Eram 16h25 de ontem quando a irreverência do Pacotão se espalhou pela Avenida W3 Norte. Iniciava ali, à altura da 502, o desfile do mais tradicional e anárquico bloco carnavalesco de Brasília, arrastando um número expressivo de foliões, que chamavam a atenção, entre outras coisas, pela diversidade das fantasias. Mas, isso, na realidade, era o que menos importava, pois a proposta básica do bloco — desde a fundação, em 1978 — é protestar de forma debochada contra os detentores do poder. Notoriamente de tendência esquerdista, o grupo tomou como primeiros alvos os mandatários do regime ditatorial Ernesto Geisel e João Figueiredo. Os que os sucederam, Fernando Collor, José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer não passaram incólumes. Lula e Dilma, porém, não foram importunados.
No desfile de ontem, comemorativo dos 42 anos de existência do bloco, integrantes da Sociedade Armorial Patafísica empunhavam logo à frente a faixa que trazia a inscrição: “O Pacotão não pede passagem. Passa. Na contramão”. Logo em seguida, um carro trazia um boneco gigante de Charles Preto, o eterno presidente da agremiação. Durante o percurso, ouviam-se marchinhas carnavalescas clássicas, tocadas pela Banda Podre e na voz de Helder Nascimento.
Já a marcha-tema de 2020, intitulada Contra o fascismo na contramão, composta por Maria Sabino, Assis Aderaldo e José Sóter, foi entoada durante a concentração, no viaduto que faz a interseção entre a W3 Norte e a W3 Sul e no encerramento, na 504 Sul. O verso inicial diz: “O Pacotão vai escrachar no carnaval/ Essa milícia e também o laranjal/ Ô Seu Queiroz que vida boa/ Só engordando a rachadinha da patroa”.
A movimentação em torno do bloco começou ao meio-dia na concentração que, desde sempre, ocorre entre as quadras comerciais 302/303 Norte. Ali no vai e vem das pessoas, em meio a incontáveis vendedores ambulantes, o Correio ouviu personagens ligados ao bloco e foliões. Um dos fundadores e membro do “Politiburo”, José Antônio Filho, o cartunista Joanfi, disse que a meta do Pacotão é fustigar os poderosos, “e nada melhor do que fazer nosso discurso na contramão”.
Para a advogada Thelma Cavalcante, 57 anos, foliã desde a adolescência, o Pacotão é o bloco da resistência, “agora mais do que nunca”. O estudante de medicina Jorge Lucas Medoz, 24, que sai no Pacotão desde 2006. vê o bloco como um símbolo do brasiliense consciente, “que insurge contra os desmandos dos políticos que detêm o poder”. Antecipando o desfile, houve a apresentação do grupo Asé Dúdu e da bateria do bloco Medida Provisória.
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Lis e Mel desfilaram vestidas de Chiquinha, do seriado Chaves |
Estreia
Quem apareceu para dar o ar da graça pela primeira vez no carnaval brasiliense foram as gêmeas Lis e Mel. As meninas, de 1 ano, nasceram ligadas por uma parte do crânio e ficaram conhecidas depois de passarem por uma complexa cirurgia de separação, em abril. Desde então, as irmãs se tornaram mais parceiras, buscando uma pela outra a todo momento.
Animadíssimas e fantasiadas como Chiquinha, personagem do seriado Chaves, as duas corriam de um lado para o outro durante a concentração do bloco, na Asa Norte. Na última vez em que Mel e Lis sentiram a energia do carnaval, elas estavam na barriga da mãe, a servidora do Ministério da Saúde Camilla Vieira Neves, 26. Aparentemente, o gosto das crianças pela festa veio daí. “É uma emoção. Sabemos que elas estão dando trabalho, mas é porque cada uma corre para um lado, para o próprio rumo”, disse.
DESTAQUE
Diploma
Antes do desfile, o Correio Braziliense foi homenageado pela Sociedade Armorial e Rusticana Pacotão com certificado de “reconhecimento público pela inestimável contribuição à difusão, incentivo e preservação do carnaval brasiliense e da cultura brasileira em geral”. O diploma foi entregue ao repórter Irlam Rocha Lima.
ARENA LOTADA
O penúltimo dia de Carnaval no Parque, no Ginásio Nilson Nelson, e o último da folia brasiliense teve arena lotada e fãs colados à grade para receber o cantor sertanejo Wesley Safadão (foto), o pagode carioca do grupo Molejo e o som eletrônico dos Djs Bhaskar, Cat Dealers e Mojjo. O evento volta a abrir as portas no próximo sábado, último dia de festival, com shows da dupla Jorge e Mateus, do grupo Saia Rodada e do duo Chemical Surf.