Sivuca (1930-Itabaiana-2006-João Pessoa)
DESCOBRIDOR DE SUSTENIDOS E BEMÓIS
Recém-chegado de Paris, ele tinha marcado encontro com Miriam Makeba para ensaiar umas ‘coisinhas’, no dizer dele. Parecia estar desconfortável com a grandeza de Nova Iorque, tão maior e cruel que o Rio de Janeiro, Recife ou até mesmo a sua Itabaiana. Na porta do hotel onde o encontrei, deixou-me a impressão de que gostaria mesmo é de estar em João Pessoa, junto ao seu povo. Na ponta daquelas ‘streets’ não havia qualquer sanfoneiro fazendo floreios para o povo dançar. O único fole que ali roncava era o seu. Mas disse-me estar feliz. Pedi para levar a sua sanfona, brincando que faria parte do meu curriculum aquele ‘carrego’. Ele riu consentindo que o fizesse. E levei seu instrumento pelas ruas largas daquela cidade cheia de gente e de indiferenças. Na porta do Teatro, perguntei se podia assistir ao ensaio. Ele sorriu novamente e nada disse. Entendi que sim e sentei-me na primeira fila. Deu-me vontade de dizer-lhe que o meu cavalo fala inglês e que já ensaiava um baião para as matinês. É como se ali estivessem o rei, o bedel e o juiz rindo todo o riso que há no mundo, de alegria e emoção por ver dedos mágicos descobrindo sustenidos e bemóis naquela sanfona preta. Ao sair dali, senti-me como tantos Joões e Marias chorando a saudade do ir embora. No outro dia voltei para o Recife, obrigando-me a ser feliz por aquele momento.
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