Se o incêndio que destruiu o Museu Nacional há duas semanas tivesse ocorrido na época de Dom Pedro I, danificando o Paço de São Cristóvão, como o palácio na Quinta da Boa Vista era então chamado, o destino do imperador e da família era praticamente certo: passar uns dias na Fazenda Imperial de Santa Cruz, endereço escolhido pelos nobres para “esfriar a cabeça” e relaxar das pressões enfrentadas na residência oficial. O trajeto acidentado de 53 quilômetros — 11 léguas, na medida do século XIX — que levava até o refúgio pode ser percorrido ainda hoje, mas pouca gente se dará conta de que está na Estrada Real de Santa Cruz ( ou Caminho Imperial).
O caminho
Pouco restou dos 12 marcos de pedra que foram erguidos entre 1826 e 1827, um a cada légua, para indicar o percurso. Tombados pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, apenas seis resistiram ao tempo e às mudanças urbanísticas. E são mistérios para quem anda pelo Caminho Imperial: as placas com informações históricas foram roubadas em quatro deles.
A sinalização implementada pela prefeitura na década passada, indicando as ruas por onde passava a comitiva dos imperadores, também é deficiente. Poucas avenidas, como a Dom Hélder Câmara e a Estrada Intendente Magalhães, ainda possuem referências ao passado.
Além da importância histórica, o caminho hoje esquecido também desempenhou um papel decisivo na interiorização da cidade, segundo o arquiteto Rodrigo Bertamé, membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio (CAU-RJ). Prova disso, diz ele, é que, antes da construção da Avenida Brasil, o polo industrial caminhou por parte do trajeto, nas regiões de São Cristóvão, do Jacaré e da Avenida Dom Hélder Câmara:
— Temos uma ideia de uma cidade muito fragmentada, com bairros distintos e características urbanas diferentes. Mas nós temos um elo. Esse caminho é o elo. Acredito que, ao relembrar essa estrutura, que passa no meio da cidade, você valoriza bairros que são esquecidos no projeto de cidade.