Sou trineto de avós lusos, de Trás-os-Montes, E vez por outra me delicio com o jeitão de raciocinar dos meus parentes de além-mar. Ofereço, pois, algumas notáveis estruturações lógicas dos meus ancestrais que muito amo. Vamos aos finalmentes, para atender leitores desta Gazeta Escrota, magnificamente bem dirigida pelo escritor Luiz Berto, um pernambucano de Palmares pra lá de muito arretado de ótimo.
1. Carta de mãe portuguesa a seu filho no Brasil
Querido filho: Te escrevo estas linhas para que saibas que estou viva. Redijo devagar porque sei que tu não consegues ler rápido. Por aqui, tudo como ontem, embora não reconhecerás a casa quando aqui vieres, porque a gente se mudou. Finalmente enterramos o seu avô. Encontramos o seu cadáver com a mudança. Estava no armário desde aquele dia em que ele ganhou da gente, brincando de esconde-esconde. Hoje, tua irmã Júlia pariu, mas como ainda não sei o sexo, não posso dizer se tu és tio ou tia. Quem não tem mais aparecido por aqui é o tio Venâncio, que morreu totalmente no ano passado. E também o teu primo Jacinto, que sempre acreditou ser mais rápido que um touro e acabou comprovando que não era. Estou preocupada com o nosso cachorro Bob, que insiste em perseguir os carros parados. Teu irmão José fechou o carro com a trava e deixou as chaves dentro: teve que ir lá em casa pegar a chave duplicata para poder tirar todos nós de dentro dele. Esta carta te mando pelo Manolo, que vai amanhã para aí. Será que podes pegá-lo no aeroporto? Não subscrevo o novo endereço no envelope porque desconheço. A última família que morou aqui levou os números para permanecer com o mesmo endereço. Se encontrares a dona Maria, dês um alô da minha parte. Se não a encontrares, não digas nada. Um beijo saudoso, Maria do Monte Dourado. PS: Ia te mandar cem escudos, mas já fechei o envelope.
2. Certa feita, estava eu em Cascais, na casa de uma amiga pernambucana, após um estágio de trinta dias na Universidade do Porto, em julho, enviado pela Universidade de Pernambuco. Por volta do meio dia, desejou retornar à Lisboa. Na bilheteria solicitou: “Quero um bilhete no comboio que partirá doze e trinta para o Cais do Sodré”. A resposta veio educada: “Desculpe-me, mas no comboio d’agora não será possível. Face a greve dos maquinistas, que estão retardando as viagens em duas horas, o comboio das 12:30 está atrasado. Caso o Dr. queira, poderá embarcar no comboio programado para as 10:30 da manhã, que partirá pontualmente às doze e trinta”. E o Campozana fez uma excelente viagem.
3. No funeral da sua tia Tereza de Jesus, acontecido em 14 de fevereiro último, na Aldeia de Modim de Basto, Trás os Montes, Portugal, o Campozana recebe as condolências, em prantos, de uma velhinha nonagenária, típica aldeã, apoiada num cajado, luto fechado: “Sr. Dr. Engenheiro, muito chorosa cá está a morrer quem nunca morreu”.
4. Bilhete desesperado de filho para o pai, residente em Oeiras: “Pai querido, estou encalacrado. Fui trabalhar numa loja de carros usados e fui despedido no primeiro dia, só porque, para cada Uno vendido, eu dava um Prêmio de cortesia!!”.
No mais, viva o congraçamento sempre fraternal de brasileiros e lusitanos, uns e outros eternos admiradores do sempre lembrado outro Fernando, o amado Pessoa de todos nós, que um dia nos ensinou, através do Álvaro de Campos: “Sou técnico mas só tenho técnica dentro da técnica. Fora disso sou louco, com todo direito de sê-lo”.
5. Desabafos de um luso da Cidade Maravilhosa: Por que é que o governador do Rio é Castro e não castrado pelas festinhas que oferece? Votei no Bolsonaro, mas logo notei que o capitão não tem bom motor mental. E de nula criatividade, sem mourões.