CLEMENTINA DE JESUS
Raimundo Floriano
Clementina de Jesus
Clementina de Jesus da Silva, cantora, nasceu em Valença (RJ), no dia 7.2.1901, e faleceu no Rio de Janeiro (RJ), no dia 19.7.1987, com 86 anos de idade.
Filha de um violeiro e de uma capoeirista, desde criança ouvia os cantos de trabalho, jongos, benditos, ladainhas e partidos altos cantados pela mãe.
Mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, passando a adolescência no Bairro de Osvaldo Cruz. Aos 12 anos, desfilava no Bloco Moreninhas das Campinas. Três anos depois, já cantava no Coro de uma das muitas igrejas de seu bairro. Por essa época, participava das rodas de samba na casa de Dona Maria Nenê. Mais tarde, passou a frequentar o Grêmio Recreativo e Escola de Samba Portela
Em 1940, casou-se com Albino Pé Grande e foi morar no morro da Mangueira. Durante 20 anos, trabalhou como empregada doméstica, cantando só para os amigos, sendo descoberta, aos 63, por Hermínio Bello de Carvalho.
Sua primeira aparição como cantora profissional se deu em 1964, quando, a convite de Hermínio, participou do show O Menestrel, com Turíbio Santos. Em 1965, integrou o Musical Rosa de Ouro, apresentado no Teatro Jovem do Rio de Janeiro e dirigido por Hermínio Bello de Carvalho e Kleber Santos, ao lado da veterana Aracy Cortes e do Conjunto Rosa de Ouro, que tinha como integrantes, entre outros, Paulinho da Viola, Elton Medeiros e Nelson Sargento. Dele, forram editados dois LPs, o Rosa de Ouro 1, em 1965, e Rosa de Ouro 2, em 1967.
O show seguiu em turnê pela Bahia e teatros São Paulo. Em 1966, Clementina viajou para Dacar e Senegal, representando o Brasil no Festival de Arte Negra, acompanhada de Elizeth Cardoso, Elton Medeiros e Paulinho da Viola. É também de 1966 seu primeiro disco solo, Clementina de Jesus, pela Odeon.
Nessa época, participou de Concertos na Aldeia de Arcozelo e, em dueto com Helcio Milito, apresentou, na Sala Cecília Meirelles, do Rio de Janeiro, a Missa de São Benedito, de autoria de José Maria Neves. Em 1967, prestou seu histórico depoimento para o MIS - Museu da Imagem e do Som, no qual foi entrevistada por Hermínio Bello de Carvalho e Ricardo Cravo Albin.
Em 1968, com João da Baiana e Pixinguinha, gravou o disco Gente da Antiga, lançado pela Odeon. Nesse mesmo ano, ao lado de Nora Ney e Cyro Monteiro, lançou o LP Mudando de Conversa, gravação do show homônimo, realizado no Teatro Santa Rosa, no Rio de Janeiro, com roteiro e direção de Hermínio Bello de Carvalho.
Ainda em 1968, lançou o LP Fala Mangueira, com Carlos Cachaça, Cartola, Nélson Cavaquinho e Odette Amaral. No ano de 1970, gravou seu segundo disco solo, Clementina Cadê Você, lançado pelo MIS, no ano de 1973, e, cinco meses depois de sofrer uma trombose que, conforme parecia, ameaçava encerrar sua carreira artística, lançou, pela Odeon, o LP Marinheiro Só, produção de Caetano Veloso.
Ainda em 1973, fez uma participação especial no LP Milagre dos Peixes, de Milton Nascimento, na faixa Escravo de Jô, de Milton e Fernando Brant. No ano de 1976, lançou o LP Clementina de Jesus - Convida Carlos Cachaça. Em 1977, participou, como convidada, de Clara Nunes, do LP As Forças da Natureza. Em 1979, gravou seu derradeiro disco, Clementina e Convidados, pela Emi-Odeon.
No ano de 1982, a Escola de Samba Lins Imperial se apresentou com enredo em sua homenagem: Clementina - Uma Rainha Negra. Em 1983, recebeu, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, grande homenagem. Ainda em 1983, participou do LP O Canto dos Escravos, com Doca e Geraldo Filme, interpretando cânticos dos escravos de Minas Gerais, lançado pela gravadora Eldorado.
Em 1985, recebeu do Governo Francês, através do Ministro da Cultura Jack Lang, a Comenda da Ordem das Artes e Letras, com a presença de Jorge Amado, Caetano Veloso e Milton Nascimento.
Seu último show foi no mês de maio no Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro, no ano de 1987, vindo a falecer em julho desse mesmo ano.
Em 2000, às vésperas da comemoração de seu Centenário, foi produzida, por Hermínio Bello de Carvalho e João Carlos Carino, uma caixa com nove CDs, reunindo quase toda sua obra gravada em LPs na Odeon, com exceção do disco produzido no MIS.
Também a gravadora EMI prestigiou-a com dois CDs, na Série Raízes do Samba, um com partes do show Rosas de Ouro, e outro individual, com grandes sucessos de sua carreira.
Clementina de Jesus ficou conhecida como a Rainha Ginga ou Rainha Quelé. A primeira homenagem, devido a sua importância e grandeza na música popular, divulgando as raízes africanas, e, a segunda, pela corruptela carinhosa de seu nome.
Todos os discos acima citados são facilmente encontráveis no mercado virtual especializado.
Sua discografia é extensa. Mencionarei aqui alguns de suas criações que ficaram para sempre em minha cabeça de amante da MPB e trombonista de carnaval: Nasceste de Uma Semente, de José Ramos; Saudosa Mangueira, de Herivelto Martins; Sei Lá, Mangueira, de Pulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho; Sabiá de Mangueira, de Frazão e Benedito Lacerda; Vai, Saudade, de Candeia e David da Portela; A Coruja Comeu Meu Curió, tradidional; A Mangueira Lá no Céu, de Maurício Tapajós e Hermínio Bello de Carvalho; Pergunte ao João, de Helena Silva e Milton Costa; Marinheiro Só, de Caetano Veloso; Tantas Você Fez, de Candeia; Olhos de Azeviche, de Jaguarão; Na Hora da Sede, de Braguinha e Luís Américo; Torresmo à Milanesa, de Adoniran Barbosa e Carlinhos Vergueiro; e Sonho Meu, de Dona Ivone Lara e Délcio Carvalho.
Rainha Quelé
Dentro de meu agrado, escolhi estes cinco sambas como pequena amostra do trabalho desse grande ícone da Música Popular Brasileira:
Vai, Saudade, de Candeia e David da Portela:
Pergunte ao João, de Helena Silva e Milton Costa:
Marinheiro Só, de Caetano Veloso:
Sei Lá, Mangueira, de Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho:
Torresmo à Milanesa, de Adoniran Barbosa e Carlinhos Vergueiro, com participação de Adoniran:
E, a pedido do leitor Flávio Feronato, Incompatibilidade de Gênios, de João Bosco e Aldir Blanco.