Anos atrás, numa cidade do interior nordestino, Margarida, empregada doméstica na casa de Dona Zélia, apareceu grávida. A patroa, solteirona juramentada e muito católica, ao ver a moça enjoada e com o ventre ligeiramente crescido, perguntou e obteve a confissão da gravidez. O autor da faceta era o namorado Josimar, conhecido por Castanhinha.
Dona Zélia se sentia responsável pela empregada, que tinha apenas 17 anos. Sempre que a moça dizia que ia passear com uma amiga, ela fazia a mesma recomendação:
– Cuidado com a vida e volte cedo.
A mulher tinha o hábito de dar conselhos às suas empregadas, principalmente quando eram menores de idade e, supostamente, virgens.
Surpresa com a gravidez da moça, a primeira providência de Dona Zélia foi pedir ao seu irmão Damião, dono da gráfica onde o conquistador trabalhava, que falasse com ele e o “intimasse” a se casar com Margarida. Seu Damião, muito espirituoso, respondeu:
– Eu não sou Delegado de Polícia, pra fazer essa intimação ao rapaz. Eu não vou me meter nessa história. Se a moça deixou o namorado fazer “feiura” com ela e ficou calada, é porque gostou. Agora que está gravida, foi que abriu o bico pra dedurar o rapaz. Como não existe nenhum inocente nesse caso, eles que se entendam. Eu prometo ser padrinho do menino ou menina, quando nascer.
Dona Zélia se voltou contra o irmão e o tachou de desalmado. Disse-lhe que a empregada era muito nova e não tinha sabido se defender. Além do mais, sempre se ouviu dizer que “a carne é fraca…”
Não adiantou. Seu Damião continuou dizendo que não iria se meter nessa história. E a confusão virou por cima dele.
Os pais de Margarida moravam na zona rural. Por coincidência, no dia seguinte a essa descoberta, o pai, Seu Pedro, que tinha o apelido de “Pisa na Fulô”, foi à cidade comprar novos instrumentos agrícolas, para usar no roçado. Antes, foi ver a filha Margarida, ignorando o que estava se passando com ela. É claro que a moça não teve coragem de dizer que o namorado a tinha seduzido e que estava grávida.
Depois de tomar o café da manhã com a filha, na casa de sua patroa, Pisa na Fulô a abençoou e se dirigiu à Rua Grande, para comprar uma foice e uma enxada no armazém de Seu João Bento. Antes de voltar para casa, resolveu ir cumprimentar Seu Damião, na gráfica, levando consigo esses instrumentos agrícolas, também considerados armas brancas. Como consta nos anais da história da criminologia brasileira, entre outros objetos de trabalho, esses dois já foram usados em muitos crimes de morte.
Seu Damião, quando viu o pai de Margarida chegar, “armado” de enxada e foice, resolveu fazer um susto a Castanhinha. Chamou o rapaz e lhe cochichou que Pisa na Fulô era o pai de Margarida e era muito violento. Estava ali para tomar satisfação, pois soubera que ele havia mexido com sua filha e ela estava grávida. Se ele não casasse logo com ela, podia se considerar um homem morto.
Castanhinha, pálido e tremendo dos pés à cabeça, apresentou-se diante de Pisa na Fulô e lhe pediu a mão de Margarida em casamento. O agricultor, inocente na história, vendo que o rapaz trabalhava com Seu Damião, concordou na hora. Só podia ser um rapaz direito…
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