Em um tempo distante, que não se sabe precisar quando, em uma vila fictícia de um país imaginário, vivia um homem que frequentemente era vítima de furtos.
Pelo que indicavam as circunstâncias, esses furtos aconteciam à luz do dia, porque o homem morava sozinho, e sua casa era afastada do centro do povoado. Quando ele saía para trabalhar, a residência ficava desguarnecida. Ao retornar, era comum sentir falta de algum de seus pertences.
Tendo esses fatos ocorrido várias vezes, um amigo sugeriu àquele homem que adquirisse um cão de guarda. Assim, enquanto o homem estivesse fora, o cão intimidaria algum larápio que por lá aparecesse.
Havia, porém, um detalhe – e isso o amigo do homem furtado desconhecia – que gerava imensa dificuldade para a implementação daquela providência, aparentemente tão adequada ao caso: é que aquele homem, vítima de tantos furtos, detestava cães.
Durante toda a infância, ele ouvira a mãe dizer que cães, especialmente os de guarda, são animais perigosos, que se voltam contra os próprios donos, quando menos se espera.
– E tem outra coisa, – dizia frequentemente a mãe – basta um vento mais forte derrubar alguma coisa no quintal que o cachorro passa o resto da noite latindo. Aí ninguém dorme mais…
Tendo ouvido tantas vezes a mãe se referir aos cães de maneira depreciativa, o homem adquirira a antipatia materna aos cães, e resistia à ideia de ter em sua casa um habitante canino.
Mas, talvez pelo fato de os furtos continuarem, talvez pela insistência do amigo, com relação ao cão, o homem acabou tomando uma providência: comprou um gato persa, desses de aparência bem mal-humorada; pôs no felino uma coleira, com uma corrente fina, mas bem longa, e o prendeu na varanda, à frente da casa.
Alguns dias depois, o homem chamou o amigo que lhe sugerira o cão, e mostrou a ele o novo habitante da casa:
– Veja você mesmo: agora tenho um cão de guarda!
O amigo achou aquilo muito estranho. Considerou que o homem deveria estar brincando. Mas também admitiu que ele poderia estar enlouquecendo. Chegou a pensar em perguntar se o homem percebia que aquilo era um gato, mas achou a pergunta ridícula. Sem decidir se estava diante de uma piada ou de um caso de loucura, acabou por se limitar a um comentário em forma de pergunta:
– Interessante… Mas… está dando certo? Quer dizer… acabaram-se os furtos?
– Acabar, acabar mesmo… não. Mas… com o tempo o guardião aí vai aprendendo o serviço. Ele é inteligente. Vai aprender. Por enquanto, a grande vantagem dele é que não late à noite.
– Tenho certeza que não late nem de dia — completou o amigo, ainda com dificuldade para acreditar que o homem estava falando sério.
Inventou uma desculpa e foi embora, sem mais nada dizer a respeito do “cão de guarda”.