Meu amigo detesta álcool, qualquer que seja a sua natureza: cerveja, whisky, cachaça. Nada. Conhaque, nem pensar. Mas, cavalheiresco que é, tolera os amigos que têm o paladar tolerante para as bebidas e com eles se senta às mesas, apenas para petiscar e jogar conversa para fora e para dentro … No seu caso, meio gole de champanhe a cada réveillon é o máximo a que se permite, porre maior com que se deleita. Ou seja, a cada dois anos, um gole completo de champanhe. Hoje, aos 60 anos e imaginando que seu ritual alcoólico teve início à flor de seus vinte anos, ou seja, há quarenta anos, chega-se à fácil conclusão que o meu amigo, ao longo de sua trajetória ‘boêmia’, ingeriu até agora 40 meio goles do precioso líquido francês, o equivalente a 20 goles de champanhe. Ou, feita a devida equivalência corretiva, um terço de uma garrafa do precioso líquido de origem francesa. Menos por curiosidade e mais por falta de algo melhor a fazer, usei goles d’agua para encher uma garrafa de champanhe secada no meu último réveillon e fiz a experiência que me indicou a necessidade de 120 meio-goles para enchê-la totalmente. Assim, uma garrafa integralmente cheia, tomada aos meio goles anuais, consumirá 60 goles líquidos, ou, na medida dele, 120 meio goles. Se a cada 2 anos ele bebe 1 gole e, desde que começou, já bebeu 20 goles, resta-lhe beber 40 goles para realizar a proeza de secar a garrafa, o que demandará exatos 80 anos, mantida a medida do meio gole anual. Assim, somente no réveillon de 2097 poderemos comemorar a festiva data. Até lá vou bebendo minha cervejinha diária para que, aos 147 anos, eu e ele, lúcidos, bengala a nos amparar, possamos comemorar a data, com mais um meio gole da bebida francesa. Levarei de presente uma garrafa de Krug Clos d’Ambonnay, feito com as melhores uvas Pinor Noir para o início de novo ciclo que se findará em 2157. De minha parte, após a festa, entornarei uma boa caneca de chopp e torcerei para que, na volta para casa, não me depare com os fiscais da Lei Seca.