DESCAMINHOS DAS ÍNDIAS – PARTE IX
(A Italiana em Anjuna)
Robson José Calixto
Foi-se a noite de dança com as lindas suecas. Finalmente o evento no Instituto Oceanográfico de Goa acabara, o grupo teria uma tarde livre. O especialista em poluição marinha combinou, então, com o Assistente do Programa GloBallast para o Brasil, Alexandre Leal, e a esposa dele almoçarem juntos e depois conhecerem a feira de Anjuna (pronuncia-se Anjuná), que ficava a uma pequena distância ao norte do hotel Cidade de Goa.
Escolheram um restaurante que parecia mais uma casa, perto da rua Dona Paula (isso mesmo, lembre-se que Goa foi colonizada por portugueses). Pediram um peixe, mas como outras comidas na Índia o sabor nem sempre é o esperado pelos ocidentais, assim não comeram muito dele, preferindo mais a salada e o arroz.
Seguiram então para Anjuna. Passaram na rua por uns elefantes grandes guiados por seus adestradores e chegaram à feira que era bem perto da praia. Observaram logo mulheres levando cestas sobre as cabeças vendendo frutas. Algumas crianças brincavam na água do Oceano Índico e alguns adultos adentravam na água com as próprias roupas, vestidas até o pescoço.
Foto: Robson José Calixto.
Foto: Robson José Calixto.
O lugar era uma mistura de feira e circo, com equilibristas, vendedores de incenso, frutas, especiarias, tecidos – uns mais bonitos e mais coloridos que os outros e a preços bem razoáveis. O especialista comprou alguns desses tecidos, sendo que virou um vestido de grávida que serviria na gestação dos seus dois filhos, mantendo a sua qualidade e viço.
Foto: Robson José Calixto.
As mulheres hindus chamavam muito a atenção tanto quanto o aroma do cardomomo e o curry no ar. Seus sáris, seus diversos piercings e elementos de adereços (cordões, pulseiras, brincos) distribuídos por narizes, orelhas, pulsos, pescoços e pés. Algumas com lenços nas cabeças se assemelhando a ciganas, com suas vestes, seus ouros e elegância.
Na feira tudo era estranho, ao mesmo tempo que fascinante, trazendo sensações de tempos antigos, de algo que se reproduz desde Alexandre o Grande, que se espalha da Ásia para a África, é levada à Europa e chega à América.
Foto: Robson José Calixto.
A esposa de Alexandre resolveu olhar de perto os encantadores de serpentes, sentados no chão em cima de tecido de algodão rústico, tocando suas flautas e serpentes saindo de pequenos cestos. Parecia que se estava em um filme antigo, talvez “Gunga Din”, “Ghandi”, “Passagem para a Índia” ou algo assim. Os hindus ofereciam as serpentes para serem acariciadas a pequenas colaborações em dinheiro.
Os três andavam pela feira, em sua rua principal, de chão batido, quando de repente ouviram uma fala com sotaque italiano e olharam naquela direção, sentindo um impacto. Era uma mulher italiana, branca, de rosto avermelhado pelo sol, de cabelos pretos, linda e de biquíni vermelho, de duas peças. Isso mesmo, em plena comunidade que se distingue, em regra, pela timidez e respeito nas relações sociais entre homem e mulher, que é muito pudica no vestir, mas que coletivamente cometiam estupros, movia-se uma mulher quase desnuda, de vestimentas mínimas e seios fartos que se pronunciavam.
Os hindus, homens e mulheres, paravam o olhar e o desviavam. Se comportavam como diferentes, todavia não olhavam mais como a italiana não existisse, não estivesse lá.
Verificou-se depois que a italiana estava acompanhada de outro italiano que tirava fotos. O casal e o especialista olharam a cena mais uma vez e partiram de volta ao hotel Cidade de Goa. O especialista levava em sua cabeça questionamentos: “- que louca! Sem noção! Não tinha medo, ou respeito!?”
Chegando ao hotel os três se despediram. O casal faria um trajeto pela Índia, passando pelo Taj Mahal e o rio Ganges, e seguindo para o Nepal. O especialista alertou-os que lera no livro sobre a Índia, que comprara em Mumbai, aviso de que se tomasse cuidado com a comida ou sanduiches servidos no Taj Mahal, pois poderiam estar contaminados. O livro falava de que turistas dinamarqueses haviam comido uns sanduiches por lá, passaram mal e morreram. O casal não daria atenção ao alerta do especialista.
Fim da Parte IX. (02 de abril de 2017)
Nota: Este não é um texto de ficção, mas baseado inteiramente em fatos reais, para uma realidade de janeiro de 2002.