Foi a pequena Cachoeira do Arari, cidade de pouco mais de 20 mil habitantes na Ilha do Marajó, no Pará, que deu ao mundo a diva do carimbó chamegado, alcunha pela qual ficou conhecida Dona Onete. Nesta quarta-feira (22), a cantora de 83 anos — que ganhou projeção nacional somente a partir dos 72 — recebe da União Brasileira de Compositores (UBC) o Troféu Tradições, concedido pela instituição a artistas e movimentos que “contribuíram para a formação da cultura brasileira”. A premiação em grande estilo acontece no Theatro da Paz, em Belém, num show que celebra a obra da artista com participações de Fafá de Belém, Jaloo, Mestre Damasceno, Lucas Estrela, Félix Robatto e Aqno Carimbó Sancari. A apresentação será transmitida ao vivo pelo canal da UBC no YouTube (/UBCMusica), a partir das 20h30.
— Em 2022, celebramos 80 anos de UBC. Essa trajetória será comemorada de forma singular e plural com o Troféu Tradições, em homenagem a Dona Onete, artista paraense talentosa e corajosa, que é uma das principais representantes do carimbó — diz Marcelo Castello Branco, diretor executivo da UBC. — Será a primeira vez que ela se apresentará no tradicional Theatro do Paz, e nós da UBC ficamos felizes em ajudá-la a realizar esse sonho.
Palco com história
Dona Onete diz que faltava mesmo cantar no Theatro da Paz, um dos primeiros palcos líricos do Brasil, inaugurado em 1878 e batizado em homenagem ao fim da Guerra do Paraguai, oito anos antes. A cantora, que foi professora de História por 25 anos, diz que já atravessou o mundo graças à música e que “o que vier agora é lucro”, mas conta estar ansiosa para botar os pés no palco centenário.
Segundo dados da UBC, Dona Onete tem mais de 300 canções registradas em seu nome, incluindo boleros, carimbós, banguês e lundus, entre outros gêneros. Desde 2012, quando chegou às lojas seu primeiro disco, “Feitiço caboclo”, lançou outros três — “Banzeiro” (2016), “Flor da lua” (2018) e “Rebujo” (2019) —, além de diversos singles e participações com outros artistas, como Gaby Amarantos, Francisco El Hombre, Bangalafumenga e BNegão. A fonte de inspiração vem de histórias que ouve por aí, principalmente as de amor.
— O romantismo nunca acaba. Surge isso, aquilo, mas o romantismo continua. E as pessoas continuam gostando do romântico, do carimbó, do brega. Conto histórias que me contam e que eu vejo que vale a pena fazer uma música. Meus boleros, meu carimbó, minha lambada têm princípio e fim, não gosto de deixar nada subentendido. As pessoas entendem o que eu quero dizer. Às vezes me contam um pedacinho de uma história e minha imaginação flutua, já com ritmo, com tudo — diz a artista, dona do hit “Jamburana”, dos versos “A boca fica muito louca/ com o tremor do jambu/ E o jambu treme, treme, treme/ o tremor vai descendo, vai descendo”. — Eu não entendo nada de teoria musical, não sei qual é a nota dó, ré, mi, nada disso. Mas chego com a música prontinha para os meus músicos, digo se é lambada, bolero, e eles vão definindo, é um processo de que gosto muito.
Disco novo no forno
A cantora paraense Dona Onete — Foto: Divulgação/Walda Marques
Para a noite desta quarta (22), Dona Onete promete um passeio pelo repertório de uma carreira relativamente breve, mas com muita história agregada, e comemora a presença dos convidados (“Fafá já me deu muito colo e agora estou dando colo para ela”).
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Sem tempo a perder, ela adianta que já trabalha em um novo disco de inéditas, no qual pretende cantar sobre as belezas de sua terra natal, a Ilha de Marajó.
— Tem gente que com 83 anos já pensa que está acabada, mas não. Se cuidar da saúde, vamos longe. Eu espero fazer muita coisa ainda, e espero também ajudar outras pessoas a subirem como me ajudaram um dia. Tenho uma banda maravilhosa e estou fazendo cada vez mais músicas. Não estou envolvida com internet, televisão, essas coisas, quero estar sempre neste mundo, recuada, bebendo dessa fonte que é a cultura paraense. Quero falar do meu Marajó, o lugar que eu nasci, que é uma enciclopédia de cultura — comemora Dona Onete.