Pedro Ibarra
Alguns dos maiores nomes do jazz brasileiro se reúnem no centro de Brasília para o Cerrado Jazz Festival. Entre artistas do calibre de Ivan Lins, Metá Metá, Candice Ivory & The Simi Brothers, Joyce Moreno e Ellen Oléria, dois pernambucanos sobressaem por trazer um tempero mineiro para o quadradinho. Amaro Freitas e Zé Manoel reinterpretam o Clube da Esquina com banda no evento realizado, amanhã e sábado, no Museu da República.
Essa é a segunda vez dos dois músicos em Brasília com este projeto. Nesta oportunidade, a dupla será acompanhada por uma banda que trará traços de grandiosidade ao show intimista. Eles são a atração mais esperada de amanhã e sobem ao palco às 23h. Ao Correio, os dois falaram sobre a relação com Brasília, Clube da Esquina e das expectativas para o festival.
Entrevista // Amaro Freitas e Zé Manoel
Essa é a segunda passagem de vocês com esse projeto em Brasília. Após duas apresentações esgotadas em março, como vocês percebem essa recepção e o abraço da capital?
Zé Manoel: As minhas passagens por Brasília sempre foram especiais. Essa última vez com Amaro e show do Clube da Esquina veio para firmar como a cidade consome cultura e há um interesse muito grande pela música. Para a gente que vive de fazer música, ter contato com esse público é muito especial. Eu tenho uma relação única com Brasília, tenho amigos e pessoas que amo na cidade. Não é só trabalho também é afeto. Estou ansioso para voltar, depois de dois shows esgotados, ter minha primeira experiência dentro de um festival em Brasília.
Amaro Freitas: Vão ser experiências muito diferentes. A primeira vez foi em um teatro, um show intimista só com nós dois. Nesse formato para festival, nós temos uma banda. A gente está levando algo novo, o que é bom para quem nunca viu e também quem já viu esse show. Para nós, também será diferente porque será a primeira vez que apresentamos o projeto ao ar livre
Zé Manoel: Tem uma coisa importante que é o fato de ser um festival de jazz. O público do gênero é acostumado e interessado em ouvir, tem o hábito da escuta mais até do que o público de canções. A gente sabe que em eventos as pessoas naturalmente vão para dançar, encontrar-se com outras pessoas e por diversão. Há uma expectativa grande, mas acho que a recepção será positiva.
O Clube da Esquina já ultrapassa os 50 anos e já foi reimaginado de diversas formas. O que há de único neste show?
Amaro Freitas: A gente colocou a nossa alma neste show. Sabemos que o Clube da Esquina é um disco muito revisitado e que existe uma memória afetiva muito forte dos brasileiros com o álbum. O que a gente tentou fazer foi manter uma originalidade no quesito não tirar a essência da música, mas trazendo nossa identidade. O lugar que conseguimos deixar isso fascina o público, os deixa feliz. Quem assiste vem com uma reposta de que já ouviu o álbum em várias versões e que essa emocionou mais, que a gente fez jus ao que o próprio Clube da Esquina fez. É muito bonito e impactante poder receber um feedback dessa forma. Eu me sinto muito honrado em fazer esse projeto e de perceber que ele tem emocionado e de que o espectador tem aprovado a forma que temos conduzido.
Zé Manoel: Pelas trocas com o público de vários lugares do Brasil, o que dá para perceber é que quem acompanha o Clube da Esquina muito em ouvir aqueles clássicos e canções que marcaram a vida das pessoas em uma outra roupagem. Dois homens negros, nordestinos reinterpretando uma obra icônica mineira, isso leva para um outro lugar. Impacta quem conhece a obra, mesmo quem não conhece a gente pega essa visão diferente. O Clube da Esquina possibilita uma conexão única com as pessoas. Gente que não me conhecia ou não conhecia o Amaro chegou ao nosso trabalho autoral após se apaixonar por meio dessas canções. É uma sina desse projeto de abrir possibilidades e portas inesgotáveis para universos maravilhosos e incríveis.
Amaro Freitas: Esse trabalho presta uma homenagem ao Clube da Esquina e fala sobra diversidade cultural brasileira. Quando a gente pensa no Clube vem os mineiros, que trazem uma particularidade brasileira. Quando a gente pensa em mim e no Zé Manoel, dois pianistas pretos nordestinos e pernambucanos de pontas distintas do mesmo estado juntos em um piano, é incomum ao Brasil. Ocupamos esse palco para tocar músicas que fazem parte da identidade brasileira. A gente tem a ousadia e a honra de mexer com isso, colocar todo nosso sentimento, nossa alma e amor nesta obra sagrada para recriar essa diversidade cultural e geográfica do nosso Brasil.
Zé Manoel: O Clube da Esquina é um cancioneiro que dá infinitas possibilidades de releituras. Para mim, foi interessante, não só como intérprete do projeto, mas por estar acompanhando o processo de rearranjo de Amaro para essas canções. Tem algo muito único na forma como Amaro trouxe esse repertório para o universo dele, ao mesmo tempo em que eu também tive o desafio de trazer essas canções super amadas, assimiladas e com gravações definitivas de uma constelação de grandes astros para o meu universo sem querer em momento algum ocupar um lugar ao lado do Milton Nascimento, por exemplo. Ele é um cantor que não existe outro nem nada parecido no mundo, alguém que tenha a obra, a força e a grandeza dele.