02 de janeiro de 2020 | 03h00
Um quarto das capitais brasileiras não dispõe de uma estrutura completa de controle interno, revela levantamento do Estado, feito a partir de dados do Instituto Não Aceito Corrupção. Essa estrutura é composta de quatro unidades: ouvidoria, auditoria governamental, corregedoria e controladoria. Por exemplo, sete capitais não têm uma corregedoria, que é o órgão encarregado de apurar desvios de servidores e de recursos públicos.
Esse quadro revela que administrações municipais de capitais estão desprovidas de um sistema de combate à corrupção. Mais grave que os ilícitos identificados fiquem impunes é o fato de que essas prefeituras são incapazes, por falta de estrutura administrativa, de identificar os ilícitos. Simplesmente elas não fazem ideia, porque não controlam, se o dinheiro público sob seus cuidados é utilizado dentro dos parâmetros legais.
É assombroso que, mesmo após o combate à corrupção ganhar especial relevância na agenda do País – há anos que a população pede um novo patamar de moralidade e legalidade na gestão do dinheiro público –, sete prefeituras de capitais ainda não tenham se dado ao trabalho de criar uma corregedoria. Destaca-se que o caso não se refere a municípios pequenos, com reconhecida incapacidade técnico-administrativa. O levantamento refere-se a capitais de Estados. São prefeituras que, de um modo ou de outro, funcionam como referência para as outras administrações municipais do Estado. Pois bem, o que deveria ser padrão falha primariamente.
Em 2017, o Congresso aprovou a Lei das Ouvidorias (Lei 13.460/2017), com o objetivo de fortalecer e proteger os direitos do usuário dos serviços públicos. “A consolidação do acesso do usuário dos serviços públicos à gestão, por meio do recebimento e tratamento oportuno de manifestações, bem como de pedidos de acesso à informação, favorecem o controle social”, lembrou Ada Barbosa Derze, auditora-chefe da Controladoria-Geral do Município de Rio Branco.
Uma estrutura adequada de controle interno serve tanto para identificar ilícitos como para preveni-los. Gustavo Ungaro, controlador-geral de São Paulo, adverte que o investimento em órgãos de controle é também uma forma de recuperar recursos e deixar de gastar indevidamente. No caso da Controladoria-Geral do Município de São Paulo, estima-se que o órgão gerou, desde 2013, uma economia de R$ 274,9 milhões, por meio da revisão de contratos e da recuperação de desvios após apurações internas.
Aprimorar o funcionamento do sistema de controle interno inclui também reorganizar as carreiras públicas, criando funções específicas e diminuindo os cargos em comissão. “Nos municípios, sobretudo nos menos organizados, o sujeito que cuida dos contratos em geral entrou lá com o prefeito e assumiu um cargo genérico. Quando o prefeito sai, o funcionário vai embora”, lembra Carlos Ari Sundfeld, professor de Direito da FGV-SP.
A submissão da administração pública à lei é parte integrante do Estado de Direito. Como definiu a Constituição, a “administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. Por isso, o controle interno não é um acessório e tampouco ornamento. Sua inexistência significa grave omissão.