Cássia Kis experimenta um momento de reencontro com sua intuição. Viver com a transcendentalidade à flor da pele é efeito de um mergulho interior a que a atriz de "Desalma" se entrega nos últimos meses. O sobrenatural está presente não só na ficção, mas em situações corriqueiras.
— Esse seriado está podendo tratar de algo importante que resgatei e que treinava muito aos 20 anos: ser intuitiva. Estou dando corda, fomentando essa minha sensibilidade. Eu sinto uma coisa ali e falo: "Opa". E se acho que devo recuar, eu recuo simplesmente — exemplifica a atriz, que na obra interpreta Haia, uma figura mística: — Eu não sou uma bruxa, mas talvez viva como tal: reclusa. E tenho uma história difícil... A personagem é uma mulher sozinha, que julgam. Fazem críticas sem saber muita coisa. Mas ela tem dramas com a filha. Lá em Brígida, que é a cidade fictícia da obra, havia uma festa milenar há 30 anos. Um dos mistérios está em saber se uma antiga tragédia voltará a acontecer.
A atriz, que está na expectativa para gravar a segunda temporada da série, aguarda também uma definição sobre "Pantanal". A atriz viveu Maria Marruá na versão original da trama e diz que está conversando com a equipe do remake sobre um papel:
— Fiz essa novela emblemática no início dos anos 1990. Agora é um reinício de um novo jeito de fazer. O público pediu aquilo e veio. Foi lindo o que eu fiz. Agora quero nem que seja abrir uma porta. Se me convidaren para eu fazer uma passagem ali no fundo, no primeiro episódio, eu vou me sentir muito satisfeita. E agora provavelmente deve surgir uma velhinha (risos). Eu acho que sim (que fará a obra). Fico feliz de, aos 63 anos, com essa quantidade de rugas, ter muita vontade de mostrar um trabalho cada vez melhor, de estar ao lado de gente que faz tão bem.
Com alegrias no trabalho, Cássia infelizmente viveu duras experiências recentes. Há menos de dois meses, sofreu com a morte da mãe, Dona Piedade Monteiro.
— Ela partiu no fim de agosto, em plena pandemia. Não morreu de Covid, mas foi colocada dentro de um saco como todos; foi-se sem eu vê-la, sem eu me despedir. Enfiaram o corpo dentro de um caixão e não conseguimos nem colocar uma roupa, não a vimos no pós-morte. Sei que foi um até logo. Pedi muito para que minha mãe fosse bem recepcionada, bem cuidada, que os espíritos a conduzissem para um bom lugar. É tão forte. Sinto saudade, queria ter segurado a sua mão. Passei meses dizendo à minha irmã: "Dinha, estou me organizando para ir aí. Quero ficar segurando a mão da mamãe. Eu queria só estar perto segurando a mão dela". Mas minha família me disse que, dias antes, ela estava cantando muito, estava divertida. Ela estava em paz. Estavam todos em paz, prontos — conforma-se.
Durante a quarentena, para se restabelecer emocionalmente, Cássia aderiu a estudos da mente humana:
— A internet me ajudou muito. Acessei conteúdos de pessoas que vêm me ajudando: psicólogos, terapeutas, sociólogos, filósofos, gente ocupada com uma melhor qualidade de vida para si e para os outros. Isso tem feito uma diferença muito grande para compreender a partida da minha mãe, para o amor dela aumentar ainda mais em mim, para que esse legado se aprofunde.
Mãe de Maria (23), Pedro (17), Miguel (24) e Joaquim (16), Cássia diz que tem refletido sobre o tempo dedicado a cuidar de si, da família e da casa:
— Na pandemia, o tempo ficou mais largo e também mais curto. Curto porque temos as demandas do cotidiano. Agora mesmo interrompi uma lavação de louça, tem a roupa da máquina para estender, tenho que passar um aspirador de pó no quarto do Miguel, tem um vaso sanitário que preciso limpar. Por mais que tenha o filho apoiando, eles também estão ocupados. Já o tempo largo é para cuidar do lado de dentro, respirar, pensar melhor, aprender a colocar as coisas no lugar, a olhar para nós mesmos. Eu acho que a decisão de fazer isso de um jeito mais profundo me trouxe coisas importantes. Eu tive grandes conquistas nesse período, não sei dizer qual é a maior delas. As mágoas que me prendiam ao passado, que não me deixavam perdoar, caminhar, elas correram. Isso foi um ganho gigante.
Sobre a possibilidade de expor suas vivências num livro que ajude pessoas que passaram por situações semelhantes, Cássia diz:
— Você acha que não tenho vontade de escrever sobre essas coisas? Evidente que posso contar minhas histórias com todas as experiências que tive, mas diariamente tenho galgado conquistas. E tenho certeza de que podem ser úteis. Hoje mesmo falei com uma pessoa no telefone e eu tentava colocar numa outra consciência. Eu olhei para mim fazendo isso e pensei: "Olha, que incrível. A necessidade de educar e reeducar, dizer a uma pessoa que ela ficará em paz". Agora, quando estou bem, faço o que posso na comunidade. Eu preciso ajudar, preciso me mover. Estamos com um país em que muita gente vai passar forme. Já temos. Tomara que a gente consiga reverter isso o mais rápido possível. Digo a meus filhos: "Não negligenciem".