Uma histórica e magnífica obra da cultura popular nordestina, da autoria de Francisco das Chagas Batista
Respeitada a ortografia da época
Nicandro Nunes da Costa – DEUS APRESENTE A VERDADE
Quem tem compaixão de nós
Nas terríveis afflições?
Quem os nossos corações
Vê e escuta senão Vós?
Sabeis que eu não fui atroz
Oh! Suprema Divindade!
Já que sois Juiz de Bondade,
Minha causa vos entrego;
A quem julgar como cégo;
Deus apresente a verdade.
Não queiras, homem negar
A verdade a Deus acceita.
Nem te vae bem a suspeita
Por verdade acreditar.
Nada se pode affirmar,
Sem ter a realidade;
Portanto, ó Deus de Bondade,
Não queiraes na terra ver
Eu ir pagar sem dever;
Deus apresente a verdade.
A Vós nada é obscuro,
Tudo vêdes, claramente:
Se a Vós é claro o presente,
Mais claro inda é o futuro!
Não vive o homem seguro
Da calumnia e falsidade…
De mim, por humanidade,
Tende dó, ó Bom Jesus,
Aonde ha falta de luz,
Deus apresente a verdade.
Padre Eterno—Deus clemente—
Em pessoas trez distinctas,
Justo és, Senhor; não consintas
Eu ir pagar innocente,
Um fóco claro e luzente.
Lá da Vossa magestade,
Enviae, por piedade:
Vêde quanto o genero humano
Está sujeito ao engano!
Deus apresente a verdade.
Deu, Thomé ao morto vida:
O qual diz publicamente
Que Thomé éra innocente
E qual foi o homicida:
O mesmo Santo decida
Desse acto á realidade;
Se ha falta de claridade
Nalguns factos duvidosos,
Como esses enganosos;
Deus apresente a verdade.
Se eu paguei, se eu fiz ensaio,
Se eu soube ou fui avisado
Que esse homem éra tomado,
Cáia sobre mim um raio !
De aqui não fujo e nem sàio.
Deus me vê em toda parte;
Venenoso bacamarte
Se despare e me espedace.
Uma espada me traspasse,
Se nisso eu tomei parte!