumia tudo. Os acertos e os erros. Não gostava de injustiça, de ser passado para trás. Ele se declarava como uma pessoa tão aberta e disposta a conversa que não aceitava ser traído. Recebia muitas ligações de amigos e até mesmo em casa pedindo a opinião dele justamente por isso, por confiar nele, sabendo que ele falaria a verdade doa a quem doer. Era uma pessoa extremamente confiável. Sempre foi muito amigo de todos. Dificilmente a gente conseguia sentar no restaurante nós quatro, em família. Era questão de tempo até sentar um, sentar dois, e quando a gente via o jantar tinha se tornado uma reunião de 20 pessoas, todo mundo trocando ideia e conversando. Ele nunca ficava de bico, de cara fechada com essas situações. Sabia muito bem a posição dele, o que ele representava.
E quem era o Mussum na música? Na sua opinião, ele era mais músico que humorista ou mais humorista que músico?
Ele era um músico que se tornou humorista e acabou tendo talento para fazer as duas coisas muitíssimo bem. Mas, o humor estava mais no sangue dele, na minha opinião. É dificil dizer. Ele era muito estudioso da música também. Por exemplo, ele que trouxe um banjo da Rússia e apresentou pro Almir Guineto aprender a tocar. Então, ele fazia tão bem as duas coisas e era um cara tão sério e reponsável com aquilo que ele se propunha a fazer, que seria injusto eu falar que ele era mais músico do que humorista ou vice-versa. O documentário dele, inclusive, fala isso. As pessoas sabem que ele era um ótimo humorista, mas poucos conheceram o talento dele como músico. Ele era muito regrado e não aceitava erro. Se desse qualquer coisinha de errado em um show, eles já estavam no dia seguinte ensaiando.
Apesar de terem se passado 25 anos, Mussum ainda resiste no imaginário do brasileiro como uma figura positiva, alegre, etc. Por que você acha que isso se mantém depois de tanto tempo?
Ele era único. Eu estava há um tempo atrás treinando uma equipe para um quiosque da cervejaria no shopping Rio Sul que inaugura nesta segunda-feira (hoje). Um dos meninos que foram treinados para trabalhar lá tem 20 anos de idade e estava conversando comigo como se conhecesse o Mussum, batendo papo sobre o que ele sabia, sobre o que ele conhecia, etc. Óbvio que hoje a gente tem tudo na internet, e isso ajuda bastante, mas mostra como o Mussum era único, como ele era muito querido, sabe? O garoto nasceu cinco anos depois da morte do meu pai e mesmo assim o admira. Isso não tem preço.
O que Mussum diria se soubesse desse carinho das novas gerações por ele?
Era assim que meu pai gostaria de ser lembrado. Toda vez que eu converso com alguém e tocam no nome do Mussum é como se um sorriso já viesse à mente. Você sorri sem perceber e se lembra de alguma história engraçada ou de algum quadro dos "Trapalhões" que ficou marcado. Eu estou rodando o Brasil inteiro por causa do lançamento das cervejas, e é impressionante como sempre encontro alguém que conheceu, tirou foto ou bateu papo com ele. Em Belo Horizonte, um cara veio falar comigo: "Caramba, eu conheci seu pai em 1970 e poucos, e a gente ficou tomando cachaça num bar e conversando por horas". Sempre tem uma história dessas.
25 anos sem Mussum. O Brasil, de uma maneira geral, está mais careta?
Eu, pessoalmente, acho que as coisas estão um pouquinho exageradas. É preciso achar um meio termo. Eu acho que o Mussum não pensaria diferente. Todo exagero é ruim. Óbvio que todos nós sabemos desses novos tempos e de todos os aspectos importantes em que a sociedade mudou, mas acho que precisamos de um meio termo também. O mundo hoje está um pouquinho careta, sim, não há como negar. Mas é claro que se ele estivesse aqui com a gente ele se adequaria ao mercado. É isso. Você se adequa ao mercado ou muda de carreira. Não adianta ficar dando murro em ponta de faca. Mas sabemos também que se o Mussum estivesse vivo o mundo estaria bem melhor, ou pelo menos mais divertido.
De todas as cervejas — Biritis, Cacildis, Ditriguis e Forévis —, qual você acha que seu pai mais gostaria e por quê?
Eu acho que a Cacildis (Premium Lager) certamente seria a do dia a dia. Nos outros rótulos a gente não quis ir no chute, tentamos ir na pegada do que ele curtia. Óbvio que na época não existiam essas cervejas especiais que existem hoje, porém a Forévis (Session IPA) seria uma que ele curtiria bastante também e a Ditriguis (Witbier) ele estaria curioso para provar. A Biritis (Vienna Lager) é uma cerveja mais gourmetizada que, como bom cozinheiro, ele também se interessaria.
Daqui a 25 anos, como você espera que seu pai seja lembrado?
Espero que ele seja lembrado da mesma maneira que é visto hoje, com a ajuda da internet. É uma pessoa que só fez o bem, e é por isso que, mesmo após 25 anos, parece que ele se foi mês passado. A ideia da cervejaria também foi uma forma de eternizar o trabalho e a figura do Mussum. É uma forma de ter meu pai ao meu lado todos os dias, até porque eu respiro a marca e vivo em função dela.