EXALTAÇÃO
Júlio Dinis
Vida! quero viver! quero em prazeres
Sequioso saciar-me!
Deste frio letargo em que hei vivido,
Quero, enfim, libertar-me!
Pra longe o manto da indiferença! Aos gozos!
Eia! aos festins da vida!
Os mais convivas se sentaram há muito.
Dai-me a parte devida.
Pra longe pensamentos de tristeza,
Gelado desalento!
Vou embriagar-me nas ardentes taças
Beber nelas o alento.
Mundo, dá-me o prazer que aos mais concedes!
Da isolação estou farto. Adeus, ó solidão, adeus
repouso.
Adeus… pra sempre eu partoI
Os rumores da turba escuto ao longe
No seio dos folgares;
E só eu, frio, cruzarei os braços,
Não buscarei seus lares?
Oh! não; é tempo, as alegrias chamam-me.
Antes de exausta a taça
Corramos a bebe r nela, que o gozo
Co’a juventude passa. Amigos, esperai, eu já vos sigo.
Louco do que se isola?
Nem se torna melhor, nem suas penas
Na solidão consola.
Vamos ao menos no rumor das festas
Sufocar este grito
Que nos brada : — Padece, que de lágrimas
Foi teu destino escrito.
Vamos… ao menos no fulgor dos bailes
Fascinemos a vista.
Talvez aí se encontre o esquecimento,
Talvez o gozo exista. Quebremos esta lápide marmórea
Que nos cingia em vida. Ressuscitemos! Eia, ó alma acorda
Desta feral jazida.
Vamos!… às festas, ao prazer, aos cantos,
Às flores e harmonias.
Taças a trasbordar, luzes fulgentes,
Delirantes orgias!
E, então, no meio do delírio férvido,
Perdido, embriagado,
Talvez encontre a paz que em balde tenho
Na solidão buscado,
Abril de 1860
Esta exaltação, como quase todas, terminou em nada. Não cheguei a incomodar
os convivas dos festins da vida para me darem lugar, e espero que nunca os
incomodarei. Meu caminho é outro. Divirtam-se em paz