04 de julho de 2019 | 03h00
Há batalhas que merecem ser travadas não apenas pelo objeto da disputa, mas também pela reafirmação de valores caros a seus contendores. Foi imbuído deste espírito que O Estado de S. Paulo decidiu prosseguir com a ação cível movida contra o jornal pelo empresário Fernando Sarney mesmo quando o autor optou pela desistência de seu pleito censório, em 18 de dezembro de 2009. Este jornal desde sempre quis ver a causa julgada em seu mérito, pois, além de lutar pelo direito de informar, o Estado luta pela liberdade e pelo direito da sociedade de ser informada. O esforço e a firmeza de propósito foram recompensados.
Desde então, o que se viu foi uma longa e tortuosa batalha jurídica até que, em outubro do ano passado, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassasse a decisão liminar do TJDFT e remetesse o processo de volta à primeira instância do Distrito Federal para que o mérito da causa fosse julgado.
Na sentença, o juiz Atalá Correia escreveu que “não houve (por parte do jornal) divulgação de conversas estritamente particulares do autor, relacionadas à sua vida íntima e desconexas do interesse público”. Tudo o que este jornal publicou e pretendia publicar era, portanto, de interesse público. O juiz Correia afirmou ainda não ver no caso qualquer “situação excepcional” que ensejasse restrições à liberdade de informação.
A decisão da 12.ª Vara Cível de Brasília está em linha com o entendimento firmado pelo STF em 2009, segundo o qual “a plena liberdade de imprensa é categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura prévia”.
Quase uma década para que a liberdade de informação que a Constituição protege fosse reconhecida pelo Judiciário é tempo longo demais. Se algo bom pode ser tirado do episódio é o fato de a decisão chegar num momento em que a imprensa livre está sob ataque, no Brasil e em outros países. A decisão, neste sentido, é um bálsamo para os amantes da liberdade.
Não têm sido raras as investidas para calar veículos de imprensa, como esta de que oEstado foi vítima. Por mais ou menos tempo, a sociedade tem deixado de ser informada a contento sobre questões de seu interesse por força da ação de pessoas ou organizações que preferem a falsa segurança das sombras para fazer valer os seus interesses, em geral contrários aos da Nação. Aqui e ali, vicejam tentativas de impor censura e desqualificar órgãos de imprensa sempre que estes publicam aquilo que se quer manter escondido.
O Estado irá se insurgir, por meio dos instrumentos que as leis e a Constituição oferecem, contra toda e qualquer agressão à liberdade de imprensa. Assim tem sido há 144 anos, sem jamais vergar diante dos arroubos dos liberticidas.