Depois das aulas na Faculdade de Engenharia era costume a turma reunir-se para uma cerveja e traçar planos noturnos na Pizzaria Sorriso na Praça Sinimbu. Certa noite de quinta-feira, após uma prova, tomei rumo à pizzaria, assim que entrei recebi o convite, participar de uma festinha íntima na praia da Sereia. As moças já estavam esperando para levá-las a um bar escondido em frente ao mar. Confesso, o convite me abalou, mas a namorada me esperava para assistir a última seção do Cine São Luiz. A paixão foi maior, agradeci aos amigos, fui ao cinema onde o amor puro e belo me aguardava.
Na manhã seguinte depois de tomar um café generoso daqueles que só existe na casa da nossa mãe, dirigi o carro rumo à Faculdade. Ao ligar o rádio sintonizado num programa de ronda policial, o locutor escandaloso esbravejava contando os acontecimentos.
“E atenção para essa notícia da juventude transviada. Um bando de xexelentos, rabugentos, estudantes da Faculdade de Engenharia da UFAL, promoveu um bacanal na praia da Sereia juntamente com algumas mundanas. Estavam como vieram ao mundo perturbando a moralidade pública, um escândalo na praia da Sereia. A depravação era tanta que uma moradora da redondeza chamou a Rádio Patrulha. Todos foram recolhidos a 1ª Delegacia de Polícia da Capital”.
Logo percebi que os xexelentos eram meus colegas. Mentalmente agradeci à namorada por não ter ido à festa. Na Faculdade um dos colegas contou a proeza, às gargalhadas.
Os meninos saíram em dois carros e um jipe percorrendo alguns pontos da cidade pegando as convidadas para a festinha. Eram sete acadêmicos e oito mulheres na praia em noite de lua cheia. No bar discreto pediram cerveja, cachaça, rabo de galo, tira-gosto de camarão, panã, siri, cioba. Todos conversando, sorrindo e cantando. A animação prosseguiu, um dos colegas tocava divinamente flauta, deu um show tocando músicas de Chico Buarque e Caetano. A cachaça rolava. Alguns mais apressadinhos davam uma saída para deitar-se olhando a Lua, os corpos rolando, lambuzando-se de areia da praia, parecia filé à milanesa.
Em certo momento, alguém teve a idéia.
“Está tudo muito bom, festa arretada, mas vamos animar um bocadinho, é tarde da noite e não tem vizinho por aqui. Vamos brincar de pega! As meninas correndo na frente se escondem, nós partimos depois para procurá-las. Quem conseguir achar e pegar alguma, os dois vão saudar Iemanjá num banho de mar ou em qualquer lugar. A ordem é essa!”.
A sugestão foi aceita por unanimidade. Logo estavam os 13 festeiros correndo e gritando pela praia iluminados por um luar prateado. Viam-se os vultos correndo e ouviam-se os gritinhos nervosos das meninas escondendo-se dos caçadores, brincadeira apimentada. Dois amigos preferiram ficar sentados no bar apenas olhando a brincadeira de pega, divertindo-se. Já durava uma hora de corre-corre, quando apareceu um jipe em marcha lenta com luz alta acesa focando os alegres jovens que brincavam de pega. Quando focou um dos acadêmicos pegando uma bonita morena, o estudante virou-se gritando alto.
– Apague essa luz, seu filho….!!!
O jipe parou, saltaram três policias com cassetete na mão e revólver nos quartos, era a Rádio Patrulha. Prenderam o casal. O comandante chamou todos para reunirem-se no bar. O pessoal foi se achegando, vestindo a roupa. Um dos estudantes apresentou-se como aluno do NPOR, mas não houve acordo. O sargento comandante da patrulha informou que a denúncia foi uma ligação de um capitão do Exército que morava pela redondeza pedindo para acabar aquela imoralidade pública, contra os bons costumes. Exigiu a prisão de todos os marginais da orgia.
Convidados para comparecerem à delegacia, foram os quinze pegadores, pecadores. O delegado logo trancafiou as mulheres no xadrez. A sorte é que um dos acadêmicos era primo do delegado. Os estudantes comovidos pediram para liberar as meninas. Às quatro da manhã chegaram a um acordo, os homens estavam liberados, podiam ir para casa, as mulheres depois seriam soltas. O delegado não cumpriu o acordo, as moças dormiram na delegacia, foram soltas no dia seguinte. Jornalistas encarregaram-se de espalhar a notícia do bacanal nas rádios e jornais.
Hoje esses engenheiros da brincadeira de pega na praia da Sereia são respeitosos pais de famílias, avôs, ainda trabalhando pelo desenvolvimento do belo Estado das Alagoas. E essa turma de Engenharia 1971 ainda reúne-se toda primeira quinta-feira do mês num almoço fraterno, nostálgico e alegre, lembrando-se das histórias da juventude.
Essa e outras histórias serão contadas na peça SE FOR PRA CHORAR QUE SEJA DE ALEGRIA – Dia 5 de julho no Teatro Deodoro, Maceió – 19 horas.