Depois de ouvir que Bella, a bebê de 1 ano e 9 meses que brinca na suíte do sítio Lago Buriti, em Guaratiba, é a cópia do pai, o ator José Loreto, Débora Nascimento saca o celular da bolsa com a “contraprova”. A atriz mostra uma foto sua quando criança para atestar que a menina também se parece com ela. “Todo mundo acha que é a cara dele até ver como eu era pequenininha”, diz a paulistana, de 34 anos, em tom de brincadeira.
Se na aparência ela já reconhece semelhanças, na personalidade tem dificuldades em prever. E Débora se encanta com as nuances de um ser em construção. Na verdade, dois seres: a criança e a mãe. “Sou uma mãe fluida. A cada semana, a cada mês, ela é uma bebê; e eu, uma mulher diferente.”
As mudanças se intensificaram não só com a maternidade, mas também por causa da exposição pública de sua separação em fevereiro de 2019. O casamento com José Loreto, de 35, chegou ao fim em meio à especulação de que ele teria tido um caso com uma colega de trabalho. O que era um momento privado virou assunto nacional: Loreto traiu ou não Débora? Se sim, com quem?
Quase um ano depois, a atriz não responde a essas perguntas, mas reflete sobre o ti-ti-ti: “Foi uma montanha-russa de emoções e acontecimentos ímpares que me trouxeram crescimento pessoal e percepções que antes eu não tinha”, diz Débora. “O que as pessoas falavam, questionavam, impunham ou exigiam, dizia muito mais sobre a história delas do que sobre a minha”, relembra a atriz.
Passada a separação propriamente dita, a curiosidade do povo não cessou, e a vida privada de Débora se manteve nas manchetes. Vários veículos chegaram, inclusive, a cravar que ela estava ficando com uma mulher, em maio do ano passado. A fofoca foi tanta que, ao se escrever “Débora Nascimento” no Google, a ferramenta autocompleta com “namorada”. “Ficam com um frisson de me imaginar com qualquer pessoa, mas acho que, de novo, isso diz muito sobre o outro e a nossa sociedade. O que mais me chocou foi: com tudo o que estamos passando no nosso país e no mundo, a comoção foi o sexo de quem eu podia estar interessada.”
A poeira, no entanto, baixou e deu a clareza de que 2020 é um ano para se cercar de cuidados. Por isso, ela admite ser vaga ao falar do novo namorado, um médico de São Paulo. “Por tudo o que aconteceu, de as pessoas se sentirem no direito de colocar o dedo, decidi proteger aqueles que me cercam. Estou feliz, sim. Sou respeitada e respeito. A base de uma relação tem que ser essa.”
O namoro tem sido à distância e administrado em meio aos cuidados com a filha, que já convive com o novo membro da família. “Bella sabe que tenho grandes amigos, e meu namorado é um amigo mais constante. Não tem esse peso”, diz. Nos fins de semana, Débora reveza com José os cuidados da menina, da mesma forma que ela viveu na infância. “Não foi um pânico ter me separado com a Bella pequena. Meus pais se divorciaram quando eu tinha 2 anos e meio e meu irmão, meses. Fiquei bem e sabia que ela ficaria também”, diz, garantindo que mantém uma boa relação com o ex-marido. “Eu e José somos amigos até hoje. Não o amo como homem, mas vou amá-lo como amigo para sempre. Moramos perto, e Bella pode ver os dois no mesmo dia. Somos muito parceiros.”
Ficar longe da menina, diz ela, gera uma preocupação que ainda está aprendendo a administrar. “Não se culpar por cada coisinha é o mais difícil da maternidade. Se ela é picada por um mosquito, tenho que entender que é só um mosquito, sabe? Se estou viajando num fim de semana e ela está com o pai, não posso me culpar. Não sou perfeita. Sou uma mulher que está correndo atrás dos sonhos, mas mantém o afeto e os cuidados.”
Débora também quer, em 2020, usar a fama (“não sou celebridade, sou artista”) para colocar na rua seus projetos de arte. Há uma peça (um thriller policial chamado “Lôca”, com direção de Diego Fortes) e a produção de uma série começando a serem lapidadas. Em março, entra em circuito comercial “Pacificado”, filme de Paxton Winters, que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Aruanda, na Paraíba, no ano passado. No longa, ela interpreta uma dependente química moradora do Morro dos Prazeres. “Fiz o filme grávida, e ele necessitava de um corpo totalmente desprendido de vaidade. Foi uma experiência deliciosa, com zero maquiagem, com espinhas. Tudo que eu peço são papéis assim”, diz ela, cujo último personagem na TV foi a socialite Gisela, em “Verão 90”.
Nascida na Zona Leste de São Paulo, em 1985, filha de mãe esteticista e pai delegado de polícia, Débora começou a trabalhar como modelo aos 15 anos, depois de ser selecionada num concurso de uma agência. A inscrição foi feita por um parente, quando a menina nem sabia o que era vaidade. Três meses depois do primeiro trabalho, já estava morando fora e conhecendo, de relance, o mundo das artes.
Foi nessa mesma época que passou por um dos maiores obstáculos pessoais de sua vida: a anorexia. “Eu tinha 92cm de quadril, e eles queriam 88cm.” Nessa fase, uma amiga modelo, inclusive, morreu por causa de distúrbios alimentares. “Lembro de tê-la encontrado 20 dias antes, e ela ter falado de como estava feliz. Quanto mais emagrecia, mais trabalhava e mais diziam que ela estava linda. E eu pegando dicas de como ficar daquele jeito.” Foi a mãe de Débora que percebeu algo errado com a filha: o quadril chegou a 90cm, a menina estava constantemente tonta e desfalecendo pelos cantos. Foi necessário muita conversa e marcação cerrada para que a autoestima entrasse nos eixos.
Hoje, a atriz é uma das maiores vozes do meio em defesa da não objetificação e da aceitação do corpo da mulher. Por isso, não aceita o posto de rainha de bateria de uma escola de samba para não estar no centro de pressões sociais. “Atualmente, considero meu corpo muito mais bonito do que há dez anos. Não falo: ‘Nossa, agora super me aceito’, porque é claro que passo por períodos de receios. Não nego que há resquícios do que vivi, até porque o sistema está aí. Somos cobradas todo o santo dia, mesmo que você seja completamente consciente de si. Ainda mais nesse período de carnaval”, diz.
Leitora voraz de obras feministas (a mais recente foi “O feminismo é para todo mundo”, de Bel Hooks), Débora chegou a presentear os convidados do chá de bebê de Bella com um livreto com trechos de “Para educar crianças feministas”, de Chimamanda Adichie. “Achava muito esquisito e lutava dentro da minha casa para ser tratada como o meu irmão. Então, sou feminista desde pequena. Essa palavra entrou no meu cotidiano há pouco tempo, porque o assunto se tornou mais conversado.” Ao lado dos ídolos atuais, a mãe e as mulheres que cuidaram da pequena Débora permanecem como referência. “Ela trabalhava demais, e eu ficava muito com as minhas tias e com as amigas dela. E lembro sempre da minha alegria quando ela voltava. Isso é ser mulher. É sair de casa graças a uma rede de apoio.”
Por causa da militância atual, Débora acredita que Bella vai crescer num mundo mais justo. Se a atriz, que viveu num ambiente familiar machista, conseguiu expandir seus ideais, a filha, então, vai nadar de braçadas nesse universo. “Com a rede social e a internet, muita coisa é propagada. Muita porcaria, mas também muito diálogo. Se você está aberto, disposto a olhar, está tudo aí. O que estamos conquistando não tem volta.”