Por fora, será difícil notar qualquer diferença no Copacabana Palace nas próximas semanas. As bandeiras estarão hasteadas como sempre, e a fachada continuará sendo iluminada todas as noites. Mas, a partir de amanhã, pela primeira vez em seus quase 97 anos de história, o ícone carioca estará fechado, assim como outros 60 hotéis da cidade, impactados pela pandemia do novo coronavírus. A reabertura está prevista para o final de maio.
Os últimos hóspedes deixaram o Copacabana Palace na segunda-feira. Só continuarão no hotel dois moradores, Andrea Natal, diretora geral do Grupo Belmond do Brasil, que administra o estabelecimento, e o cantor e compositor Jorge Ben Jor, que desde 2018 vive lá.
Antes do check-out derradeiro, um alerta vermelho já havia sido aceso. Em meados de março, uma sequência de cancelamentos de grandes grupos chamou a atenção de Andrea. Ela percebeu que a onda que já fazia estragos em outras partes do mundo estouraria na Avenida Atlântica.
— Nossa previsão de ocupação para março era de 70%, e fechamos o mês com 36% — conta a diretora. — Até começamos bem, mas a partir de meados do mês, quando o turismo global começou a ser mais afetado, com muitos cancelamentos de voos, a queda foi abrupta. Isso justamente num ano que começou promissor. Tivemos um carnaval inesquecível, nosso baile foi talvez o melhor dos últimos tempos. Parecia que vivíamos uma era de ouro.
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A trajetória do Copacabana Palace não o livrou de se somar às estatísticas da crise causada pela Covid-19. Na última segunda-feira, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), pelo menos 60 hotéis tinham interrompido suas atividades na cidade do Rio, inclusive o Fasano, outro hotel de luxo à beira-mar.
Os primeiros funcionários, com mais de 60 anos, foram afastados em março
Ainda no mês passado, o quadro de 515 funcionários do Copa começou a ser reduzido. Os primeiros a serem mandados para casa foram 11 empregados com mais de 60 anos de idade. Entre eles, o famoso capitão-porteiro Jorge Freitas, o Cafu, com mais de 45 anos de serviços prestados ao hotel. Em seguida, 275 contratados entraram de férias ao mesmo tempo, em 1º de abril. Já os profissionais das áreas administrativas começaram a trabalhar em home office. Andrea garante que o objetivo é não demitir ninguém durante o período.
— Atualmente, temos entre 60 e 70 funcionários trabalhando dentro do hotel, em serviços essenciais, como manutenção e segurança. Esse número deve diminuir ao longo das semanas — explica.
Para garantir a segurança sanitária no hotel, a direção contratou uma auxiliar de enfermagem que monitora a saúde dos funcionários, com direito a medição diária de temperatura. A qualquer sintoma de gripe, a pessoa deve voltar para casa. Na entrada de serviço, os funcionários devem trocar seus sapatos por outros, já higienizados, e periodicamente o hotel receberá aplicações do mesmo desinfetante usado em hospitais.
Balanço do acervo
Fechar as portas não significa parar tudo dentro do hotel. Uma manutenção mínima será feita. Um grupo de camareiras, por exemplo, será responsável por todos os dias limpar os 293 quartos, abrindo portas e janelas pela manhã, e as fechando à noite. Toda a roupa de cama será guardada, assim como talheres, computadores, telefones, aparelhos eletrônicos, peças de mármore, louças... Tudo será catalogado durante a paralisação.
— É como quando fazemos uma mudança de casa, temos que tirar tudo do lugar para guardar em caixas, e acabamos descobrindo um monte de coisas de que não precisamos. Será uma grande oportunidade também de fazer um amplo balanço das coisas do Copa, que nunca poderíamos fazer em outros momentos — afirma a executiva.
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Também estará em funcionamento uma das cinco cozinhas do hotel, que tem dois restaurantes com estrelas Michelin, para alimentar os empregados que continuarão dando expediente in loco e os dois moradores do hotel.
Surpresas na reabertura
Andrea continuará ocupando um apartamento dentro do Copa. Mas sem qualquer glamour envolvido, garante.
— Quem pensa em mordomia está completamente enganado. Até mandei instalar uma máquina de lavar caseira no meu apartamento, já que a lavanderia do hotel estará fechada também — ela diz. — É uma situação bem triste, na verdade, imaginar aquele espaço vazio, sem a vida dos dias normais.
A normalidade, aliás, é um conceito que deve demorar a voltar, na visão da executiva, há mais de 20 anos no hotel de luxo mais conhecido do país:
— Venho monitorando o cenário internacional, sobretudo o da China, que parece já estar na fase final da epidemia. Lá, os hotéis estão voltando a funcionar com ocupação em torno de 20% a 30%. Então imagino que essa será a nossa situação, no melhor dos casos, no meio do ano. Só devemos chegar aos 40% no último trimestre , quando o hotel normalmente está quase lotado.
Ela também vê o período como início de uma profunda transformação no setor turístico como um todo. E espera usar a parada para preparar o quase centenário Copa para o que vem pela frente:
— A ideia não é reabrir as portas com o hotel exatamente como era. Podem esperar surpresas.